Ideal vivo e actual
Cento e trinta anos
depois do seu nascimento, Lénine continua a ser um alvo
preferencial da ofensiva ideológica anticomunista. Este facto
é, por si só, digno de registo e de reflexão. Com efeito,
tendo o nome de Lénine ficado, muito justamente, ligado ao
início da primeira grande tentativa na História da Humanidade
de construção de uma sociedade socialista e tendo essa
tentativa sido derrotada cerca de sete décadas mais tarde -
aparentemente não se justificaria a actual ofensiva cerrada que
contra ele é desenvolvida. Se o seu projecto foi derrotado
porquê, então, esta cruzada anti leninista? Porquê a
necessidade do recurso à utilização de tão poderoso e
diversificado arsenal ideológico contra Lénine? tanto
mais que, como não se cansam de proclamar os ideólogos do
capitalismo no desempenho da sua função de coveiros, no caso
concreto tratar-se-ia de uma «derrota definitiva» dado que,
dizem-nos eles todos os dias, «o comunismo morreu». Mais: ao
«definitivo vencido» que seria o comunismo, contrapõem eles um
«vencedor definitivo», o capitalismo óbviamente...
A verdade é que, como os próprios sabem, as coisas não são
exactamente assim, nem pouco mais ou menos. Os «vencedores»
sabem que derrotaram, de facto, uma experiência, uma tentativa,
mas têm a noção clara de que não derrotaram o ideal que
suportou essa experiência. E sabem que esse ideal, de que
Lénine foi o mais destacado protagonista e ao qual conferiu, com
o seu pensamento, componentes fundamentais, continua vivo, activo
e pleno de actualidade.
Figura maior deste século e da história do
movimento operário, principal continuador da causa e da doutrina
de Marx e de Engels fundadores do comunismo científico
Lénine desempenhou um papel singular no desenvolvimento
criador da teoria marxista de acordo com as novas condições da
sua época, elevou-a a um grau superior, deu-lhe a expressão
prática até então inexistente (o mais importante traço do
leninismo será, certamente, a unidade indissolúvel da teoria e
da prática revolucionárias) assim justificando que a
teoria revolucionária da época do imperialismo e das
revoluções proletárias tenha passado a designar-se por
marxismo-leninismo.
Foi nesse processo inovador, criador e criativo de
desenvolvimento da doutrina marxista que nasceu o partido de novo
tipo, o partido comunista. Portador de um projecto
revolucionário de sociedade, assente em específicos fundamentos
de classe, ideológicos, orgânicos, internacionalistas, fazendo
da sua estreita ligação às massas trabalhadoras e populares
uma das suas fontes de força essenciais o partido
proletário elevou o movimento operário a um estádio superior e
teve em Lénine, à frente dos marxistas revolucionários, o seu
mais destacado inspirador e criador. «Dizemos Lénine, pensamos
partido dizemos partido, pensamos Lénine» - dizia o
poema de Mayakovsky.
A Revolução de Outubro
acontecimento cujas conquistas históricas marcam impressivamente
não só a história deste século mas toda a história da
humanidade encontra-se indissoluvelmente ligada ao
pensamento e à acção de Lénine. Tanto quanto a derrota dessa
experiência decorre, em grande medida, de uma posterior prática
de afastamento e afrontamento desse pensamento e dessa acção.
Lénine considerava que a participação das massas trabalhadoras
na construção do socialismo constituía a condição
indispensável para a vitória do socialismo. E acrescentava que
a natureza profundamente democrática do socialismo se
manifestava nessa realidade, no facto de serem os próprios
trabalhadores a construir a sua nova vida e o seu futuro novo. O
facto de, a partir de dado momento, estes ensinamentos básicos
fundamentais não só não terem sido levados em conta mas terem
sido grosseiramente violados, constitui uma das causas essenciais
da derrota ulterior dessa experiência.
É incontestável, no entanto, que as ideias de Lénine
permanecem vivas e continuam a influenciar e impulsionar a luta,
os anseios e as aspirações de milhões de pessoas em todo o
Planeta e que o seu exemplo de pensador criativo, não dogmático
e profundamente revolucionário permanece como fonte de
inspiração para todos os comunistas.
Da derrota dessa experiência histórica,
emerge com grande nitidez a verdadeira dimensão das dificuldades
e dos obstáculos que se colocam aos que não desistem de lutar
pela transformação da sociedade actual baseada na
exploração do homem pelo homem e, portanto, na opressão e na
injustiça numa sociedade nova, liberta de todas as formas
de opressão e exploração, assente na justiça social, na
igualdade, na fraternidade, na solidariedade. Provavelmente,
ninguém melhor do que Lénine teve a noção exacta dessas
dificuldades. É significativo que, logo após o triunfo da
revolução, ele tenha observado que com a Revolução de Outubro
se iniciara, à escala mundial, uma luta de classe sem tréguas
entre o recém nascido poder soviético e o imperialismo
dominante e que excluindo qualquer hipótese de uma
«co-habitação harmoniosa entre os dois sistemas frontalmente
antagónicos» - quanto ao resultado dessa luta ele próprio se
tenha interrogado: «Quem a vencerá?». E é conhecido o
igualmente significativo episódio de Lénine numa festa na
Praça Vermelha, no 73º dia da Revolução de Outubro, a
comemorar, dançando de alegria, o facto de ter sido ultrapassado
num dia o tempo de duração da Comuna de Paris.
A verdade é que, 130 anos depois do seu nascimento, 76 anos
após a sua morte (e passada uma década sobre a derrota do
socialismo), o pensamento e a obra de Lénine e a força
carregada de futuro do seu exemplo de revolucionário mantêm uma
importância e uma actualidade incontestáveis.