No 75º aniversário de Carlos Paredes
Uma mensagem plena de universalidade



«Carlos Paredes revolucionou a guitarra por dentro da guitarra e cantou valores que a projectariam inevitavelmente no futuro». Palavras que se inscrevem na homenagem da Câmara de Lisboa e que, de formas diversas, reflectem o espírito presente nas múltiplas homenagens que, no seu 75º aniversário, têm vindo a decorrer pelo país.

Em moção aprovada por unanimidade, a Câmara de Lisboa saudou o músico e o homem de cultura, destacando, quer a sua dimensão artística quer humana.
«Se a sua música é eminentemente portuguesa, é-o muito mais pela combinação muito pessoal de todos os elementos diversos do que pela adesão directa às convenções próprias de qualquer das tradições e géneros específicos que absorveu. Esta autenticidade faz dela uma mensagem plena de universalidade».
O elogio ao músico, «eterno discípulo feito Mestre», a que se junta a saudação ao homem, de que a modéstia «transparece na energia vital da sua actividade criadora, na generosidade das suas interpretações, na sua entrega física e emocional completa como intérprete, na autenticidade de um estilo que parece transpor todas as barreiras socio-culturais» e ao comunista que, «pelos seus ideais e militância» foi perseguido e privado de liberdade.
Um voto de saudação foi também aprovado em reunião da Câmara de Loures que, no texto da deliberação, homenageia o «músico capaz de aliar uma dimensão afectiva ao virtuosismo da guitarra» e lembra as palavras do próprio Carlos Paredes quando diz que uma vida dedicada à música estaria justificada se alguém ouvisse um disco meu daqui a muitos anos e pensasse que eu tinha conseguido retratar, de algum modo, este tempo.

 

 

Verdes anos


Era uma adolescência cercada. A guerra no horizonte como um sol de breu.
Por Coimbra passavam as águas correndo, vigiadas, rumo ao sul - onde a fome e a terra sonegada erguiam os homens do chão.
Mas a guitarra subia pelo frio, movimento perpétuo e esmeril dos dias. De longe, de muito longe, chegava esse frémito de terra acordada, dor de existir e usina de incêndios.


João Pedro Mésseder



Breve nota
biográfica

Carlos Paredes nasceu em Coimbra a 16 de Fevereiro de 1925. Em 1934 passou a viver em Lisboa, onde concluiu a instrução primária no jardim-escola João de Deus, fez o ensino secundário no Passos Manuel e frequentou o Instituto Superior Técnico.
Em Janeiro de 1994 é atingido por uma grave doença que o impede de continuar o seu percurso como guitarrista.
Já aos quatro anos tinha aprendido a tocar guitarra com o pai, Artur Paredes.
A sua música fez incursões em vários domínios da arte, do teatro ao cinema e bailado.
No teatro trabalhou com Carlos Avilez e com o Grupo de Teatro de Camplide. No cinema faz nomeadamente as bandas sonoras de Verdes Anos e de Mudar de Vida, de Paulo Rocha e de uma série de curtas metragens. Em 1982 Vasco Wellenkamp criou o bailado Danças para uma Guitarra, com música de Carlos Paredes.
Da sua ampla discografia destacam-se títulos como Carlos Paredes, Verdes Anos, Guitarra Portuguesa, Porto Santo, Divertimento, Variações em Ré Menor, Movimento Perpétuo, Mudar de Vida, António Marinheiro, Balada de Coimbra, Concerto em Frankfurt, Invenções Livres, Espelho de Sons e Dialog.
Militante do Partido Comunista Português desde muito jovem, Carlos Paredes esteve preso vários anos.


«Avante!» Nº 1369 - 24.Fevereiro.2000