Finanças locais
Distribuir mais e melhor
Baixaram à comissão,
para debate na especialidade, os três projectos de lei da
autoria do PCP, PSD e PP sobre o Financiamento das Autarquias
Locais. Em votação na generalidade, após debate em plenário,
fez ontem oito dias, os diplomas passaram com os votos
favoráveis dos partidos da oposição. O PS, que se
desmultiplicou em críticas aos projectos, chantageando a
despropósito com a ameaça de eleições antecipadas, acabou no
momento da votação por não meter tudo no mesmo saco e adoptar
condutas diferentes: absteve-se na iniciativa legislativa dos
comunistas, votando contra os diplomas subscritos pelos partidos
de direita.
Com esta posição, diversamente do que o próprio ministro João Cravinho anunciara nesse mesmo dia em conferência de imprensa, antes do debate - "nem o PSD, nem o PP, nem o PCP apresentaram qualquer projecto coerente e significativo sobre transferência de atribuições e competências", proclamou - , a verdade é que a bancada socialista acabou por reconhecer validade e mérito no articulado do projecto comunista, não escondendo que das três propostas em debate era a que, em sua opinião, "está melhor construída e com maior fidedignidade face à realidade do poder autárquico".
Recorde-se que o PS não apresentou qualquer projecto, porquanto, invocou, o Governo manifestou intenção de legislar sobre a matéria. A sua proposta foi divulgada nesse mesmo dia, estando o debate previsto no Parlamento para 9 de Julho próximo.
Desta forma, o PS ganha algum tempo, pelo menos até ao dia do agendamento da proposta do governo, podendo eventualmente desenvolver-se uma aproximação às propostas preconizadas pelo Grupo comunista, cujo diploma defende a recuperação dos montantes subtraídos às autarquias em anos anteriores, devido à base de incidência do Fundo de Equilíbrio Financeiro, contestada desde os tempos da governação do PSD.
Fortes críticas ao PSD - de quem partiu a iniciativa deste agendamento - marcaram entretanto o debate, após a intervenção do deputado Ferreira do Amaral, que defendeu o projecto de lei do seu partido visando o reforço da dotação financeira para as autarquias. Proveniente de todos os restantes quadrantes parlamentares, esta reacção permitiu recordar à bancada do PSD que coube aos governos de Cavaco Silva a responsabilidade pelos sucessivos incumprimentos da Lei das Finanças Locais.
Luís Sá, em nome da bancada comunista, assinalou mesmo que o PSD deveria ter optado por uma "declaração de arrependimento", alertando para o facto de a Lei das Finanças Locais ser "suficientemente importante para ser algo mais do que uma chicana política", pelo que, apelou, deveria ser objecto de "rigor e seriedade" no debate político.
O deputado do PCP não deixou, no entanto, de lembrar que as promessas eleitorais do PS não foram até agora cumpridas, levando-o, nesta medida, a responsabilizar socialistas e social-democratas pela actual situação.
A posição do Grupo comunista nesta matéria ficou de resto claramente expressa por Luís Sá quando considerou que a questão essencial passa pela aprovação de "uma lei justa, e, sobretudo, uma lei para cumprir". Por outras palavras - e este é o objectivo central do diploma do PCP - , trata-se de aprovar uma lei que "rompa decisivamente com a actual desproporção na partilha de recursos do Estado e que se traduza num reforço significativo e substancial dos meios financeiros postos à disposição do Poder Local".
Nesse sentido, para a formação comunista, o que importa é que a definição do regime financeiro assente, por um lado, num Fundo de Equilíbrio Financeiro "que mantenha e reforce o seu carácter redistributivo", garantindo, por outro lado, uma "participação mais alargada na partilha dos impostos nacionais".
A afectação aos municípios das verbas que reponham um nível de meios financeiros correspondente ao que teria resultado da aplicação da lei em vigor, devolvendo-lhes por conseguinte a capacidade financeira perdida pelos sucessivos incumprimentos da lei em vigor, constitui outra das propostas preconizadas no diploma do PCP, que defende, simultaneamente, a adopção de um "novo critério de variação do FEF" (introdução de nova componente na fórmula de cálculo e substituição da base de previsão pelas cobranças efectivamente cobradas), capaz de assegurar "maior equidade na participação das receitas públicas".
Advogado pelo Grupo Parlamentar do PCP, como sublinhou Luís Sá, é ainda a adopção de "critérios simplificados, mais claros e transparentes para a distribuição do FEF", bem como, noutro plano, "o reforço da capacidade financeira das freguesias", com vista à sua autonomia, não apenas pelo "aumento substancial dos recursos postos à sua disposição", como também por via da "autonomização plena dos mecanismos de transferência", que, segundo a proposta do PCP, passam a "ficar directamente dependentes do Orçamento do Estado".
Fundamental, na opinião de Luís Sá, é ainda a consagração de disposições que impeçam a transferência de novos encargos para as autarquias sem que seja reforçada a correspondente capacidade financeira.