25 de Abril
Um projecto que se mantém vivo



Manifestações de rua, iniciativas desportivas e culturais, muita música e fogo de artifício. Por todo o país o 25 de Abril foi lembrado de diferentes formas. Vinte seis anos depois, o povo sai uma vez mais à rua, ligando memórias do passado às realidades e sentidos problemas do hoje.


«E então o chaimite não vem?». No início de um desfile que reuniu, em Lisboa, milhares de pessoas, cada um vai comentando o que de novo ou «tradicional» a manifestação sempre encerra. Ponte entre história e actualidade que será, sem dúvida a fonte da sua vitalidade, o porquê que em cada ano trás à Avenida da Liberdade em Lisboa, à Praça doa Aliados no Porto, e aos vários centros de cidades, vilas e povoações do país, gente que em muitos casos não teve qualquer vivência da sociedade obscurantista e repressiva a que o 25 de Abril pôs termo.
Hoje são outros os problemas, as contradições, as perspectivas. Como foi lembrado nas ruas. No Parlamento. E no polémico Apelo – de que a semana passada demos notícia nas páginas do «Avante!» - e que este ano visou, em particular, as políticas neo-liberais e a sua expressão no nosso país.
O destaque nos noticiários da televisão e, em muitos casos, nas primeiras páginas dos jornais, foi para a presença de polícia e GNR, pela primeira vez como manifestantes, no desfile e Lisboa e em concentração do Porto. Presença envolta em polémica e na ambiguidade de mais do que discutíveis protestos e de legítimas exigências de direitos de cidadania.


Novas e velhas
exigências


Mas as manifestações do 25 de Abril foram bem mais abrangentes que os destaques difundidos pelos media e muitas outras realidades, problemas e reivindicações marcaram presença nas nossas ruas.
Antes do mais, o movimento que nestes dias se tem vindo a afirmar, para que ninguém se cale face aos aumentos dos transportes públicos impostos pelo governo, e que necessariamente se irão repercutir num aumento generalizado do custo de vida. Uma exigência que anda de par da reivindicação de aumentos salariais que de alguma forma compensem o esperado salto na inflação. Para que não sejam uma vez mais os trabalhadores a pagar na íntegra a factura.
Outra presença forte – a dos imigrantes -, que vieram reivindicar documentos e habitação parta todos, protestar contra o «trabalho escravo», lembrar a sua activa participação na construção do país e exigir não serem tratados como descartáveis.
Autarquias e sindicatos, de par das mais diversas associações e organizações de caracter social, cultural e político, constituíram o grosso da manifestação, cruzando-se palavras de ordem e cartazes, quer a lembrar obra feita, quer necessidades e prioridades de trabalhadores e populações.
Pontuando aqui e ali a manifestação, a música e a dança, entre os bombos e os ranchos, passando pelo coro alentejano. E por todo o lado, sempre presentes, os cravos de Abril.


Contra o neo-liberalismo

Os riscos da globalização, o controlo da informação, «o domínio da economia pelo sector financeiro», foram denunciados pelo almirante Martins Guerreiro, que falou no palco dos Restauradores, em Lisboa, em nome da Associação 25 de Abril e da comissão organizadora das comemorações.
Retomando as críticas à ordem neo-liberal levantadas no Apelo à participação, Martins Guerreiro lembrou que esta realidade cria «um novo poder sem controlo democrático». «Esta não é a sociedade com que sonhámos no 25 de Abril», alertou.
Na perspectiva de que o 25 de Abril é «um projecto que se mantém vivo», o orador referiu os diversos problemas que actualmente se colocam à sociedade portuguesa, e sublinhou, como principais desafios para o futuro, a «batalha da educação e do acesso á informação».


«Avante!» Nº 1378 - 27.Abril.2000