Precariedade alastra
na Europa comunitária

Por Eugénio Rosa



Como consequência da globalização neoliberal que começámos a analisar em artigos anteriores, a precariedade de emprego tem alastrado de uma forma vertiginosa por toda a Europa Comunitária, constituindo actualmente o problema social mais grave que esta enfrenta, como provam os dados do quadro um, publicados pela própria Comissão Europeia.


Entre 1991 e 1998, a população total com vínculo precário em relação ao emprego, que inclui os trabalhadores independentes, os empregados a tempo parcial, os contratados a prazo e os desempregados passaram de 72,6 milhões para 84,9 milhões de europeus, ou seja, em apenas 4 anos aumentaram em 16,9 por cento. Em percentagem da população activa total, o valor cresceu de 44 por cento em 1991 para 50,5 por cento em 1998, ou seja, verificou-se um aumento de 13,5 por cento
Portanto, pode-se dizer que em 1998 em cada 100 europeus activos, mais de metade estavam numa situação precária, isto é, ou eram independentes, ou eram contratados a prazo, ou tinham um emprego a tempo parcial, ou estavam no desemprego, enquanto, em 1991, esse número era de 44 em cada 100.
A manter-se o mesmo ritmo de precarização, e tudo leva a crer que esteja a suceder isso, embora ainda não existam dados oficiais publicados, é de prever que no fim do ano 2000, cerca de 54 em cada 100 europeus activos estejam numa situação de trabalho precário, ou seja, ou são independentes, ou contratados a prazo, ou têm um emprego a tempo parcial, ou estão no desemprego. Eis o que está a suceder ao modelo social europeu como consequência da globalização neoliberal imposta pelo poder americano, a que os governo da Europa Comunitária se têm rendido.


A precariedade está a crescer
ainda mais em Portugal

Comece-se por observar o quadro dois que foi construído utilizando dados oficiais publicados pelo INE.
De acordo com os dados daquele quadro, a população activa portuguesa em situação precária (e neste número incluímos, tal como sucedeu anteriormente, os trabalhadores com contratos a prazo, os com contratos atípicos, os com contratos a tempo parcial, os independentes, e os desempregados, quer os considerados oficialmente quer ainda os desencorajados), somava, no 2º trimestre de 1992, 2 727 000, e, no 3º trimestre de 1999, atingia já 3 232 700. Portanto, em pouco mais de 7 anos aumentou em mais de meio milhão (mais 18,5 por cento).
Se calcularmos a percentagem que a população em situação precária representava em relação à população activa portuguesa, concluímos que no 2ºtrimestre de 1992 ela correspondia a 59 por cento da população activa total, e no 3º trimestre de 1999 já atingia 64 por cento. Dito de outra maneira, em 1992, 59 portugueses em cada 100 activos estavam numa situação precária, enquanto em 1999 esse número já tinha subido para 64 em cada 100 activos, o que significava que ou tinham um contrato a prazo, ou pertenciam à categoria de independentes, ou tinham um emprego a tempo parcial, ou estavam desempregados. Portanto, uma situação de precariedade consideravelmente superior à média europeia, que já era extremamente grave.
Por outro lado, os dados anteriores revelam outras tendências também graves. Por exemplo, entre 1992 e 1999, os contratos permanentes diminuíram em 0,4 por cento, enquanto os contratos a prazo aumentaram em cerca de 23 por cento, e os atípicos em mais de 166 por cento.


