Elisa
em suma
Maria Elisa Domingues, vulgo Maria Elisa,
Elisa em suma, é uma mulher de sucessos. "Directora de
Programas da RTP", a ela se deve a luminar programação do
canal público. Nas horas vagas, Elisa tem ainda tempo e talento
para escrever o seu "Diário" que o DN , guloso e
lambão, publica e destaca e no qual ela exibe uma prosa que nos
recorda aquelas crianças prendadas capazes de produzir
promissoras redacções e de recitar, de cor, para enlevo da
família, a saudosa "Balada da Neve". Ainda nos tempos
livres, Elisa tem vindo a erguer um programa televisivo ao qual,
com a modéstia que a caracteriza, deu o seu próprio nome e que,
segundo se diz, é pago na razão inversa da qualidade que tem.
Mas Elisa não é só isto: nos intervalos da sua directoria, ela
faz muitas outras coisas. Por exemplo: o notável introito ao
"Momentos/25 anos inesqueciveis/Os pontos altos da
televisão", que o Expresso deu à luz no sábado passado.
Elisa está na TV há 25 anos - 25 anos de êxitos pessoais que
são parte grande do ÊXITO que tem sido esta televisão que é
de nós todos. Dos "anos anteriores ao 25 de Abril" - a
que alguns exagerados chamam fascismo - Elisa prefere não falar.
Mesmo assim, não resiste à tentação de relembrar que
"nesse clima peculiar da Primavera caetanista",
"pude entrevistar (Vitorino Nemésio) com relativa
liberdade". Depois do 25 de Abril é que as coisas se
complicaram e pioraram. Por acção da "mão de ferro do PCP
nas redacções", obviamente. Mas Elisa, mulher de armas,
não permitiu que lhe roubassem a "relativa liberdade"
da Primavera marcelista: lutou, lutou, lutou e venceu!. Assim, em
1980 , Proença de Carvalho, essa eminente figura de democrata,
convidou-a para "directora de programas da RTP", dando
início a um período de ouro no qual, reconquistada a
"relativa liberdade", passaram a reinar connosco o
pluralismo, a independência, a isenção, a seriedade
informativa. Elisa conta-nos todas estas estórias estribada em
sólidas, incontestaveis e incontestadas opiniões que
positivamente nos esmagam. Armada de Aristóteles, Morin,
Platão, Popper, debica em cada um deles as opiniões que
sustentam a sua teoria comunicacional - e de citação em
citação enche Elisa o paparrão, salvo seja. Senhores!, o que
esta senhora sabe!, o que esta senhora leu!... Aliás, Elisa não
se livra, nem quer livrar-se, da fama de ser mulher inteligente,
culta e talentosa pelo que se lhe dispensa a necessidade de
apresentar provas de que assim é. Uma pessoa que num curto
introito como é o seu cita em abono próprio os autores acima
re-citados, revela de duas uma: ou vastas, profundas e
reflectidas leituras, ou a oportuna utilização de um livro de
citações oportunamente adquirido. Inclino-me para a segunda
hipótese dado que, sabendo-se viver Elisa uma vida de
frenéticas azáfamas e imperativas urgências, é bem possível
que tenha optado por seguir o sábio conselho do seu amigo
Platão: "Na urgência não se pode pensar". Seja como
for e viremo-nos para onde nos virarmos esbarraremos sempre,
inevitavel e inexoravelmente, na sólida inteligência, na
compacta cultura, no torrencial talento, no frondoso apego à
"relativa liberdade", dessa genial pequena figura que
dá pelo nome de Maria Elisa Domingues, vulgo Maria Elisa, Elisa
em suma. José Casanova