Frustração em Miami
Último acto
no «caso» Elián



Os EUA endureceram esta semana a sua posição no caso de Elián González, pelo que o drama do menino sequestrado em Miami pode terminar nos próximos dias.


Para além de terem obrigado Lázaro González, o tio-avô da criança, a encontrar-se com os psiquiatras e psicólogos que já se encontraram em Washington com Juan Miguel González, o pai, as autoridades norte-americanas têm já pronta a carta que estabelece o dia, a hora e o local de entrega de Elián ao seu legítimo tutor.
De acordo com os mais diferentes meios de comunicação, o sentimento de derrota domina agora no seio da mafia cubana de Miami, como testemunham as palavras de Ileana Ros-Lehtinen, congressista republicana de origem cubana. «A tensão está a transformar-se na paz e tranquilidade de saber que se fez tudo o que era humanamente possível [para manter Elián nos EUA]», afirmou a congressista. Também o advogado de Lázaro González veio agora a público garantir que o seu cliente «sempre disse que cumprirá as leis dos EUA, ainda que lhe pareça moralmente repugnante entregar a criança a Castro».
Esta reviravolta no caso Elián não é estranha à presença de Juan Miguel González nos EUA, que não só convenceu as autoridades do seu genuíno desejo de recuperar o filho, como sobretudo deixou claro desde a primeira hora que não está interessado em permanecer nos EUA e pretende regressar a casa mal a criança lhe seja devolvida.
Acresce, por outro lado, que a comunidade cubana de Miami está hoje mais isolada do que nunca, e que a ferocidade da sua campanha contra Cuba - utilizando sem escrúpulos uma criança traumatizada por um naufrágio, pela perda da mãe e pelo afastamento do seu meio familiar, cultural e social - foi um tiro que lhe saiu pela culatra.


O feitiço contra o feiticeiro

De acordo com as sondagens, a esmagadora maioria dos americanos apoia a entrega de Elián ao pai, vendo na oposição da comunidade cubana de Miami ao repatriamento da criança o desprezo pelas leis do país.
Philip Brennet, um perito em questões cubanas na Universidade Americana em Washington, citado pela Lusa, descreveu o caso de Elián Gonzalez como «um marco que quebrou a espinha dorsal do lobby anti-Castro». «Penso que este ano não haverá um impacto imediato mas dentro de um ano é isso que vai acontecer, disse Brenner. Esta opinião é partilhada por Michael Rattner, do Centro para Estudos Cubanos na cidade de Nova Iorque, que afirma que «Pela primeira vez em 40 anos o governo federal americano disse à comunidade cubana: não, desta vez não levam o que querem».
Não menos sintomático é o facto de o senador republicano Cuck Hagel ter afirmado que o caso de Elián Gonzalez serviu para demonstrar que «temos uma política irrelevante e atrasada em relação a Cuba». «Todo o mundo faz comércio com Cuba e Fidel Castro excepto nós», disse Hagel, que recentemente propôs o fim do embargo à exportação de alimentos e medicamentos para Cuba. Por seu turno, o senador Patrick Lehay, democrata, considera que o caso de Elián «não teria acontecido se houvesse relações normais», enquanto o senador democrata John Kerry, membro do Comité das Relações Externas, defende que a revisão da política com Cuba «há muito que se deveria ter realizado», pois a actual política é «contraproducente, velha, congelada no tempo que não contribui para a nossa credibilidade ou para os nossos interesses». Kerry atribiu o «congelamento» da política americana para com Cuba ao peso político da comunidade cubano-americana da Florida e Nova Jersey.

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Questão de peso


O peso eleitoral dos exilados cubanos explica o facto de tanto George Bush como Al Gore, candidatos à presidência, terem tomado posição apoiando a permanência de Elián nos EUA. Não foi por acaso que José Cardenas, um dos directores da influente Fundação Nacional Cubano Americana, opositora feroz do regime cubano, veio a público dizer que a questão do menino balsero fez «reacender a paixão entre a comunidade cubano-americana que será expressa nas eleições».
O «humanismo» dos candidatos à Casa Branca mede-se, como os factos demonstram, por um punhado de votos.


«Avante!» Nº 1376 - 13.Abril.2000