Governo e administrações prejudicam mais que as greves
Luta justa nos transportes



Trabalhadores e passageiros sofrem há anos os efeitos das privatizações, da diminuição do emprego, do aumento da precariedade, das reduções na quantidade e qualidade do serviço, da insistência em manter salários baixos.


Dirigentes sindicais dos caminhos-de-ferro, da Carris, do Metro e da TAP, ao exporem para o «Avante!» os motivos da luta e do descontentamento nos transportes colectivos de passageiros, fizeram uma crítica severa às políticas levadas a cabo pelos governos do PS e do PSD e pelos homens que estes colocaram à frente das administrações.


Único caminho

Fazer greve é «uma decisão que tem de ser muito ponderada», mas «não nos resta outro caminho, face ao comportamento dos conselhos de administração na negociação salarial, onde claramente não estão de boa fé», diz António Morais, dirigente da Federação dos Sindicatos dos Transportes Rodoviários e Urbanos e controlador de tráfego na Carris, onde trabalha há 34 anos.
Refere que as negociações deveriam ter-se iniciado em Novembro, mas em Abril ainda é preciso convocar greve para desbloquear o processo. Acusa o presidente da Carris de «tentar pôr a população contra nós e pressionar os trabalhadores, dizendo que a greve ameaça a viabilidade da empresa e que devem aceitar baixos salários». Mas remata, com satisfação: «Os trabalhadores têm dado a devida resposta, aderindo quase na totalidade às greves.»
A diminuição do número de trabalhadores e o aumento da produtividade é uma constante nas transportadoras públicas.
«O Metro admitiu mais trabalhadores, mas a oferta de serviço aumentou muito», diz Diamantino Lopes, também dirigente da Festru/CGTP, apontando o período antes e depois da Expo ‘98, e acrescentando que a empresa quer pôr como norma os comboios com agente único e as estações apenas com um agente.
«Não há razão para recusar a nossa proposta de aumentos salariais», diz o dirigente da Festru e maquinista do Metro há 18 anos. Diamantino Lopes afirma mesmo que, «em termos relativos, se tivermos em conta o alargamento da rede, o Metro tem hoje menos pessoal do que tinha há dez anos». A posição da administração «tem fundamentos políticos», pois «o Governo quer servir-se das empresas públicas para tentar nivelar os aumentos salariais no País».


Défices

O sector ferroviário e a TAP são frequentemente referidos a propósito da situação deficitária das empresas. Mas, detectado o mal, têm sofrido muito com as «curas».
José Manuel Oliveira, dirigente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário, começa por reafirmar que os saldos negativos não têm as suas raízes nos salários, que continuam muito baixos, em termos absolutos, e escandalosamente inferiores aos praticados na UE. Depois de rcordar que o Estado não cumpre as suas obrigações quanto ao pagamento das indemnizações compensatórias pela prestação de um serviço público essencial e estratégico, aquele operário electricista que trabalha há 19 anos na CP, nota que, «quando desta última reestruturação, em que foram separadas a Refer, a Emef e a CP, o défice era de 50 milhões de contos anuais, mas, pelo que foi tornado público, no ano de 1999 o défice foi de 50 milhões de contos, só na CP, depois de terem saído desta empresa cerca de 6 mil trabalhadores».
A segmentação da TAP não é solução, diz Luísa Ramos, dirigente do Sitava e uma entre os 6 mil trabalhadores de terra a quem a administração propôs que, este ano, as tabelas salariais ficassem congeladas, a troco de um adicional que teria um valor médio de 1,47 por cento, significando no total mais 400 mil contos – enquanto para 473 pilotos foi assumido, no mesmo cenário de défice, um encargo de 1,8 milhões de contos. Os trabalhadores não podem ser penalizados por garantirem uma produtividade superior à média nacional, quando até os resultados mais recentes já provam que as dificuldades da TAP nascem numa má gestão e em opções estratégicas erradas, tardias ou inexistentes.


«Avante!» Nº 1375 - 6.Abril.2000