A expansão da toxicodependência coloca novas exigências
Mais eficácia no combate à droga


O PCP anunciou na segunda-feira um conjunto de seis projectos de lei que vai apresentar na Assembleia da República para a prevenção da toxicodependência e a luta contra a droga.

Francisco Lopes, membro da Comissão Política do PCP que fundamentou as medidas, diz que «não há hoje qualquer certeza de se estar a verificar uma inversão do agravamento da toxicodependência», pois se há indicações do consumo de heroína estar a incidir em estratos etários mais elevados, afectando menos os jovens, «a expansão para as zonas rurais, o crescimento do uso de outras drogas e o aparecimento de novas drogas sintéticas mostram que a situação é preocupante e coloca novas exigências de prevenção e intervenção».

A resposta ao problema continua, contudo, marcada por atrasos e insuficiências «inaceitáveis» e, passado quase um ano sobre o anúncio da estratégia nacional de luta contra a droga, «nada de significativo foi implementado», não existe qualquer «estudo global sobre a incidência da toxicodependência», acumulam-se «hesitações e contradições».
O sentido das propostas do PCP visa, assim, uma acção mais eficaz e profunda, não com a ideia de se ter «todas as soluções na mão» ou de que as suas propostas sejam «ideias acabadas», mas sim com espírito de abertura à discussão e à contribuição de outros, com a convicção de que o problema «não se compadece com hesitações, falta de vontade política, ou pregação do derrotismo».

Aperfeiçoar a legislação

As iniciativas do PCP «abordam um vasto conjunto de matérias incluindo a prevenção primária, redução de danos, tratamento e reinserção social, enquadramento legal do consumo e combate ao tráfico de droga e branqueamento de capitais».
Ao mesmo tempo, é proposta do PCP propõe um conjunto de alterações de aperfeiçoamento da legislação existente nesta matéria nomeadamente: «aplicação do regime penal previsto para as associações criminosas, não apenas às que se dediquem ao tráfico de droga e de percursores, mas também às que se dediquem ao branqueamento de capitais provenientes dessas práticas; alargamento da criminalização do branqueamento, a capitais oriundos de novos tipos de crime; afastamento do segredo bancário e fiscal; alargamento do prazo de suspensão de operações bancárias suspeitas; extensão dos deveres de comunicação e notificação, além das entidades já cobertas, nomeadamente as financeiras, a outras entidades que intervenham na contabilidade, auditoria financeira, transporte de bens e valores ou como intermediárias de negócios que envolvam montantes financeiros elevados e obrigação de identificação e conservação de registos nas transacções à distância».

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Tráfico
Atacar «onde mais dói»

Um dos projectos de lei que o PCP vai apresentar na Assembleia da República, diz respeito à definição dos princípios gerais da prevenção primária da toxicodependência e à aprovação de medidas de intervenção em situações de risco e de reinserção social e laboral de toxicodependentes em recuperação.
Pela sua actualidade e urgência, destacam-se, entre as suas medidas, as que apontam a «determinação das áreas, bairros, situações ou grupos de risco» e a criação de um dispositivo nacional de centros de apoio fixos ou móveis para situações de riso confirmado, dada a transformação de algumas áreas e bairros em autênticos «hipermercados de droga» e «guetos» onde os toxicodependentes se aglomeram em condições infra-humanas.
Um outro projecto de lei diz respeito ao alargamento da rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção social de toxicodependentes, já que «a rede pública continua a ser insuficiente», particularmente nas zonas mais populosas.
O PCP pretende, ainda, alargar o conceito de «rede», de forma a abranger também os Centros de Dia e os Apartamentos de Reinserção e, a partir da actual rede, a eliminação das listas de espera para as primeiras consultas nos CAT e a criação de um dispositivo de comunidades terapêuticas com capacidade mínima de resposta pública e de centros de dia no âmbito de cada Direcção Regional do SPTT.
Não menos importantes são os dois projectos de lei do PCP que instituem o Programa Nacional de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e aperfeiçoam as disposições legais destinadas a prevenir e punir o branqueamento de capitais provenientes de actividades criminosas, de forma a atingir os seus autores «naquilo que mais lhes dói, nos seus lucros e patrimónios ilícitos, reduzindo e liquidando o poder económico dos indivíduos e das organizações criminosas».
Pese embora o aperfeiçoamento dos mecanismos legais no nosso país, os resultados «são mínimos», faltando «uma estrutura com competência de análise e intervenção integrada» à semelhança do Programa Mundial da ONU Contra o Branqueamento de Capitais e do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI). Para suprir esta insuficiência, os comunistas propõem a instituição de um Programa Nacional de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, à criminalização da economia e à criminalidade organizada», assim como «a criação de uma Comissão Nacional que lhe dê concretização».

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Despenalizar o consumo

Como estratégias a adoptar na prevenção da toxicodependência e na luta contra a droga –que devem ter como objectivo «evitar que mais pessoas caiam na dependência das drogas e dar oportunidade de tratamento e reinserção social aos toxicodependentes» - o PCP propõe dois projectos de lei que despenalizam o consumo de drogas e estabelecem o regime de mera ordenação social aplicável ao seu enquadramento.
Isto implica um firme combate ao tráfico; a informação sobre os sinais correspondentes ao comportamento de risco e apoio necessário; a consideração dos toxicodependentes como doentes que precisam de ajuda e tratamento.
As propostas do PCP «demarcam-se», contudo, quer da actual legislação, que tende a criminalizar o toxicodependente, quer das posições «que não se diferenciam do apelo ao consumo de drogas».
Mantendo, pois, a moldura penal actual para o tráfico, o PCP propõe «que o consumo e a detenção de substâncias para consumo, que na actual lei da droga são actos penalizados com multa e prisão até um ano, sejam despenalizados, saiam do âmbito dos tribunais e passem a ser considerados como mero ilícito de ordenação social tratado no âmbito de uma entidade administrativa».
A aplicação de coimas, constituindo a forma de sanção normal no regime do ilícito de mera ordenação social é, no caso concreto do consumo de droga, uma medida «desajustada», pelo que o PCP propõe «como regra a advertência com chamada de atenção para as consequências perniciosas do consumo de drogas» e «o aconselhamento no sentido da aceitação de tratamento que se revele necessário». E como entidade administrativa para o contacto com os consumidores aponta o Instituto Português das Drogas e da Toxicodependência (IPDT).


«Avante!» Nº 1370 - 2.Março.2000