Direitos dos Militares
Uma questão de justiça

Por Rui Fernandes



Há de cerca de dez anos que o PCP vem pugnando pela alteração do quadro de restrições de direitos dos militares por um outro que consagre um mais alargado regime de direitos, entre eles o direito ao associativismo sócio-profissional.

Infelizmente, no plano legislativo, os militares portugueses estão, nesta matéria, como há dez anos. Hoje o paradoxo é evidente: existem várias associações militares, que são recebidas (excepto pelos Chefes militares) por vários órgãos de soberania e outros poderes públicos, têm actividade e, por outro lado, o quadro legal em vigor limita a sua participação e propicia a punição dos seus elementos.
O ministro do PS, António Vitorino, recebeu as associações. O ministro do PS, Veiga Simão, não recebeu as associações. O ministro do PS, Castro Caldas, recebe as associações.
O ministro Castro Caldas recebe as associações mas o Governo não assume a apresentação de um projecto lei visando a alteração do quadro legal existente. O Director Geral do Pessoal do MDN - General - recebe as associações, mas o General Chefe do Estado-Maior do Exército diz que «As associações não servem para nada» (Correio da Manhã de 18/4/00).
Pensamos que estes elementos de ordem prática falam mais do que mil palavras.
O MDN Castro Caldas recebe as associações, manifesta em público compreensão quanto à sua existência, mas diplomas importantes continuam a ser «cozinhados» e aprovados sem que as associações sejam chamadas a dar a sua contribuição.
O MDN Castro Caldas fala, mas é Jaime Gama que protagoniza, nas instâncias e cimeiras internacionais, a definição dos grandes desígnios para as Forças Armadas.
A modernização das FA’s é colocada no plano de mais ou menos dinheiro, para mais ou menos participação externa, para mais ou menos impulso à constituição da Força Militar Europeia.
De resto, o ministro-sombra do PSD, Carlos Encarnação, é isto mesmo que diz num artigo do JN do passado dia 8 de Abril. É preciso, diz a sombra, mais dinheiro para o «Exército Europeu» (sic). A sombra, não exclui, até, a criação de um imposto para essa finalidade.


Direitos por cumprir

Com sombras destas o PS pode estar descansado. E os portugueses, especialmente os que vivem do seu trabalho, têm todas as razões para ficarem preocupados. Imagina-se já o que poderá estar a ser zurzido com vista ao próximo Orçamento de Estado!...
Isto é, o problema dos direitos dos militares não é, para este poder político - mas também para o PSD e o PP, que se têm sistematicamente oposto a um modernizado quadro de direitos para os militares- parte integrante e fundamental da modernização. Aliás, todo o complexo problema, que, sinteticamente, dá pelo nome de Pessoal, continua a ser tratado num contraditório mar de indefinições e omissões, numa espiral de degradação com gravíssimas consequências para os militares, para as FA’s e para o País.
É neste sintético e emaranhado quadro que o PCP tem dito e redito que urge parar, definir uma política clara, de acordo com os interesses e possibilidades nacionais e em conformidade com os grandes desígnios constitucionais, dotada dos meios financeiros indispensáveis à sua concretização e que promova o envolvimento dos militares e das suas associações. Requer isto um elevado esforço de consensualização? Sem dúvida, mas esse é o caminho.
Para a concretização desta política, a questão dos direitos dos militares tem que ser parte constitutiva e importante, porque na verdade o alargamento desses direitos é um imperativo democrático e uma questão de justiça.
No momento em que se comemora o 26º aniversário da Revolução de Abril, é justo endereçar uma palavra de gratidão aos militares de Abril, mas é também justo exigir do Governo medidas urgentes, que dêem cumprimento à lei aprovada há um ano pela Assembleia da República, visando fazer justiça aos militares prejudicados nas suas carreiras. Mais uma vez os direitos continuam por cumprir.


«Avante!» Nº 1378 - 27.Abril.2000