Reestruturação da RTP
Estratégia votada ao fracasso



Com o objectivo de reestruturar a RTP, O Governo criou a «Portugal Global». Para o PCP este é mais um sinal de desorientação do Executivo a quem faltam ideias sobre o que é o serviço público de televisão.

Na perspectiva do deputado comunista António Filipe, que levantou o assunto numa das sessões plenárias da semana transacta, a anunciada reestruturação mais não é do que uma operação de «engenharia financeira» que, não resolvendo a questão do serviço público de televisão, em processo de destruição, procura resolver o passivo da RTP à custa da saúde financeira da agência Lusa e da RDP.
Analisando a opção governativa agora adoptada, o deputado do PCP critica sobretudo o que considera ser a ausência de uma política que valorize o serviço público. Vai mesmo mais longe e acusa o Governo de não ter a este respeito «uma única ideia coerente» quanto ao futuro, ou seja, não ter qualquer estratégia, para além das intenções da privatização de segmentos de negócio.
António Filipe disse estar a assistir-se, reportando-se às justificações dadas pelo ministro Adjunto do primeiro-ministro, Armando Vara, a um «discurso patético» sobre alegadas «sinergias» entre a RTP, a RDP e a agência Lusa para justificar a constituição da holding «Portugal Global».
«Varrer o passivo financeiro da RTP para debaixo da holding, em vez de um investimento que possa viabilizar uma verdadeira programação de serviço público e de uma política de apoio à produção audiovisual» é, na perspectiva de António Filipe, o grande objectivo da reestruturação agora promovida pelo Governo na comunicação social onde o Estado é maioritário em termos de capital.


Contradições insanáveis

Um objectivo que, pelos vistos, não reúne consenso no próprio seio do Executivo. Como evidenciou António Filipe ao chamar a atenção para as contradições existentes entre membros do Governo e que separam, por exemplo, o Ministro da Cultura do Ministro Adjunto do Primeiro Ministro. Por si recordado foi concretamente o texto publicado num semanário por Maria Carrilho, no qual este critica o «mimetismo programático» em relação às televisões privadas, fazendo simultaneamente apelo à qualidade e ao pluralismo, com recusa de uma visão mercantilista do serviço público.
Tal artigo, segundo António Filipe, vem dizer que o problema da RTP não é empresarial - ao contrário do que afirma Armando Vara, que reduz a questão a essa dimensão empresarial - , demonstrando ao mesmo tempo a «inconsistência estratégia» da política governamental em matéria de serviço público televisivo.
Verberado pela bancada comunista no processo de constituição da holding foi ainda o facto de o Governo «não ter ouvido os trabalhadores» sobre essa decisão - «longe vai o Governo do diálogo, quando nem já os ministro dialogam entre si», comentou -, e que terá «apanhado de surpresa as próprias administrações envolvidas».
Acresce a «possibilidade de serem dispensados 500 trabalhadores na RTP», segundo rumores que circulam, o que somado à desorientação do Governo e à falta de clareza dos objectivos da holding justifica, na opinião de António Filipe. «fundados receios de que esta opção possa ser mais uma das muitas achas que nos últimos têm ateado a fogueira em que a RTP se vem consumindo».


«Avante!» Nº 1371 - 9.Março.2000