Clinton
Visita anunciada

Por Albano Nunes
Membro da Comissão Política



A visita do Presidente dos EUA a Portugal foi oficialmente anunciada: 30 de Maio a 1 de Junho. É legítimo admitir que a prevista Cimeira UE/EUA, em Lisboa, acabará por realizar-se também nesse período. Para 2 e 3 de Junho foi noticiada uma "Cimeira de Reformadores" a realizar em Berlim, a convite de Gerard Schröeder, em que Bill Clinton deverá também participar.


Um tal périplo, que envolve o nosso País e se adivinha particularmente absorvente para o primeiro-ministro de Portugal, não pode deixar de merecer a nossa maior atenção, vigilância e, na medida do possível, a nossa mobilização.
Como Presidente da superpotência imperialista que lidera o processo de imposição ao mundo de uma nova ordem totalitária, é importante que Clinton não se sinta no nosso país como em terra conquistada nem fique com a ilusão de que é bem-vindo em Portugal, o que poderia torná-lo ainda mais atrevido e arrogante. É necessário aproveitar a visita para apontar o dedo acusador a quem melhor personifica as políticas que estão a desmantelar conquistas sociais e direitos democráticos alcançados por décadas de duras lutas, para exigir o fim da corrida aos armamentos que o Pentágono e o complexo militar norte-americano estão a relançar, para que os EUA respeitem os princípios fundamentais do Direito Internacional e cesse a sua política agressiva nos Balcãs, no Médio Oriente, no Cáucaso, na Colômbia e em muitos outros pontos da América Latina e do Mundo.
Esta é uma boa oportunidade para lembrar as responsabilidades directas da Administração Clinton na morte quotidiana de crianças no Iraque em consequência do cínico bloqueio imposto a este país, nos sofrimentos do povo palestiniano e do povo libanês do Sul do Líbano pelo seu envolvimento na política sionista de Israel, na trágica guerra de Angola e de outras guerras e conflitos que, da Eritreia à Namíbia, percorrem o martirizado e exangue continente africano. Este é um bom momento para levantar ainda mais alto a voz pela libertação de Mumia Abu-Jamal, vítima de uma sentença de morte iníqua e racista, e para reclamar que pequeno Elian seja restituído sem demora ao seu pai e ao seu povo e termine o criminoso bloqueio da Ilha da Liberdade.


Modelo a rejeitar

Se os EUA insistem em arvorar o seu sistema em "modelo" de valor universal - que tentam impôr pela força do dólar e o poderio das suas multinacionais, pelo domínio sem controlo que exercem sobre os "media" e outros veículos do "pensamento único", pela tremenda superioridade militar - é importante fazer sentir a Clinton e à corte que o acompanhe que há em Portugal forças em crescimento que combatem uma tal pretensão. E que, opondo-se com firmeza à vergonhosa submissão ao imperialismo do governo do PS, defendem a soberania nacional e o direito de Portugal e dos portugueses de trilhar o seu próprio caminho de desenvolvimento, rejeitam a adopção guterrista do "modelo" económico norte-americano e opõem-se firmemente às tentativas para amarrar Portugal e as FF.AA. portuguesas ao carro de guerra dos EUA/NATO.
Abundam as razões para nos manifestarmos por ocasião da visita de Clinton a Portugal. Razões semelhantes às que levaram na Grécia às poderosas manifestações anti-imperialistas de trabalhadores e estudantes, de tal envergadura que obrigaram a adiar por dias a visita de Clinton. Ou às que conduziram a importantes protestos populares durante a sua recente visita à Índia, ao Paquistão e ao Bangladesh. Trata-se da defesa da soberania nacional, da paz e do desarmamento, da democracia e do progresso social, da solidariedade internacionalista.
Entretanto, a crítica ao adversário principal, norte-americano, não pode fazer esquecer as responsabilidades "europeias" da social-democracia. Como na guerra da Jugoslávia, impossível sem a base de apoio que os partidos socialistas e social-democratas lhe deram. Ou na recente Cimeira da União Europeia em Lisboa onde, com grande empenho de Guterres, o "exemplo americano" serviu para passar a uma nova fase do desmantelamento do "estado social" na Europa.
É aliás cada vez mais difícil a destrinça, tão intensa é a cooperação. A uma primeira reunião em Nova Iorque (que passou praticamente despercebida) seguiu-se a "Cimeira dos Progressistas" em Florença e agora a "Cimeira dos Reformadores" de Berlim, a convite do "camarada dos patrões". A corrida das cúpulas da social-democracia para a direita continua. Depois da rendição ao neo-liberalismo, deslumbramento e capitulação perante o "amigo americano" erigido em aliado, parceiro e agora em correlegionário "reformador". É inquietante. É necessário seguir com atenção os próximos capítulos, e as diferenciações pela esquerda que inevitavelmente terão lugar.


«Avante!» Nº 1377 - 20.Abril.2000