Os partidos não são todos iguais
A diferença do PCP


Nos últimos dias sucedem-se «notícias» e comentários na comunicação social que, à boleia da denúncia de irregularidades várias, procuram meter no mesmo saco todos os partidos. Significativamente, e não por acaso, à boca das eleições. Assim procurando diligentemente o duplo objectivo de promover o afastamento e a desconfiança dos cidadãos em relação à participação política (coisa para uma «classe política» sob suspeita) e de espalhar a crença que não existem afinal alternativas fora deste pantanoso «bloco central de interesses» que, num vai-vem PS/PSD, tem desgovernado o País. Os partidos, todos, seriam assim uns perversos delinquentes, em contraste chocante com os cidadãos e as empresas (e, já agora, jornalistas e comunicação social), tudo gente de bem e cumpridora das leis.
Merece referência, pelo seu carácter exemplarmente negativo, um editorial assinado pelo Director do «Diário Económico» que, parecendo colocar à partida uma pertinente questão («Alguém acredita, por exemplo, que o Partido Comunista Português tenha conseguido sozinho obter mais receitas do que o PSD e o PS juntos?»), logo conclui, desafiando todas as regras da lógica matemática, formal ou do comum bom senso: «Como não admitimos a hipótese de que os dirigentes partidários ousam mentir ao Tribunal Constitucional deste país, então é caso para desconfiar do PCP. Onde irão os comunistas buscar tanto dinheiro? Será à família Champalimaud? Serão os irmãos José Manuel e Jorge Mello os seus principais financiadores?».
E embalado logo prossegue metendo todos no mesmo cesto - «os partidos cometem fraudes contabilísticas consecutivamente»- e proclamando de ciência certa - «se fossem empresas, já há muito teriam falido»- o que terá certamente causado um sorriso nos que sabem e praticam com proveito o conhecido desporto nacional da fuga ao IRC e da sistemática declaração de prejuízos, sem falirem e continuando a exibir saudáveis sinais exteriores de desafogo económico. E que são a maioria das empresas. Que não têm aliás de suportar, como os partidos, uma obrigatória e exaustiva auditoria anual às suas contas!
Este espantoso raciocínio, de quem não suporta a diferença honrosa que o PCP representa no panorama do conjunto das grandes forças políticas portuguesas, faz lembrar a macabra anedota do cangalheiro que resolveu adequar o tamanho do cadáver à conclusão, perdão, ao caixão.
Dirigentes partidários pessoas de bem, pelos vistos, são os outros. Os que declaram todos os anos receitas e despesas ridículas e nunca têm apresentado contas nacionais (essa é uma das razões dos menores montantes que apresentam), sem por isso serem penalizados ou responsabilizados. Os que exibem nas campanhas eleitorais uma panóplia de recursos incomparavelmente desproporcionada com os meios usados pelo PCP. Os que sistematicamente recusam em sede parlamentar, apesar da demagogia para consumo público, discutir e votar nas sucessivas leis de financiamento dos partidos, o que sempre tem sido defendido e proposto pelo PCP - a proibição do financiamento dos partidos pelas empresas para contrariar a promiscuidade entre interesses económicos e actividade partidária. Os que aceitam e vão buscar o apoio aos grandes grupos económicos, como é público e notório.
Descanse o Director do «Diário Económico» e outros com as mesmas angustiadas preocupações. Não são os grandes grupos económicos que alimentam o PCP.
Como também é público e notório, o PCP vai buscar o essencial do sustento da sua actividade partidária a um quotidiano, ímpar e militante esforço de angariação de receitas próprias, na base de sucessivas campanhas de fundos (públicas e abertas, como a que está em curso), de iniciativas, de cotizações, de contribuições dos seus apoiantes e dos seus eleitos, que entregam o excedente das suas remunerações em cargos públicos, de acordo com o saudável e singular princípio que praticamos de não haver benefício pessoal no exercício desses cargos. Nas tão faladas contas de 97 as receitas próprias do PCP representaram cerca de 95 % e as normais subvenções do Estado aos partidos apenas 5%, proporção que aproximadamente se repetiu, aliás, nas nossas contas de 1998, como sempre publicamente divulgadas no «Avante!».
O que dá mais força também à reconhecida autonomia e independência do projecto transformador e de esquerda e da acção política do PCP e afirma, também nesta matéria, a singularidade e a diferença de que não abdicamos no quadro político-partidário português. Por muito que isso desagrade a alguns. Mas correspondendo seguramente ao que a maioria dos trabalhadores e dos portugueses esperam do PCP. — Henrique de Sousa


«Avante!» Nº 1342 - 19.Agosto.1999