PCP apresenta propostas de alteração ao Orçamento
Mais justiça para quem trabalha


Termina amanhã o debate na especialidade do Orçamento de Estado para 2000. Para os deputados comunistas foi mais uma batalha por propostas justas para o país e os trabalhadores.

A discussão nas duas últimas semanas, na Comissão de Economia, foi preenchida pela discussão de propostas oriundas de todas as bancadas. Após as votações ainda em sede de comissão previstas para o final da próxima semana, o processo conhecerá o seu epílogo nos dias 14 e 15 de Março com a subida a plenário para votações na especialidade e final global.
Para a bancada do PCP esta voltou a ser uma oportunidade para, honrando os compromissos com os seus eleitores, lutar por medidas que consubstanciam o projecto político de esquerda por si preconizado para a sociedade portuguesa.
Tais propostas, na ordem das muitas dezenas, versando os mais variados domínios, não têm a pretensão de alterar radicalmente o que por si é considerado um mau Orçamento. Do mesmo modo que a hipotética aprovação de alguma delas não pode ser interpretada, como salientou Octávio Teixeira em declarações ao «Avante!», como querendo contribuir para branquear o que designou por «política fiscal injusta e de classe» do Governo.
A questão é que o PCP não abdica de intervir e de apresentar as propostas que entende adequadas e necessárias, com isso visando significar, simultaneamente, que, independentemente de uma reforma fiscal global, seria possível no OE avançar com medidas de mais justiça.
E que tal só não se verifica, como fez questão de sublinhar o líder parlamentar comunista, «porque o Governo do PS política e socialmente o não quer». Por outras palavras, que o «OE é assim mau por opção política do PS».
«Introduzir mais justiça fiscal, fazendo pagar quem não paga e pode e deve pagar e, simultaneamente, reduzir a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho por conta de outrem», eis, pois, em síntese, o princípio que anima a intervenção dos deputados comunistas no debate em sede especialidade. Como se pode ver, entre tantos outros, pelos exemplos seguidamente referenciados.

Código do IRS

É sabido que muitos trabalhadores sujeitos a «recibo verde» não exercem qualquer profissão por conta própria, mas efectivo trabalho por conta de outrem, por imposição da entidade empregadora. Com esta proposta visa-se que os rendimentos desses trabalhadores sejam fiscalmente tratados pelo que são, isto é, rendimentos de trabalho dependente.

Considerando inaceitável que pessoas que exercem as funções de administração ou gerência de entidades com fins lucrativos declarem rendimentos ridiculamente baixos, por vezes não superiores ao salário mínimo, o Grupo Parlamentar do PCP entende que a presunção de rendimento, para além de uma norma anti-abuso, é um instrumento de aproximação à determinação do rendimento real.
A presunção de existência de remuneração permite assim estabelecer, no que toca ao exercício de funções de administração ou gerência de pessoas colectivas, tabelas de remuneração mínima, em função do volume de negócios.

Não há qualquer justificação económica ou social, para que as mais-valias liquidas obtidas em instrumentos financeiros usufruam de um tratamento fiscal de favor relativamente à generalidade dos restantes rendimentos e, em particular, face aos rendimentos do trabalho. Trata-se, por conseguinte, de eliminar esse tratamento de privilégio e, consequentemente, o englobamento das mais-valias líquidas nos rendimentos do sujeito passivo de imposto.

A alteração da dedução específica é a melhor forma de fiscalmente favorecer os rendimentos do trabalho dependente, beneficiando relativamente mais os mais baixos rendimentos. Por outro lado, e visando o princípio de tributação do rendimento líquido (rendimento bruto deduzido das despesas necessárias para o obter), a dedução específica pelos rendimentos do trabalho deve tender para o valor do salário mínimo.

É política e socialmente inaceitável que, sendo reduzidas de forma substancial as taxas do IRC, não haja qualquer alteração das taxas do IRS. Por outro lado, o alargamento do número de escalões visa introduzir, de facto, o princípio da progressividade na tributação dos rendimentos. Da proposta apresentada pelo PCP resultam taxas médias inferiores que a do OE para todos os rendimentos colectáveis até 6400 contos (significa, para um casal, um rendimento bruto de 15000 contos/ano). Para um rendimento colectável de 6581 contos, a proposta do PCP prevê um pequeníssimo aumento (+ 0,0132%).

