Cerca de 20 mil
técnicos dispostos a lutar «o tempo que for preciso»
num dos maiores protestos do género nos EUA
Greve
na Boeing
No brains, no planes (Sem
cérebros não há aviões) é o slogan adoptado
pelos milhares de funcionários qualificados da Boeing, em
Washington, que quinta-feira passada entraram em greve por tempo
indefinido em luta por aumentos salarais e defesa dos direitos
adquiridos.
As causas do conflito radicam no desacordo sobre a convenção de
trabalho, cujas negociações se encontram paralisadas desde
finais de 1999. Os trabalhadores exigem aumentos salariais de
quatro por cento para o ano em curso e de três por cento para os
dois próximos anos, e um prémio de 10 por cento; a empresa
propõe aumentos inferiores, pretende reduzir os seguros de vida
e tenciona proceder a cortes no âmbito da assistência médica.
Este último aspecto reveste-se da máxima importância, uma vez
que nos Estados Unidos não existe um serviço nacional de
saúde.
De acordo com o sindicato do sector, Sociedade de Empregados de
Engenharia Aeroespacial (SPEEA), que conta com 22 500 associados
na Boeing, o primeiro dia de greve contou com uma adesão em
massa: 19 500 grevistas. Os números reconhecidos pela empresa
são ligeiramente menores, mas não deixam de comprovar o sucesso
da luta: entre 17 e 18 mil grevistas.
O dirigente da SPEEA, Charles Bofferding, em declarações
citadas pelo diário espanhol «El País», afirma que os
trabalhadores estão «preparados para uma longa campanha», e
sublinha que «esta é uma luta de todos os que dedicaram a sua
carreira e a sua vida à Boeing». Uma dedicação pela qual os
cerca de nove mil técnicos associados no SPEEA recebem em média
45 000 dólares anuais, enquanto os cerca de 13 000 engenheiros
auferem por ano, em média, 63 000 dólares.
Apesar da amplitude do movimento grevista a paralisação não
afectou de imediato as linhas de montagem da companhia aérea. Os
trabalhadores deste sector pertencem a outro sindicato e, muito
oportunamente, estão proibidos contratualmente de fazer greve.
É a liberdade à americana. Mas nem aqui restam dúvidas do que
sentem os trabalhadores: a linha de montagem parou os minutos
necessários para aplaudir a luta em curso na companhia.
Neste contexto, segundo a SPEEA, só uma greve de longa duração
poderá fazer sentir os seus efeitos. «Haverá um momento em que
os aviões pararão», dizem os grevistas, sublinhando que duas
semanas de greve acabarão por afectar o processo de inspecção
e entrega de aparelhos.
À boa maneira do patronato que não reconhece outros interesses e direitos que não os seus, a companhia, surpreendida pela unidade de trabalhadores sem tradições de luta, aposta na desmobilização a curto prazo. Se tal não se verificar, admite substituir os grevistas nalguns postos chave. É a democracia à americana.