Dezenas de
milhares de trabalhadores desfilaram em Lisboa
no primeiro dia da Cimeira da UE
O
protesto soou bem alto
Texto de Domingos Mealha
Dos Jerónimos até aos pilares da Ponte 25 de Abril, Lisboa viveu na tarde de 23 de Março uma grande manifestação nacional, que levou à opinião pública e aos chefes de Estado e de Governo dos «quinze» a desmistificação do Portugal côr-de-rosa e a exigência de políticas que acabem com a precariedade e valorizem o trabalho.
O número mais referido, nas notícias sobre a enorme
manifestação que marcou o primeiro dia da Cimeira da UE, foi 50
mil, citando a polícia. Mas todos reconheciam a clara
dificuldade em contar os milhares de trabalhadores que, durante
mais de duas horas, desfilaram entre o Mosteiro dos Jerónimos e
a antiga FIL. A Lusa dá nota de várias estimativas que variavam
entre os 50 e os 100 mil manifestantes.
Muitos dos que mergulharam na manifestação à beira-Tejo não
tiveram aqui a única participação na jornada de dia 23.
Sindicatos de vários sectores apresentaram pré-avisos de greve,
para permitir que os trabalhadores se integrassem na acção
nacional da CGTP. A anteceder o desfile, marcado para as 15
horas, houve concentrações de ferroviários, de pessoal da
hotelaria e restauração, de professores... Milhares de
trabalhadores da Função Pública (com greve a decorrer no
sector da Saúde) concentraram-se frente ao Palácio de Belém,
onde aguardaram a chegada dos dirigentes da CGTP e da CES, que
seguiam à cabeça do desfile, com a Interjovem logo a seguir. A
Administração Pública tinha uma forte presença, com
representantes de praticamente todos os sectores, destacando-se a
administração local e a Função Pública (com os trabalhadores
do Estado seguia também o secretário-geral do PCP, acompanhado
por dirigentes e deputados comunistas e por alguns participantes
no forum europeu que o Partido levou a cabo nesse mesmo dia), os
professores, os enfermeiros, os estabelecimentos fabris das
Forças Armadas.
Nas estruturas distritais da CGTP, para além de Lisboa e
Setúbal, notava-se uma forte presença do litoral Norte, com os
trabalhadores têxteis e do calçado, das indústrias
eléctricas, do comércio, da hotelaria, da química, dos
correios e das telecomunicações; mas as faixas desfilavam de
Aveiro ao Algarve, de Vila Real a Évora, de Viana à Guarda,
Leiria, Coimbra, Santarém, Beja...
Nas faixas e nos cartazes reconhecia-se nomes de empresas que
têm sido palco de conflitos laborais nas últimas semanas
(transportes da Grande Lisboa, Unilever, Petrogal, Opel, Água de
Luso, Kallen, Lanalgo, Têxtil Manuel Gonçalves), a par de
processos mais prolongados, como os Cabos Ávila (cujo pano
marcava 835 dias de luta), os mineiros de Aljustrel, as mulheres
da Norporte ou os empregados do Chiado ardido.
Junho no Porto
Num palco montado debaixo da Ponte 25 de Abril, Carvalho da Silva falou sobre os motivos que ali levaram tantos portugueses (aos quais se juntaram umas dezenas de sindicalistas estrangeiros, entre os quais o secretário-geral da Confederação Europeia de Sindicatos, Emilio Gabaglio). Depois de ter falado da precariedade de emprego, dos elevados horários de trabalho e da falta de formação, salientou que «este não pode ser o emprego de uma sociedade moderna» e desafiou o primeiro-ministro português a quantificar algumas intenções expressas durante a Cimeira uma das reivindicações que integram a resolução proposta pela CGTP e aprovada no final da manifestação. Neste documento afirma-se a disponibilidade dos que estiveram dia 23 em Lisboa para voltarem a fazer ouvir o seu protesto no dia 19 de Junho, no Porto (quando decorrerá em Santa Maria da Feira a Cimeira que encerra a presidência portuguesa da UE).