Precariedade
multinacional

Por José Machado



No sector dos fabricantes de material eléctrico e electrónico, onde pontuam grandes grupos multinacionais, a precariedade e a segmentação do emprego têm vindo a acentuar-se. É baixo o grau de habilitações e qualificações da população empregada, particularmente dos trabalhadores mais antigos, e as empresas não apostam na formação contínua.

Algumas categorias de trabalhadores são particularmente atingidas.
Os jovens têm uma inserção, quase sempre, precária. Apesar do nível de educação, estão, na sua maioria, em ocupações de baixos salários e menor qualificação.
O emprego feminino é muito elevado, o que é positivo, mas mantêm-se regimes discriminatórios no plano salarial e profissional para muitas trabalhadoras.
A Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Eléctricas de Portugal, em conjunto com os sindicatos federados, tem desenvolvido várias acções sindicais, com resultados positivos, contra a precariedade do emprego nas multinacionais deste sector, envolvendo na luta sindical os trabalhadores precarizados, na base do princípio de que a postos de trabalho de natureza permanente devem corresponder contratos de trabalho permanentes, e pressionando a Inspecção Geral do Trabalho a intervir, assumindo as suas responsabilidades de fiscalização.
Contudo, não conseguimos impedir os números inaceitáveis de precariedade nalgumas multinacionais, apurados nos balanços sociais destas empresas: a Philips de Ovar tem 52 por cento de trabalhadores com contrato precário, num total de 2377: a Indelma (do grupo Siemens) tem 30 por cento de trabalhadores precarizados, num total de 2076, e admitiu mais 700 trabalhadores sob a forma de aluguer de mão-de-obra (trabalho temporário): a UTA, multinacional americana, tem 60 por cento de trabalhadores precarizados, de um total de 3572 (dos precarizados, 83 por cento são mulheres). Estes são os casos mais graves, já que todas as empresas multinacionais deste sector utilizam de forma excessiva a contratação a termo.


Quem as trava?


São ainda as multinacionais fabricantes de material eléctrico e electrónico responsáveis por graves processos de deslocalização, como sucedeu há aproximadamente um ano com a Texas-Samsung, que lançou no desemprego 780 trabalhadores, não devolvendo ao Estado a totalidade dos milhões de contos que recebeu de incentivos fiscais e verbas do PEDIP.
Estes comportamentos têm que ser impedidos, o que exige, ao nível da União Europeia, a definição de regras que impeçam a continuação desta actuação de algumas multinacionais.
Por outro lado, a elevada precariedade do emprego, no sector dos fabricantes de material eléctrico e electrónico, tem profundos efeitos negativos no tecido produtivo: cria grande desmotivação nos trabalhadores, já que põe em causa os seus direitos, mesmo os mais elementares; alimenta de forma inaceitável uma cultura de não cumprimento da legalidade democrática por parte das multinacionais; incentiva uma actividade produtiva baseada em baixos salários e na fraca qualidade do emprego; desincentiva a qualificação e a formação contínua dos trabalhadores; e tem pesados custos em termos de sinistralidade e doenças profissionais (não podemos deixar de referir, a propósito, as mais de duas mil jovens trabalhadoras, designadamente, da Yazaki, da Delphi, da Indelma, da Philips e da Ford Electrónica, que estão incapacitadas por terem ficado afectadas com tendinites, resultantes de processos de produção e equipamentos desadequados).
É necessário criar, definitivamente, condições para que os contratos a prazo só sejam aceitáveis em actividades de natureza objectivamente temporária.
O desemprego e a precariedade são um efeito de várias causas. É necessário atacar essas causas, que passam, no essencial, pelas políticas económicas erradas desenvolvidas na União Europeia, assentes num modelo de desenvolvimento desajustado, que não consegue responder às necessidades de criação de mais emprego com menos precariedade.
Para inverter este caminho, exige-se uma empenhada intervenção, em cada País e ao nível europeu, das forças políticas da esquerda, particularmente no Parlamento Europeu. Não são conclusões como as das cimeiras do Luxemburgo, de Colónia ou de Lisboa que podem resolver o grave problema do desemprego e do emprego de qualidade a nível europeu.
Os trabalhadores portugueses e o movimento sindical, dirigido pela CGTP-IN, conhecem as causas e os efeitos do desemprego e da precariedade. Por isso realizaram, no dia 23 de Março, um grande protesto nacional, exigindo mais e melhor emprego, sem precariedade.


«Avante!» Nº 1374 - 30.Março.2000