Justas exigências do Interior

Por Carlos Brito



Em período de definição dos projectos que serão contemplados no III Quadro Comunitário de Apoio, o Interior mexe-se para tentar atenuar os seus gravíssimos atrasos resultantes de séculos de abandono.

Em regiões fortemente marcadas pela desertificação e o despovoamento, esta reacção é uma respeitável manifestação de vitalidade na luta contra as assimetrias regionais.
Asseguram-na, principalmente, as autarquias e associações de vário tipo, com destaque para as de desenvolvimento e de defesa do património que procuram, por um lado, mobilizar as populações, e, por outro, sensibilizar os poderes públicos e os responsáveis políticos do país para as justas exigências do Interior.
Na passada sexta-feira, dia 30, Mértola foi o palco de uma realização exemplar no âmbito desta luta por uma justa política de desenvolvimento regional. Tratou-se do Forum Guadiana 2 000, organizado pela Associação de Defesa do Ambiente daquela vila alentejana.
No centro do debate esteve não apenas o concelho de Mértola, mas todo o Baixo Guadiana, compreendido como a região que vai do Pulo do Lobo a Vila Real de Sto. António, pelas duas margens do rio, abrangendo os municípios algarvios da margem direita e os municípios espanhóis da margem esquerda.
Por isso, juntaram-se ali representantes autárquicos e dirigentes do movimento associativo de todos eles, que em português e castelhano dialogaram intensamente com docentes das Universidades de Évora, do Algarve e de Sevilha e técnicos dos Ministérios e estruturas de Coordenação Regional.


Em busca de respostas

Por esta forma se procurou, mais uma vez, encontrar respostas para sustar a desertificação e despovoamento e definir estratégias capazes de melhorar as condições de vida das populações e assegurar um efectivo desenvolvimento.
A grande novidade foi, a de que, desta vez, a reflexão incidiu não apenas no município anfitrião, mas em toda o região que tem por eixo o rio Guadiana.
Isto mesmo, foi sublinhado, à partida pelo Presidente da Câmara de Mértola, camarada Paulo Neto, salientando que esta nova perspectiva talvez ajude a encontrar melhores soluções para valorizar as potencialidades da região, dar mais eficácia aos esforços que dentro dela se estão fazendo e colocar ao Governo e aos poderes públicos, em geral, as grandes exigências em relação às questões estruturantes, como a navegabilidade do Guadiana, a via rápida entre Beja e Vila Real de Sto. António (IC -27) e outras acessibilidades, como a ponte Alcoutim-Sanlúcar. Terminou lançando um aviso de que é preciso andar de pressa pois «corremos o risco de virmos a ter ideias e já não haver pessoas».
O mesmo alarme foi lançado pelo Presidente da Câmara de Alcoutim, Dr. Francisco Amaral, ao enfatizar: «Queremos o IC-27 enquanto há vida por aqui!».


Entre a desertificação
e a esperança


Não se julgue que estas expressões dos dois autarcas são meras figuras de retórica. Não são: em 30 anos, o concelho de Mértola perdeu cerca de dois terços da sua população e o concelho de Alcoutim perdeu, em quarenta anos, mais de metade da população, o mesmo acontecendo às freguesias serranas dos concelhos de Castro Marim, Tavira e Loulé.
Foi este o pano de fundo de muitas horas de reflexão em torno das cerca de vinte comunicações, que se distribuíram por quatro painéis temáticos: O Baixo Guadiana como unidade geográfica; Qualidade ambiental; O Turismo no Baixo Guadiana; Estratégia para o desenvolvimento.
Seguiu-se um animado debate em que as preocupações em relação à situação da região e a decepção com as políticas governamentais, foram temperadas por algumas notas de esperança sobre os esforços conjuntos a fazer no futuro.
O Prof. Cláudio Torres tinha salientado, na comunicação que apresentou ao Forum, que «o rio foi historicamente o elemento unificador de toda região».
Pois no presente, a unidade à volta do rio e os esforços comuns das comunidades ribeirinhas, do Alentejo, do Algarve e da margem espanhola, foi talvez a maior esperança, que o encontro entre elas produziu, para uma nova época de cooperação e para dar mais força às justas exigências do Interior.


«Avante!» Nº 1375 - 6.Abril.2000