Queixa invertida


Um dirigente sindical foi chamado ontem ao Tribunal de Almeida, acusado pela GNR de ter partido uma antena de um rádio portátil de um guarda. O sindicalista «apareceu com um ferimento na cabeça, eventualmente surgido quando partia a antena do referido rádio», afirma a acusação, num texto em que os dirigentes sindicais são tratados como «agitadores».

A Federação dos Sindicatos dos Transportes Rodoviários e Urbanos exprimiu um forte protesto contra esta maneira de relatar a agressão de um elemento da GNR contra um trabalhador, a quem o guarda bateu com um intercomunicador portátil na cabeça, mas receia que «nunca se pode excluir, em absoluto, a possibilidade de triunfar a mentira, face às próprias contingências do processo judicial, nomeadamente no que respeita à produção de prova».
Numa nota que distribuiu sexta-feira à comunicação social, a Festru/CGTP-IN afirma que o seu dirigente foi levado a julgamento «por ter exercido um direito legítimo, em defesa dos interesses dos trabalhadores do sector». A 11 e 12 de Fevereiro de 1997, recorda a federação, «quando decorria em Espanha uma greve de motoristas que, praticamente, impedia o trânsito rodoviário naquele país, ocorreu uma grande concentração de motoristas portugueses, com os respectivos camiões, no parque TIR, em Vilar Formoso, e nas suas imediações». Na mesma altura, «encontrava-se bloqueado, em Portugal, o processo de revisão do contrato colectivo de trabalho aplicável aos trabalhadores do sector de transportes de mercadorias, por força da intransigência da associação patronal, a Antram».
Foi neste contexto que a Festru resolveu enviar alguns dirigentes para Vilar Formoso, naqueles dias. Mas, «sem que se tivesse verificado qualquer perturbação da ordem pública, nomeadamente, sem que tivesse ocorrido qualquer bloqueamento da circulação rodoviária que não fosse o determinado pela actuação dos grevistas espanhóis, foram destacados para o local 250 elementos da GNR», com «meios desproporcionados» e «uma postura absolutamente injustificada e ilegítima», o que criou «um ambiente artificial de tensão e de confronto, de que resultaram ferimentos em vários trabalhadores», que teriam «razões de sobra para apresentarem queixa-crime contra os elementos da GNR, sobretudo contra os seus comandantes».
Depois da gravidade das agressões e da ingerência na actividade sindical, a actuação da GNR junto do Tribunal «traduz o propósito de coagir os trabalhadores e os seus dirigentes sindicais a absterem-se de exercer direitos legítimos, constitucionalmente consagrados», denuncia a Festru, sublinhando que «sejam quais forem as consequências, não é por esta via que o poder conseguirá amordaçar os trabalhadores dos transportes e as suas organizações».


«Avante!» Nº 1352 - 28.Outubro.1999