A arte das escutas

Carlos Gonçalves

No século IV A.C., Sun Tzu em «A arte da guerra» - compilação notável da ciência militar dos Estados Guerreiros da China desse período – deixou escrito sobre os «agentes secretos»: «o que há de mais importante na guerra é o conhecimento dos generais inimigos, o conhecer-lhes a capacidade, ... assim, se poderá andar com os projectos para diante».

Hoje, quando a agressão criminosa do imperialismo, de brutal superioridade tecnológica, de omnipresente espionagem e intoxicação e de esmagamento militar, em exercício de «pavor», se abate contra o povo do Iraque que, apesar da ditadura de Sadam, combate e resiste, com pouco mais que a sua bravura e a solidariedade das forças da paz, estes textos são de grande acuidade.

No teatro de guerra e no quintal planetário da sua almejada «nova ordem», o império prossegue a luta contra os que fez seus inimigos. O instrumento mais imediato da agressão é a espionagem e a intercepção das comunicações.

Há dias os jornais noticiaram a detecção de escutas no edifício dos Conselhos de Ministros da UE em Bruxelas e que o «chefe da segurança» afirmou que, «do outro lado do fio», estariam os USA.

Apesar da «contenção» reverencial dos do costume, não houve surpresas. Ninguém esqueceu o Echelon, sistema planetário de escutas dos USA e das potências anglófonas e as provas do exercício da sua intercepção global das telecomunicações, incluindo dos aliados e dos seus cidadãos, nem a constatação em 2000 de que o próprio software das comunicações secretas da UE era controlodado pela NSA americana, ou a recusa em 2001 do Departamento de Estado e da CIA de receberem a Comissão de Inquérito do Parlamento Europeu.

Mas a arrogância imperial não foi enfrentada e houve apenas umas poucas medidas técnicas, como se vê, de zero eficácia.

Desde então aconteceu o 11 de Setembro, a paranoia securitária e a legalização de todas as escutas nos USA. Aconteceu o surto de federalismo dos sistemas de informações na UE e da sua cordenação com os USA. Aconteceu em Portugal o controlo pela ultra direita de áreas do Sistema de Informações e a deriva securitária com que PPortas e DBarroso criam «Células de crise» e «Task forces» de espionagem, enquanto os ideólogos da matéria teorizam o «controle das comunicações», o «corte de certas liberdades» e a «atenção» ao «inimigo interno».

Citando Sun Tzu, hoje a «presciência» consiste em «prever as manobras» do adversário e «evitar os seus logros» e a arte das escutas.



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