Recuperar o
8 de Março....
Por
Abril !
Por Odete Santos
O País novo que cantámos há 25 anos era feito de direitos subitamente conquistados.
Para as Mulheres Abril foi a igualdade.
Foi a promessa do fim das discriminações. Foi o salário igual para trabalho igual.
Foi a afirmação de que no Portugal de Abril caíam os redutos masculinos.
Nenhuma profissão seria jamais proibida às mulheres.
A maternidade deixaria de ser motivo de discriminação.
E é esse filho turbulento - o mês de Abril - que ainda embalamos, enquanto perguntamos:
Nestes 25 anos, por onde andaram as vozes das mulheres?
Nas últimas
décadas foi-se perdendo o sentido do Dia Internacional da
Mulher.
Se ninguém se atreve a dizer publicamente que o Dia da Mãe ou
do Pai não deviam existir, porque todos os dias do ano lhe
deveriam ser destinados, já o mesmo não se passa com o 8 de
Março.
Muitos homens, e até algumas mulheres aparecem a contestar o Dia
Internacional da Mulher.
Mas é um dia que é reconhecido pelas Nações Unidas.
Apesar de ser um dia tão pouco ao jeito das " modernidades
" de alguns movimentos de mulheres.
Porque o 8 de Março assinala - como o 1º de Maio para todos os
trabalhadores - as lutas pela redução do horário de trabalho,
contra o trabalho infantil, por melhores salários, das
operárias têxteis de Nova York.
O 8 de Março é a afirmação de que a discriminação da mulher
está estreitamente ligada à exploração das mulheres
trabalhadoras.
Porque segundo o poder económico nas mãos dos capitalistas., o
seu trabalho é menos produtivo do que o trabalho dos homens.
Porque têm os filhos para cuidar. Porque têm os idosos para
tratar.
Daí que a verdadeira raiz da discriminação das mulheres seja
uma discriminação de classe.
Retrocessos
Nos finais da
década de 70 assistimos, e não só em Portugal, a retrocessos
na luta das mulheres.
As vozes que clamavam pelo empowerment das mulheres- o Poder para
as mulheres- e que se reivindicavam de algumas correntes
feministas, esqueceram os reais problemas das mulheres para
passarem a exigir a metade dos poderes- a paridade com os homens.
São visíveis em vários países, os estragos causados pela
importação do feminismo Norte Americano.
As organizações de mulheres aparecem enfraquecidas nas lutas
pelos reais problemas das mulheres.
Sintomática é a fraca mobilização das organizações de
mulheres na luta pela despenalização do aborto, na Espanha como
aqui.
Significativo o facto de campearem as discriminações no acesso
ao emprego, por via da maternidade.
Por onde andaram as vozes das mulheres de Abril que não foram
suficientemente fortes para contrapor à paridade e às questões
de poder, a necessidade de construir a igualdade?
Discriminação
de género
ou discriminação de classe?
Partindo de uma
premissa errada, não falta quem considere a discriminação do
sexo feminino é uma mera discriminação de género. Por visar
todas as pessoas do mesmo sexo.
A premissa errada é esta, precisamente: a de que as mulheres
são todas discriminadas de igual maneira. Independentemente da
classe a que pertencem.
Quando era a própria lei a consagrar a desigualdade das mulheres
( como aconteceu no Fascismo) também a própria lei soube
distinguir na discriminação. Foi no fascismo que se concedeu o
direito de voto às mulheres licenciadas e às mulheres que
pagassem impostos de determinado montante.
Mas hoje, que temos a igualdade consagrada na lei, será que a
discriminação abrange, de igual forma, todo o sexo feminino?
Subsistindo discriminações na família e no trabalho, importa
perguntar as razões que levam às mesmas.
Na família, a discriminação existe a partir da sobrecarga da
mulher com o 2º turno. Isto é: com as tarefas caseiras, com as
tarefas de apoio à infância e à 3ª idade. É a mulher,
normalmente, quem providencia pela alimentação, vestuário e
alojamento, pelo bem- estar da família, acumulando tais
funções com o desempenho de uma actividade profissional.
O Estado neoliberal demitindo-se das funções sociais por que
deve responsabilizar-se perante todos os cidadãos, demitindo-se
de implementar uma rede de infraestruturas de apoio às
famílias, de apoio à infância, à juventude e aos idosos, é
ele, esse Estado, quem continua a perpetuar as condições para a
desigual partilha de tarefas no casal.
Na sua fúria privatizadora, os Estados neoliberais deste final
de século, exigem às mulheres que contribuam com o valor
económico do trabalho doméstico, para que a força de trabalho
necessária à criação dos lucros capitalistas se reproduza sem
encargos para estes e para o Estado.
Não admira, assim, que surjam, como acontece em Portugal,
propostas de lei como a do trabalho a tempo parcial, com a qual o
poder político acena às mulheres como uma forma de conciliar a
vida em família com as actividades profissionais.
Não admira também que, como em Portugal, surjam propostas no
sentido de as faltas dadas para assistência aos membros do
agregado familiar, embora justificadas, sejam descontadas nas
férias.
De uma ou de outra maneira, criam-se as condições para que o
trabalho das mulheres continue a ser mais mal remunerado do que o
dos homens.
Se os homens Portugueses ganham, em média mais 1.3 ou 1.4 do que
as mulheres, segundo mostram as estatísticas do INE, então
serão normalmente as mulheres a ser contratadas em part time,
porque a perda do salário será menor. Então a partilha de
tarefas nas famílias continuará a ser a mesma no que toca aos
encargos com a família, com as crianças, com os idosos. Porque
perder-se- à menos dinheiro no orçamento familiar se for a
mulher a faltar.
As discriminações na família são assim, ditadas, não por
questões biológicas que vocacionem o sexo feminino,
especialmente, para as tarefas caseiras, mas pelas exigências
ditadas pelo poder económico ao poder político.
É ainda o poder económico quem desvaloriza o trabalho feminino,
considerando este trabalho menos produtivo dadas as tarefas
familiares que recaiem sobre a mulher. Porque as mulheres são
mães, têm a licença de parto, faltam para cumprir encargos
familiares.
Assim, se o traço comum que une todas as mulheres na
discriminação de que são vítimas, é a maternidade e a
desigual repartição de tarefas na família, a verdade é que
esse elo, que só aparentemente torna a discriminação da mulher
uma discriminação de género, tem as suas raízes na
discriminação da mulher enquanto instrumento gerador do lucro
dos Capitalistas.
A discriminação da mulher é, assim, uma discriminação de
classe, mais ou menos alargada consoante o grau da exploração.
Haverá sempre, no sexo feminino, as menos discriminadas. As que
perpetuam o próprio sistema económico que discrimina a Mulher.
Essas não são irmãs das Mulheres de Abril, aquelas de quem
Maria Teresa Horta diz:
O Povo somos
Mulheres do meu País
A revindicação da Paridade nos órgãos de
Poder, ou de quotas como as que eram propostas pelo
Governo para a Assembleia da República e para o
Parlamento Europeu, sob a capa de uma aparente
modernidade, assentava numa ideia velha e revelha contra
a qual todas nós lutámos. A ideia de que as mulheres
apenas por questões biológicas, pelo facto de terem
nascido mulheres, tinham direito a um tratamento
especial. Pelo direito à igualdade! Por Abril! Quando conhecemos as queixas de
organizações de mulheres de países como a Finlândia,
apercebemo-nos de que a paridade é um engodo. Um faz que
anda mas não anda. |