Época alta
Por Rodolfo Caseiro
O sector da Hotelaria e Turismo no nosso país passa talvez pelo melhor período da sua história, e isso é facilmente constatado, não só pelas opiniões das entidades ligadas ao sector, como pelos dados estatísticos oficiais que apontam nesse sentido.
Em 1999, os turistas
entrados rondaram os 11,6 milhões (mais 2,7% que em 1998), a
taxa média de ocupação na Hotelaria apresenta crescimento em
praticamente todo o País, e as receitas turísticas aumentaram
cerca de 8,2 pontos percentuais relativamente ao ano anterior,
atingindo os 945 milhões de contos.
Os indicadores de ocupação e venda da Hotelaria na capital,
referidos na BTL 2000, revelam a consolidação do
crescimento registado pelo efeito Expo98. A principal
conclusão é a de que a Expo98 elevou o patamar do
desempenho turístico para um nível superior ao de anos
anteriores o que, de outro modo, demoraria vários anos a
atingir.
Um sector que representa 10% da riqueza nacional e da população
activa não pode obviamente manter aqueles que produzem essa
riqueza, os trabalhadores, numa situação de degradante
instabilidade.
Toda esta realidade influencia positivamente a nossa economia.
Contudo, tal benefício não tem correspondência com as
condições de vida dos seus trabalhadores. O salário médio do
sector é inferior ao praticado noutros ramos de actividade, em
cerca de 27%. Não há razão lógica para esta situação
degradante.
O sector está bem financeiramente, e o que é que isto
significa?
Significa que não basta haver riqueza produzida, é necessário
que essa riqueza seja bem distribuída, quer através da
elevação dos salários quer através de benefícios sociais e
salvaguarda dos direitos dos trabalhadores.
Qualidade?
Depois, fala-se de
qualidade! Mas como pode haver qualidade, com os métodos mais
refinados e sofisticados que hoje existem e que são aplicados
nas empresas para intimidar, despedir, ou discriminar os
trabalhadores?
As empresas comportam-se da forma mais baixa, através de
sociólogos e juristas, que vestem a pele de mercenários da
Sociedade. Isolam os trabalhadores, individualizam as
situações, procuram isolar as estruturas dos trabalhadores,
para mais facilmente os enganarem. Para mais facilmente se
explorar quem trabalha, é preciso alguma habilidade para
convencer os trabalhadores que tudo se faz em seu benefício e
isso é, muito bem assumido, pelos tais mercenários do capital.
Toda a gente fala de qualidade: fala o Governo, fala o
patronato... Nós também queremos qualidade, mas com sentido e
conteúdo completamente diferentes.
Para o patronato, qualidade significa lucros e mais lucros
conseguidos a qualquer preço, através de precariedade,
repressão e exploração desenfreadas.
Para o Governo significa dar cobertura a toda esta pretensão do
patronato com a ineficácia da IGT.
Para os trabalhadores, a qualidade de serviços prestados é
incompatível com baixos salários, com a precariedade a todos os
níveis, repressão e trabalho sem direitos.
Contrato atacado
Como se não
bastasse tudo isto, os patrões querem acabar com o contrato
colectivo de trabalho dos hotéis.
Desde há longos anos o sindicato vem defendendo que, para haver
qualidade nos serviços prestados, é necessário que os patrões
apostem na valorização dos trabalhadores, pagando-lhes
salários dignos, e respeitem os seus direitos,
proporcionando-lhes condições para o exercício das suas
funções profissionais.
Ao invés, a Associação dos Hotéis de Portugal apresentou uma
proposta de revisão do CCT que é uma autêntica provocação
aos trabalhadores.
No clausulado pretende, entre outras coisas, horários de
trabalho sem regras, eliminar as normas que salvaguardam os
trabalhadores no aspecto disciplinar, eliminar direitos que
garantem a segurança da retribuição, férias e definição de
funções, não querem descontar a quotização dos trabalhadores
para o sindicato, pretendem retirar o direito à alimentação em
espécie, etc.
Está mais que provado que as causas do bloqueio, do boicote à
negociação colectiva com o apoio descarado do Governo PS, em
muitos casos não está sequer nas divergências quanto aos
salários, mas sim, no conteúdo concreto das propostas do
patronato.
A instabilidade do emprego e repressão são duas «tácticas»
fundamentais que o patronato emprega directamente para procurar
suster a luta dos trabalhadores na defesa dos seus direitos.
Mas, os trabalhadores dos hotéis, com a sua enorme
demonstração de força, de consciência, firmeza e
determinação demonstradas nos últimos tempos vão prosseguir a
sua luta com muita confiança. Até 23 de Março, numa altura em
que as unidades do sector estão com excelente ocupação, todos
os dias vão estar em luta, denunciando a atitude dos patrões
através de carro de som, e distribuição de um comunicado aos
clientes, em inglês e francês.
Todas estas acções culminam com uma concentração do sector
junto à associação patronal, dia 23 de Março, pelas 11 horas,
com integração à tarde na grande manifestação nacional da
CGTP.