O Óscar
Ele há óscares para tudo. A moda é
americana mas felizmente já se estendeu a todos os sectores, que
ninguém desdenha de levar para casa um balde de plástico quanto
mais um troféu, seja porque na opinião de uns tantos se tem uma
carinha laroca, um sorriso cativante ou uma língua afiada, que
nisto de dotes cada um tem os seus e não está escrito em lado
nenhum que é obrigatório ser-se um crânio para ter direito às
luzes da ribalta, por efémeras que sejam, apesar de até à data
não estar provado que sirvam para outra coisa do que alimentar o
ego, o que, convenhamos, não é pouco, e para encher os bolsos a
umas quantas indústrias concebidas a preceito para aliviar
papalvos, o que até é muito.
Do cinema à música, da televisão à moda, é um ver se te
avias nesta época do ano, com os óscares a fazer correr rios de
tinta e a vender milhões de revistas, sabendo-se como se sabe
que quem não tem cão caça com gato, que é como quem diz quem
não faz parte dos nomeados ou do júri nem por isso deixa de
viver os acontecimentos, por interposta revista ou televisão, é
certo, mas participando, gastando horas e horas no acompanhamento
do processo, dizendo de sua justiça em família ou tertúlia de
amigos, discutindo, opinando e até mesmo votando, facto digno de
registar para a posteridade, pois um simples gesto de fazer uma
chamada telefónica ou de comprar as revistas que amavelmente
fornecem os cupões de voto basta para que se abram as portas
desta verdadeira democracia participativa.
Como no melhor pano cai a nódoa, é evidente que também este
paraíso teve até recentemente o seu senão, a saber, a completa
marginalização da classe política governante, fenómeno que
Freud certamente explicaria mas que, na sua ausência, me atrevo
a classificar de manifestação inconsciente do mal-agradecidos
que somos todos, ruins como as cobras, sempre prontos a pôr
defeitos e a calar virtudes que mesmo quando não vislumbradas
certamente existem, como as bruxas, salvo seja.
Pois esta clamorosa injustiça chegou agora ao fim, e em boa
hora, pela mão do Financial Times, que em letra de forma
«nomeou» segunda-feira o primeiro-ministro António Guterres
para a «melhor actuação» política na União Europeia,
graças à «magnífica» performance na Cimeira de
Lisboa, onde, pasme-se, levou os Quinze a acordarem numa média
anual de crescimento de cinco por cento para a União Europeia e
na criação de 20 milhões de empregos numa década. Coisa de
mestre, há que convir. O jornal não diz, mas parece que o
Óscar é na modalidade de ficção. Anabela Fino