Sindicatos exigem resposta do Governo
A greve «deselegante»



A atitude do Governo, que em três reuniões negociais evoluiu de 2,25 para 2,4 por cento na contraproposta de aumentos salariais, é que merece o adjectivo usado pelo secretário de Estado para criticar a oportunidade da luta de dia 18.


Fernando Rosa, que no Governo tem a secretaria da Administração Pública, suscitou uma onda de indignação nas organizações sindicais que promoveram a greve da passada sexta-feira e, ao dizer publicamente que a paralisação era «deselegante», terá contribuído até para engrossar os números dos que responderam ao apelo da Frente Comum e das estruturas mais importantes da Função Pública, da Administração Local, dos professores, dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos paramédicos, dos trabalhadores civis das Forças Armadas, dos funcionários do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e dos inspectores de Ensino.
O pré-aviso de greve, como salientou o secretariado da Frente Comum de Sindicatos, foi apresentado por um número recorde de organizações sindicais, o que já fazia prever uma forte adesão. Compreende-se o esforço do secretário de Estado e de outras figuras, com outras altas responsabilidades, para contrariarem a expressão do descontentamento. Ao devolver ao Governo a «deselegância», a Frente Comum reafirmou que a greve «tem toda a justificação, não só em função da indecorosa proposta de aumentos, mas também pela falta de resposta a outras questões fundamentais para os trabalhadores», como a proliferação do emprego precário, a «privatização» do vínculo laboral, a falta de correcção das injustiças criadas com o novo regime de carreiras, o adiamento da aplicação da legislação sobre risco, penosidade e insalubridade.


Forte adesão


Ao início da tarde de sexta-feira, a Frente Comum estimava em 70 por cento a adesão global à greve, salientando que aquele nível «corresponde por inteiro às expectativas criadas, transmite o profundo descontentamento dos trabalhadores perante as contrapropostas governamentais e a exigência de apresentação de valores credíveis para negociação». Registaram-se elevados níveis de adesão por parte dos trabalhadores administrativos da Educação, da Saúde e da Justiça.
Na mesma altura, o STAL afirmava «com segurança» que cerca de 80 por cento dos trabalhadores das autarquias aderiram à greve, mantendo-se o muito alto índice de participação nas zonas urbanas e em sectores operários, de recolha de lixo, limpeza urbana, saneamento, jardins e abastecimento de água, a par de uma adesão mais forte que em lutas anteriores, em sectores administrativos e técnicos e em zonas do interior do País, das regiões autónomas e do «eixo» Oeiras-Cascais-Sintra.
Entre os médicos, a participação na greve situou-se, a nível nacional, na faixa dos 85 a 90 por cento, segundo a FNAM.
O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses divulgou uma lista detalhada sobre os índices de adesão à greve em vários centros de saúde e hospitais, considerando que «são claramente demonstrativos do descontentamento sentido» pelos profissionais de enfermagem.
Várias dezenas de escolas preparatórias e secundárias encerraram, bem como centenas de jardins de infância, segundo informações dos sindicatos dos Professores da Região Centro e da Grande Lisboa.
«Perante a realidade inquestionável do descontentamento dos trabalhadores face à postura negocial do Governo, ou este apresenta para negociação propostas sérias ou, por parte dos trabalhadores, a "deselegância" será mais dura», preveniu o Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa, glosando as palavras do secretário de Estado.

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Propostas claras

As propostas sindicais estão expressas na Plataforma Reivindicativa para 2000, à qual o Governo respondeu tarde e mal, tanto na actualização salarial, como ao deixar sem resposta importantes questões.
A Frente Comum reafirmou, no dia da greve, que aumentos salariais de 2,4 por cento, como propõe o Governo, são inaceitáveis, já que iria aprofundar-se o fosso entre os valores do índice 100 e do salário mínimo nacional (que subiu 4,1 por cento). Além da eliminação da diferença entre as remunerações mínimas, que poderá ser faseada, os sindicatos querem que nenhum trabalhador do Estado seja aumentado em menos de 5 contos.
Se o Governo aceitar estes princípios, a Frente Comum de Sindicatos admite «equacionar» a apresentação de uma contraproposta de actualização salarial, salientando assim que não tem «uma posição fechada, do estilo "6 por cento ou nada"», mas refutando que daqui se conclua que poderia aceitar uma actualização em percentagem igual à do salário mínimo nacional.


«Avante!» Nº 1369 - 24.Fevereiro.2000