Em Palmela contaram-se
Histórias da clandestinidade


No dia 17 de Dezembro de 1949, António Dias Lourenço era preso pela PIDE em Aires, Palmela. Cinquenta anos depois, a Comissão de Freguesia de Palmela do PCP recorda os acontecimentos numa sessão que realiza amanhã, à noite, no Airense, com a presença daquele destacado dirigente comunista. Segundo a organização, o objectivo da iniciativa é dar corpo à ideia-força de que o «PCP é o Partido que vence adversidades e adversários».

Num depoimento que fez a esse propósito, Dias Lourenço recorda o período de «grande intensificação da repressão fascista» em que se deu a sua prisão, precedida meses antes das de Álvaro Cunhal e Militão Ribeiro.
António Dias Lourenço havia sido, na altura, destacado para o trabalho de Direcção do Sul, até então sob a responsabilidade de Joaquim Pires Jorge, em casa de quem foi viver. Porém, conhecida a prisão de Militão Ribeiro, que havia reunido com eles nessa casa, por razões de segurança - «não porque tivéssemos receio que o Militão falasse, pois tínhamos a certeza que ele preferia morrer, como infelizmente veio a acontecer na prisão» - ambos tiveram que «saltar» dali.
Viveu, a seguir, nos Olhos d’Água, numa casa que também teria que largar por ter sido visto de lá a sair por um camarada conhecido, procurando então casa em Setúbal, que não chegaria a ocupar por o senhorio não "não ter gostado" do seu fiador, um camarada que era alfaiate naquela cidade, o Manuel «alfaiate».
Instalou-se então no Montijo numa casa que também teve que deixar de imediato por ter sido reconhecido por um legionário da sua terra, indo finalmente viver para Aires.
Na madrugada do próprio dia em que ia de novo «mudar-se», em virtude de uma série de pequenos factos que indicavam que também ali havia sido descoberto, foi preso juntamente com a camarada que com ele vivia.
Às quatro da madrugada, conta Dias Lourenço, «chegam eles e desatam aos pontapés à porta. Até que eu abri e perguntei alto: "O que vem a ser isto?! O que é que os senhores querem?! Quem são os senhores?!". O chefe de brigada, o Costa Pereira, que vinha com a metralhadora a tiracolo, tirou o chapéu e entrou. Continuei a perguntar o que é que queriam e quem eram. Respondeu-me que eram da polícia, perguntou-me o nome e pediu-me os documentos de identificação. Enquanto os entretinha e ia pensando em como fugir, entram outros e prendem-nos.»
Como resume, por fim, Dias Lourenço, a sua prisão dá-se no âmbito «de uma ofensiva muito grande contra nós em que perdemos vários quadros de Direcção». Mas também, a partir dessa altura, «aumentou-se em muito o esforço de resistência e disciplina na organização do partido na luta pela liberdade e democracia no nosso país».


«Avante!» Nº 1359 - 16.Dezembro.1999