Os Congressos do Partido - III
Resistir e crescer



Interrompidos os trabalhos do II Congresso no próprio momento em que tinham início e se dava o golpe militar que viria a instituir a ditadura fascista, encerrada a sede do PCP em 1927, nem por isso o PCP desaparece sob a repressão. O Partido Comunista Português forja-se na luta clandestina.

O PCP cresce e fortalece-se até se tornar num grande partido nacional, enquanto todas as outras forças políticas de oposição soçobram, são liquidadas ou se auto-liquidam. De 1926 a 1943, data do III Congresso, vai uma história de grandes lutas de massas, de actos de heroísmo face ao inimigo de classe que, em Portugal como no mundo, não pára de se fortalecer. De um persistente trabalho de organização que culmina com a profunda reorganização de 40/41.
Se a luta contra a ditadura se inicia imediatamente após a sua instauração, com sucessivas revoltas - 7 de Fevereiro de 1927 com a revolta armada iniciada no Porto e logo apoiada por unidades do Exército e da Marinha; revolta do Batalhão de Caçadores 7 em 1928; revolta da Madeira em 1931 - a ditadura continua a fortalecer-se e consegue por fim o controlo e domínio das forças armadas. E desde logo, como assinala Bento Gonçalves, se precisa o seu conteúdo como «política do capital financeiro»: «Toda a actividade é caracterizada por uma sucessão de financiamentos às principais empresas exploradoras.» «O 7 de Fevereiro», escreveu Bento Gonçalves, «colheu nestes factos a sua base económica. Mas revelou que, nas condições criadas, era impossível vencer a reacção sem o largo concurso popular, mas de um povo que actua sobre a base de uma consciência diferente daquela que o levou à revolução de 1910».
Do lado do fascismo, o estabelecimento das suas bases institucionais, seguindo os modeles de Itália e, mais adiante, da Alemanha nazi, fortalecem o regime salazarista e o seu domínio, permitindo um rápido desenvolvimento do capitalismo monopolista, acompanhado do agravamento da exploração das massas e da repressão política.
Do lado da oposição, apenas o PCP se mantém e se reforça e cresce nas duras condições da clandestinidade. É a partir de 1929 que o PCP, com Bento Gonçalves, lança as bases de uma organização de tipo leninista, aprofunda as suas ligações à classe operária, avança na criação de organizações de massas e dirige numerosas lutas contra a exploração. O Partido está no centro das lutas e é reconhecido como vanguarda da classe operária. Grandes movimentos grevistas são lançados, com destaque para a greve insurreccional do 18 de Janeiro de 1934. O crescimento e afirmação do PCP torna-o alvo da mais feroz repressão e numerosos comunistas são presos, o Tarrafal torna-se num campo da morte.
É numa situação nacional e internacional extremamente difícil - com a vitória das forças g«fascistas em Espanha e o domínio nazi em grande parte da Europa, que o PCP empreende a reorganização de 1940/41, visando criar uma organização clandestina capaz de resistir à repressão e de dar estabilidade ao trabalho de direcção partidária, permitindo ao PCP encabeçar as grande lutas operárias e impulsionar grandes movimentos unitários contra o fascismo. Ao realizar, em 1943, o seu III Congresso, o PCP é já um grande partido nacional.


Sérgio Vilarigues:
Um partido nacional

«Foi no Monte Estoril, em Novembro de 1943.» Assim começa Sérgio Vilarigues, um dos participantes no III Congresso do Partido, recordando para o «Avante!» essa já longínqua jornada. «Começou numa quarta-feira e acabou no sábado seguinte. Deslocámo-nos para lá com os máximos cuidados conspirativos, como não podia deixar de ser, e ainda hoje não sei exactamente onde se realizou.»
«Estavam representadas todas as regiões do País, à excepção de duas. Nessa altura, o Partido já era um partido nacional, com um conjunto de revolucionários a tempo inteiro que, apesar de não serem muitos e ficarem aquém das necessidades, desenvolveram um importante trabalho juntamente com muitos quadros não funcionários mas com grande dedicação e responsabilidade.
«A reorganização de 40/41 tinha proporcionado um grande passo em frente: o Partido implantou-se nas empresas, trabalhou para a criação de Comissões de Unidade, e tudo isso viria a conduzir às greves de Outubro/Novembro de 42 e de Julho e Agosto de 1943, greves que foram organizadas e dirigidas pelo Partido e que só foram possíveis devido ao crescimento do Partido.
«A palavra de ordem era recrutar militantes para o Partido entre os operários que mais se destacavam na luta, especialmente nas greves de 43. As Comissões de Unidade eram também um grande viveiro de recrutamento.
«Tínhamos boas organizações em vários pontos do País, por exemplo no Algarve e em certas zonas do Alentejo, mas as organizações mais poderosas eram em Lisboa e Setúbal que, aliás, foram sempre as mais poderosas.
Em 42, tivemos uma série de perdas: em Julho foram presos vários camaradas, nomeadamente o Pires Jorge, o Júlio Fogaça e o Pedro Soares e, em Novembro, foi preso o Militão Ribeiro.»

E Sérgio Vilarigues prossegue, referindo-se mais particularmente ao Congresso:

«O tema principal do Congresso foi o reforço da organização do Partido e o desenvolvimento da luta de massas. Fizemos uma discussão muito aprofundada das greves que tinham tido lugar uns meses antes. As questões da unidade antifascista foram outro dos temas importantes do Congresso, estava então em fase de formação o MUNAF que pouco tempo depois foi anunciado..
O Congresso teve repercussões muito significativas: avançou-se no reforço da organização e estruturação do Partido, os recrutamentos aumentaram, o número de funcionários também, e decidiu-se avançar com uma campanha de fundos de 50 contos...
«Havia, já nessa altura, o máximo respeito pelo funcionamento democrático interno do Partido; isto apesar das condições difíceis da clandestinidade impostas pelo regime fascista.
«O Comité Central eleito pelo III Congresso era composto pelos camaradas Álvaro Cunhal, José Gregório, Manuel Guedes, Pires Jorge, Sérgio Vilarigues, Alex, Dias Lourenço e Piteira Santos. E, como suplentes, o José Martins e o Joaquim Campino.»


«Avante!» Nº 1371 - 9.Março.2000