Uma reserva para a luta

António Santos

A «onda gre­vista» tornou-se numa re­fe­rência in­con­tor­nável na pai­sagem po­lí­tica dos EUA. O nú­mero e a in­ten­si­dade das greves atin­giram, nos úl­timos anos, pín­caros que não eram es­ca­lados há dé­cadas. São os 50 mil ope­rá­rios da Ge­neral Mo­tors que, na sexta-feira, ter­mi­naram uma greve de 40 dias em 34 fá­bricas e sete es­tados; são os 26 mil pro­fes­sores de Chi­cago, que cum­prem hoje 11 dias de greve; são os 13 mil tra­ba­lha­dores da recém-pri­va­ti­zada em­presa de trans­porte de pas­sa­geiros Cinder Bed Road Me­trobus, em Washington DC, que, pela pri­meira vez em 40 anos, estão também em greve há já uma se­mana. E são os tra­ba­lha­dores dos ho­téis de luxo dos EUA e do Ca­nadá, pro­va­vel­mente o caso mais sur­pre­en­dente, que, em apenas dois anos, trans­for­maram um dos sec­tores menos sin­di­ca­li­zados num au­tên­tico ras­tilho de ideias re­vo­lu­ci­o­ná­rias.

«A minha fa­mília de New Bed­ford con­tava-me his­tó­rias sobre a greve de 1928, li­de­rada por ope­rá­rios por­tu­gueses», con­fi­den­ciou-me Wil­liam Lewis, re­cep­ci­o­nista do hotel She­raton Stam­ford, no Con­nec­ticut. «Há poucos anos, um sin­di­cato existir aqui no hotel era im­pen­sável. Hoje já dis­cu­timos essa tác­tica», ex­plicou-me o ac­ti­vista do sin­di­cato Unite Here.

De­pois da vi­tória da greve na ca­deia Mar­riott, na Ca­li­fórnia, há um ano, foram muitos os tra­ba­lha­dores de ou­tros ho­téis a exigir li­ber­dade sin­dical. «Co­meçou com o Hyatt Gre­enwich, de­pois, em 2017, foi o Hilton… Foi uma ba­talha árdua até o pa­trão nos re­co­nhecer ofi­ci­al­mente, o que acon­teceu em De­zembro, mas a res­posta foi dura: des­pe­diram 12 tra­ba­lha­dores de quatro de­par­ta­mentos. Dizem que estão a perder di­nheiro. Mas porque temos de ser nós a pagar a crise deles?», ques­ti­onou-se o jovem quadro sin­dical.

Esta se­mana houve uma ma­ni­fes­tação à porta do hotel. «Es­tamos em luta pela rein­te­gração dos co­legas que foram des­pe­didos, pelo au­mento dos sa­lá­rios e para exigir cui­dados de saúde que pos­samos pagar. Uma parte im­por­tante do nosso ren­di­mento é gasto em se­guros de saúde e, mesmo assim, quando vamos ao mé­dico ainda saímos de lá com fac­turas as­tro­nó­micas. Al­guns co­legas têm dí­vidas de mi­lhares de dó­lares em des­pesas mé­dicas», ex­plicou-me.

«Os nossos ple­ná­rios sin­di­cais são tra­du­zidos em si­mul­tâneo para es­pa­nhol, di­fe­rentes cri­oulos e in­glês. São ver­da­deiras es­colas. No ano pas­sado, a ideia de fazer uma greve no Dia In­ter­na­ci­onal da Mu­lher partiu de uma tra­ba­lha­dora das lim­pezas. E, pela pri­meira vez em muitos anos, a ci­dade as­sistiu a um 1.º de Maio a que se jun­taram tra­ba­lha­dores do [hi­per­mer­cado] Stop and Shop, dos ho­téis, dos bom­beiros, das co­mu­ni­ca­ções, car­pin­teiros, etc… Os tra­ba­lha­dores dos EUA estão a ga­nhar mais con­fi­ança para lutar porque, sendo mais fácil con­se­guir tra­balho, a ideia do de­sem­prego já não nos as­susta tanto», ex­plicou Lewis.

Da mesma ideia co­munga Shakti Ahuja, em­pre­gada do Hyatt Re­gency, em Van­couver, no Ca­nadá. De­pois de três se­manas em greve para exigir me­lhores sa­lá­rios, esta tra­ba­lha­dora das lim­pezas ex­plicou-me o que con­quistou: «Nunca tinha feito greve. Para mim, era só en­trar, fazer bem o meu tra­balho e voltar para a minha fa­mília. Foram eles que nos obri­garam a lutar. Aqui cada mu­lher faz o tra­balho de duas e quando nos ma­go­amos, o que está sempre a acon­tecer, não há baixas pagas, não há nada. E com aqueles sa­lá­rios e as rendas sempre a subir, já não dava para so­bre­viver. Com o novo con­trato, con­se­guimos um au­mento sa­la­rial de 25 por cento e mais se­gu­rança no tra­balho.

Ainda falta muita coisa, a co­meçar pela luta. No Ge­orgia [outro hotel da ci­dade], eles ainda não ce­deram. E eu con­tinuo a ir lá para os pi­quetes, para lhes dizer que estou do lado deles. Levo co­mida tra­di­ci­onal… uma ou duas vezes por se­mana. Vou can­sada, mas estou na luta».




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