O documento inócuo
da presidência portuguesa

Face à gravidade desta situação, que fez a Presidência Portuguesa da União Europeia? Elaborou um longo documento com várias dezenas de folhas, cheio de lugares comuns e de boas intenções, e de grandes declarações, que soam bem ao ouvido, mas onde nem um única vez é referido a gravidade que representa o alastramento vertiginoso do trabalho precário em toda a Europa Comunitária, o qual está sempre associado à insegurança no emprego, ao aumento da exploração e das desigualdades, à redução de direitos, à destruição gradual mas real do modelo social europeu.
Efectivamente, o documento elaborado pela presidência portuguesa está recheado com grandes declarações sobre pleno emprego («é preciso reconquistar as condições de pleno emprego»), sobre «coesão social», sobre «uma economia e sociedade baseada na inovação e no conhecimento», sobre «uma política europeia para a sociedade da informação», etc., etc., e sobre a necessidade de «renovar o modelo social europeu», etc, mas quanto a medidas concretas ou não as aponta, ou quando aponta limita-se a enumerar aquelas que têm favorecido ou têm sido inócuas face ao avanço da globalização neoliberal em toda a Europa Comunitário, a qual está a determinar que se caminhe para uma grave crise económica e social, que mesmo um antigo ideólogo das políticas de Margaret Thatcher, como John Gray no seu livro «Falso Amanhecer», reconhece e denuncia com vigor («o controlo do sistema económico pelo mercado tem um impacto catastrófico em toda a organização da sociedade» - pág. 25), mas que passa ao lado, sendo mesmo ignorado no documento elaborado pela Presidência Portuguesa.

Evolução da população com vínculo precário
nos países da União europeia (15) entre 1991 E 1998

RUBRICAS

UNID.

1991

1994

1996

1997

1998

1-POPULAÇÃO TOTAL Em milhões

366

371

373

374

375

2-POPULAÇÃO ACTIVA Em milhões

165

165

166

167

168

3-EMPREGO TOTAL Em milhões

152

147

148

149

151

(a) Trabalhadores independentes Em milhões

22

22

22

22

22

(b) Empregados a tempo parcial Em milhões

21

23

24

25

26

(c) Empregados com contrato a prazo Em milhões

16

16

17

18

CAPut!

4-PRECARIEDADE PARCIAL NA UE15            
Em número ( a+b+c )

Em milhões

59

61

64

66

68

5-DESEMPREGO NA UE15 Em milhões

13,6

18,4

18,2

17,9

16,9

6-PRECARIEDADE TOTAL NA UE15            
Em por cento da população activa  

44,0%

48,1%

49,5%

50,2%

50,5%

Em número ( 4+5) Em milhões

72,6

79,4

82,2

83,9

84,9

Fonte: LÉmplo en Europe 1999 - Comission Européenne


Evolução da precariedade em Portugal

RUBRICAS

2º TRIMESTRE

3ºTRIMESTRE

Aumento

 

DE 1992

DE 1999

92 a 99

POPULAÇÃO ACTIVA - em milhares

4622,6

5052,6

9,3%

CONTRATOS PERMANENTES - em milhares

2831,2

2819,4

-0,4%

CONTRATOS PRECARIOS      
Contratos a prazo- em milhares

394,1

483,3

22,6%

Contratos atípicos – em milhares

77,1

205,5

166,5%

Subtotal I ( em milhares )

471,2

688,8

46,2%

INDEPENDENTES      

Subtotal II ( em milhares )

1040,1

1188,7

14,3%

TRABALHO TEMPO PARCIAL      
Até 15 horas - em milhares

109

149,4

37,1%

De 16 a 25 horas - em milhares

250,2

276,5

10,5%

De 26 a 35 horas – em milhares

560,7

616,4

9,9%

Subtotal III ( em milhares )

919,9

1042,3

13,3%

DESEMPREGO      
- Oficial ( Em milhares )

175,8

212,9

21,1%

- Desencorajados ( Milhares)

120

100

-16,7%

Subtotal IV ( em milhares)

295,8

312,9

5,8%

PRECARIEDADE TOTAL      
- Em milhares ( I+II+III+IV)

2727

3232,7

18,5%

- Em por cento da População activa

59,0%

64,0%

8,5%

FONTE: Estatísticas de Emprego – INE


«Avante!» Nº 1375 - 6.Abril.2000