Código do IRC

O reporte de prejuízos é uma das principais fontes de evasão e fraude fiscal praticado pelas empresas constituídas em sociedades. Esse reporte só deve ser aceite quando as empresas registem, de facto, prejuízos na sua actividade normal. Eventuais resultados negativos à margem da actividade normal da empresa, por exemplo, especulação financeira, não deve ser passível de favor fiscal. Principalmente quando esses "prejuízos" de menos-valias são passíveis de fácil manipulação através da compra e venda de instrumentos financeiros em circuito fechado, entre empresas do mesmo grupo e/ou entre empresas e proprietários, administradores, gerentes, ... dessas mesmas empresas.

No discurso, toda a gente (excepto os banqueiros) consideram escandaloso que os lucros das instituições de crédito privadas, incluindo os maiores bancos privados do País, paguem uma taxa efectiva de IRS sobre os lucros obtidos igual a metade (ou menos) da taxa normal de IRC. O próprio Primeiro-Ministro considerou escandalosa e imoral essa situação. Não se entende, pois, que o Governo não proponha nada de substancial para a alterar. A proposta do PCP visa dar um primeiro, mas importante, passo nesse sentido.

Para que seja possível que a proclamada "reforma fiscal" possa ter incidência já no ano fiscal de 2001, e sendo certo que se assim não for não haverá qualquer "reforma fiscal" durante a legislatura, a bancada do PCP propõe que o Governo seja obrigado a apresentar as respectivas propostas de lei até ao fim do período normal desta sessão legislativa.
Tendo o Governo assumido como espinha dorsal dessa reforma o relatório «para o desenvolvimento da reforma fiscal» de 1996, e tendo sido elaborados durante a anterior legislatura, a solicitação do Governo do PS, 49 estudos e relatórios sobre os mais diversos aspectos dessa reforma, entende o PCP que o prazo limite de 14 de Junho é perfeitamente suficiente.

O PCP propõe a eliminação de um largo conjunto de benefícios fiscais que, para além de ilegítimos, são política e socialmente escandalosos quando em contraponto com a pesada carga fiscal que incide sobre os rendimentos do trabalho dependente, e que absorvem o melhor do «despesismo» de 440 milhões de contos da despesa fiscal que o Governo prevê no Orçamento para 2000.
A generalidade das propostas apresentadas estão, aliás, contidas no relatório da Comissão criada pelo anterior Governo do PS para reavaliar os benefícios fiscais.

Apesar de haver todas as razões para alterar a mais retrógrada e apertada regulamentação de levantamento do sigilo bancário para efeitos fiscais, existente na União Europeia e na OCDE. Apesar de o "relatório Silva Lopes" o propor desde 1996. Apesar de até já Cavaco Silva advogar esse levantamento por essencial no combate à fraude e evasão fiscais. Apesar de tudo isto e muito mais, para o Governo do PS o sigilo bancário para efeitos fiscais continua a ser um tabu. O PCP há anos que propõe o levantamento desse sigilo bancário, em determinadas circunstâncias e com determinadas regras e garantias. A proposta agora subscrita pelos deputados comunistas dirige-se, apenas, a situações limite e, por isso, mais gritantes. Para ver se, pelo menos nestes casos, o Governo do PS deixa de ser menos retrógrado que Cavaco Silva.

Em consonância com o projecto de lei por si apresentado em Novembro, o Grupo Parlamentar do PCP propõe o aumento das pensões mínimas do regime geral (para os beneficiários com menos de 15 anos de contribuição) e da pensão social, indexando-as ao salário mínimo nacional. Na proposta não estão incluídas as pensões de reforma do regime agrícola por o Governo ter, entretanto, anunciado a sua inclusão no Orçamento do Estado.
Proposto é, igualmente, um aumento, a todos os títulos exigível, do complemento aos pensionistas em situação de dependência.

As comparticipações praticadas no regime geral para próteses, ortóteses e outras ajudas técnicas são irrisíveis e chocantes, sobretudo se se atender às baixas pensões que auferem a grande maioria dos idosos no nosso País. E são eles, os idosos, os que mais necessidade têm, em geral, de recorrer a muitas dessas ajudas técnicas compensatórias. Daí a proposta do PCP para que aquelas comparticipações se aproximem dos valores já hoje praticados na ADSE.

O Governo prepara-se para impor a actualização salarial dos trabalhadores da função pública em não mais que 2,5%. O que significa, na prática, um efectivo congelamento das remunerações reais. Lesando a generalidade daqueles trabalhadores e, em particular, os que auferem menos rendimentos. Por isso, o PCP propõe que o aumento salarial de qualquer trabalhador da função pública não possa vir a ser inferior a 5.000$00 por mês, tal como o reivindicam os sindicatos da Administração Central e Local.


«Avante!» Nº 1370 - 2.Março.2000