Velhos e convencidos


São tantos e tão convencidos os que se apresentam tomados por uma súbita preocupação com o PCP, o seu futuro, papel e influência que, não fora aquela elementar prudência de não dar ouvidos a tudo o que para aí se diz, ainda acabaríamos rendidos a tanto enlevo.
E como no presente caso o popular ditado que afirma que "quem te avisa teu amigo é" não tem aplicação prática, observados que são os sujeitos de tão desinteressados conselhos, melhor será socorrermo-nos dos que com sábia prudência aconselham o pobre a desconfiar quando a esmola é muita.

Vem isto a propósito de recentes opiniões produzidas por Prado Coelho e Francisco Assis esclarecedoras quanto ao papel que alguns destes reservariam para o Partido e que indisfarçavelmente desejariam vê-lo assumir.
Prado Coelho ,em recente texto publicado sobre o titulo de "A mudança" no qual voltou a divagar sobre o futuro do comunismo, num gesto magnânimo de que só os detentores de tanta verdade são capazes, não quis deixar de condescendentemente considerar que "os ideais do comunismo têm uma generosidade própria que permanece intacta". Até aí o homem chega, mais que não seja porque escrevê-lo dá aquele toque de cultura e tolerância que fica bem nos meios que frequenta. Mas para que não persistam equívocos, o autor de imediato se apressou a sentenciar que " o comunismo enquanto projecto, vivência, forma organizativa, prática histórica, teoria marxista-leninista da luta política, esse foi definitivamente condenado". O que tem o mérito de deixar claro que Eduardo Prado Coelho até não tem nada contra essa ideia do comunismo desde que ele não passe daquele nível contemplativo , tipo objecto de montra para ser observado, para o nível da prática política que lhe dá força material e poder de transformar.
Quanto a Assis ficámos agora a saber, com a autoridade de que se reclama alguém que nunca teve qualquer simpatia pela ideologia comunista como o próprio fez questão de dizer, o que gostaria mesmo era de ver um PCP mais do tipo colaboracionista, dado a entender-se com as forças políticas inscritas na Internacional Socialista a exemplo de outros e mais rendido ao sistema. Um PCP idealizado por Assis em versão social-democrata mais propicio a entendimentos com o PS e disponível para silenciar ou colaborar com a política e objectivos de direita que o partido do Governo prossegue.

Diga-se em abono da verdade não haver nada de substancialmente novo nas afirmações quer de um ou de outro. Em ambos a mesma e velha confusão de querer tomar como realidade os seus desejos e vontade. E aquele não menos velho sonho de quererem vir a ver, para tranquilidade sua e dos interesses de classe que representam, os partidos comunistas reduzidos a uma força desprovida dos meios, formas e conteúdos de intervenção indispensáveis a uma força revolucionária.

Pelo que para desassossego dos que aspirando vir um dia a encontrar um PCP asséptico e inofensivo, hipoteticamente dividido entre as duas opções que tão generosa e desinteressadamente insistem em lhe apresentar, daqui fazemos questão de os desenganar. E de lhes pedir que guardem para si aquela comprovada intenção de continuarem, uns ou outros, a contemplar no fausto das suas poltronas o mundo de desigualdades e injustiça e a colaborar nas políticas que as ampliam e promovem.
Porque quanto a nós comunistas cá continuamos dispostos a prosseguir por aquela opção transformadora e decididos a lutar pela construção de uma sociedade mais justa, sem exploração e socialista. — Jorge Cordeiro


«Avante!» Nº 1359 - 16.Dezembro.1999