Enxaquecas
Há pouco tempo, tínhamos tido esse
monumento maior à ignorância e à ligeireza constituído pelo
facto de dezenas de jornalistas e comentadores terem conseguido
transformar em estrepitosas novidades e mudanças de assombrar um
conjunto de análises, orientações e posições do PCP
assumidas quase há 10 anos.
Agora, iniciando uma procissão que ainda vai no adro e que
há-de percorrer o conjunto dos «media», a partir de uma
manchete mentirosa do «Expresso» (e qualquer outra da mesma
família também o seria), já tivemos as penas expeditas de
Carlos Magno, Emídio Rangel e Prado Coelho a construírem em
cima de uma falsidade nuclear catedrais de hipocrisia e
«pipelines» de veneno.
Afogados, como de costume, na vertigem dos títulos de imprensa e
doentes por se lerem demasiado uns aos outros, estes ilustres
comentadores leram a manchete do «Expresso» e logo nela viram a
mais cristalina das verdades. Nem sequer estranharam que tão
fragorosas «decisões» e tão inequívocas «disposições» do
Comité Central do PCP tivessem sido mantidas na clandestinidade,
com a enorme eficácia que essa qualidade, como se calcula,
asseguraria nos dias de hoje. E muito menos estranharam que,
certamente para não prejudicar o «frisson» que se queria
vender, o «Expresso» não aludisse a nenhuma diligência junto
do PCP para confirmar ou desmentir o sentido essencial da sua
«notícia».
Não, os ilustres comentadores, cinco ou seis anos depois de ele
ter sido retirado no mercado, limitaram-se para seu supremo
prestígio a acreditar no velho e arrogante «slogan»
publicitário do jornal da Duque de Palmela que rezava «Acredite
... se ler no Expresso».
Quase juramos: a estes e outros comentadores pouco vão importar
os esclarecimentos e a desmontagem de como morderam credulamente
o que alguém lhes quis impingir. Eles sabem ao que andam, e
darão sempre por saldo útil as grelhas de análise de
instituírem, as fasquias que fixarem, a seara de caricaturas e
deturpações que semearem.
Entendamo-nos: não lhes pedimos que gostem de nós ou concordem
com a nossa política e as nossas propostas, embora às vezes
fosse desejável que saíssem da confortável cassete generalista
de rejeição e explicassem em concreto quais é que contestam.
Mas, como figura de estilo, talvez fosse de lhes pedir, em
relação ao PCP, um pouco menos de jogos de rótulos e etiquetas
e um pouco mais de esforço de compreensão; um pouco menos de
sabedoria de cuspo e um pouco mais de saber inteligente; um pouco
menos de preguiça e superficialidade e um pouco mais de
informação, leitura e estudo; um pouco menos de «clichés» e
dogmas e um pouco mais de abertura e seriedade intelectuais face
ao que o PCP realmente é, realmente faz e realmente defende.
Se tudo isto não lhes trouxer dolorosas enxaquecas, é claro.
Vítor Dias