JUGOSLÁVIA
A linha
essencial
A actual guerra contra a Jugoslávia não começou em 24 de Março último, mas há 10 anos e mesmo mais, com uma série de planos e acções, hoje conhecidos, visando o desmembramento da República Federativa da Jugoslávia, a sua recolonização pelas grandes potências, especialmente a Alemanha e os EUA. Já Reagan tinha um plano prospectivo para se "recuperar" todo o Leste europeu. Desde então, a Alemanha e os EUA desempenharam um papel determinante no atiçar forças nacionalistas na região, e particularmente no interior da Jugoslávia, e aí especialmente nas suas repúblicas mais ricas - Eslovénia e Croácia - exactamente as que vieram a despoletar com a sua secessão o processo de desmembramento da Jugoslávia, que agora se pretende finalizar. Dividir para reinar sempre foi regra primeira de todo o poder imperialista.
Também por via económica, com o FMI à cabeça, se preparava há muito o enfraquecimento da Federação, debilitando a Jugoslávia inteira. Aproveitando-se da enorme dívida externa facilitada à Jugoslávia, já ainda com Tito e depois, o FMI impôs destruidores "pacotes" de "restruturação", com graves consequências sociais e, daí, políticas. O Prof. Chussodovski, da Universidade de Ontário, tem um esclarecedor e fundamentado estudo sobre essa acção dissolvente do FMI e da banca credora sobre a economia, a situação social e a estrutura estatal jugoslava, reavivando o nacionalismo egoista dos mais ricos, que preparou as bases para fraccionar a antiga Jugoslávia, e que ainda hoje mantém sob férrea tutela económico-financeira os Estados "independentes" dela sessionados.
Após a criminosa guerra no vespeiro da Bósnia, activada também de fora para dentro, estabeleceu-se aí, com a chamada "paz" de Dayton, um "protectorado" assente na omnipresença de 30.000 soldados NATO e no discricionário comando do "vice-rei" Westendorp, que não se coíbe das mais ilegais e provocatórias "ordens". Na Bósnia foram exacerbados ao extremo os radicais ultranacionalistas de todos os campos, e uma poderosa campanha de desinformação "demonizou" os sérvios, globalmente, silenciando ou branqueando as exacções dos fascistas croatas e dos fundamentalistas muçulmanos, e metendo no mesmo saco as diversas forças em presença em cada campo. Milhão e meio de refugiados e deslocados, maioritàriamente sérvios, continuam exilados, sobretudo na Sérvia, sem que se fale de "limpeza étnica", que foi o que se sancionou em Dayton.
Mas a restante Federação Jugoslava, onde naturalmente avulta a Sérvia, mantinha-se recalcitrante em submeter-se ao domínio da NATO. Fez-se então explodir a "bomba" do Kosovo, até então de reserva, alimentando do exterior o separatismo, o boicote às negociações pacíficas e o terrorismo do UÇK. Nessa escalada programada de há muito, Rambouillet foi a derradeira etapa. Não se tratava de qualquer negociação séria sobre um acordo político. Aliás foi a delegação jugoslava a única que aceitou os 10 princípios imperativos do Grupo de Contacto. Mas sim do alibi para impôr à Jugoslávia um ultimato de rendição sem condições sob a ameaça das bombas; e para alçar ao plano da idoneidade e respeitabilidade de "outra parte" as várias facções da UÇK, sob a batuta de Albright. UÇK que era reconhecidamente um grupo terrorista ligado ao narcotráfico da heroína, além doutros tráficos, mas que entretanto estava e está sendo à pressa reforçado, treinado e "reciclado" pela CIA, os serviços secretos das potências ocidentais, e os braços clandestinos do Pentágono - com, inclusivé, a capa das "organizações humanitárias", Cruz Vermelha incluída. Rambouillet foi o derradeiro pretexto para levar a cabo os planos de agressão à Jugoslávia há muito confessadamente elaborados. E aí temos a pavorosa guerra a flagelar todos os povos da Jugoslávia (onde existem 26 nacionalidades!), e os albaneses do Kosovo como primeira e maior vítima. Para, como disse Solana após a Conferência de Washington, "passarmos enfim da prática à teoria" - e os povos de todo o mundo à mercê do arbítrio belicista da "nova" NATO, ao serviço dos interesses da Nova Ordem imperialista.
É isto o essencial, a grande e
decisiva linha mestra do que, na complexa região balcânica,
está suceder no Kosovo, na Sérvia, na Jugoslávia. Os sérvios
estão resistindo à brutal guerra real da NATO. Nós temos que
resistir à brutal guerra mediática com que nos massacram, ao
terrorismo ideológico. Não devemos dobrar a cerviz a certos
auto-proclamados "professores de moralidade", com
balanças onde os pesos e pratos da justiça e da verdade estão
completamente viciados. Não demos, não damos, nem temos que dar
"aval" a quem quer que seja. Temos a nossa própria
cabeça, conhecimentos, consciência. Falamos por ela e ela só.
Não somos "His Masters Voice" de ninguém.
Carlos Aboim Inglez