Organizações de todo o mundo lançam apelo contra o liberalismo
OMC: submetê-la
ou suprimi-la



Várias dezenas de organizações lançaram um apelo internacional que deverá servir de referência às acções contra a Organização Mundial do Comércio previstas para o próximo 1.º de Maio.


O texto, que sublinha a necessidade de «substituir um sistema caduco, iníquo e opressor por um quadro de trocas duráveis e equitativas para o século XXI», saiu de uma reunião realizada nos dias 16 e 17 de Março, na cidade norte-americana de Boston, onde se reuniram organizações de todo o mundo, num momento em que as negociações recomeçam na Organização Mundial do Comércio.
Os promotores esperam que o apelo encontre o «mesmo eco» que o lançado na Primavera de 1999, ao qual aderiram mais de 1800 organizações de mais de 80 países e levaram ao fracasso da terceira reunião ministerial, realizada em Novembro de 1999 em Seattle.
Este revés histórico foi possível graças a uma mobilização sem precedentes de movimentos de cidadãos e de governos do mundo inteiro, refere-se no apelo, que considera «vital aproveitar o actual momento para mudar de rumo nas relações comerciais».


Regras opacas

«A função da OMC e dos acordos de Marrakech consiste essencialmente em forçar a abertura dos mercados em benefício das transnacionais, em detrimento das economias locais, dos trabalhadores, dos camponeses, das mulheres, dos povos e das minorias, em detrimento da saúde e da segurança das pessoas, dos ecossistemas e das espécies vivas.»
Por outro lado, os princípios e regras da OMC são «opacos, antidemocráticos e contribuem para abandonar ao seu destino a maioria das populações do mundo».
A instabilidade generalizada, o afundamento das economias locais, o aumento das desigualdades entre e no seio dos países, a aceleração da degradação social e ecológica são agravados pelas fusões e concentrações de empresas que dominam a economia mundial.
Os governos que dominam a OMC, em particular a União Europeia, os Estados Unidos, o Japão e o Canadá, bem como os grupos transnacionais que beneficiam do sistema negam estes efeitos negativos e pretendem alargar as prerrogativas da OMC, promovendo o liberalismo com um fim em si.
As organizações subscritoras recusam esta política e proclamam a urgência de proteger a diversidade cultural, biológica, social e económica, aplicar progressivamente políticas que privilegiem o comércio e as trocas locais, garantir os direitos económicos, sociais e culturais universalmente reconhecidos; e restaurar a soberania dos povos e o controlo democrático aos níveis nacional e regional. Estes objectivos devem ser alcançados com base no controlo democrático dos recursos e no respeito dos ecossistemas.


Comércio mundial
ameaça os povos

As organizações subscritoras do apelo manifestam a sua oposição a um novo round das negociações que alargue a OMC aos domínios do investimento, políticas de concorrência, mercados públicos, às biotecnologias, a novas baixas tarifárias e ao comércio electrónico.
«É inaceitável que os direitos sociais e as necessidades vitais passem para o controlo da OMC», sublinha-se. No seu âmbito não devem entrar tão pouco os domínios essenciais como a alimentação, a água, os serviços públicos, a saúde. a segurança das pessoas e a preservação das espécies vivas.
Entre outras exigências, destacam-se ainda a revogação do acordo sobre propriedade intelectual, bem como o reconhecimento do direito dos povos a se alimentarem. Este último aspecto implica adopção de políticas que favorizem e protejam a segurança e a soberania alimentares, a agricultura familiar. É igualmente exigida a interdição de todas as subvenções às exportações e outras formas de dumping de produtos agrícolas, em particular com direcção aos países do terceiro mundo.
«O comércio mundial não deve ameaçar a existência dos povos, em particular dos pequenos agricultores e dos pescadores», lê-se no apelo, que repudia ainda a liberalização dos investimentos e exige a revogação do acordo sobre investimentos ligado ao comércio.


«Avante!» Nº 1378 - 27.Abril.2000