
- Nº 1554 (2003/09/11)
Café-concerto
Memória e transformação
Festa do Avante!
«A Festa é memória e transformação», afirmou Manuel Gusmão, num debate realizado no sábado no café-concerto de Lisboa, com o tema «cultura erudita, cultura popular e cultura de massas». Para o escritor e dirigente comunista, a Festa do Avante! comporta e combina como nenhum outro evento estes três tipos de cultura. O café-concerto, parte integrante da Festa, dá um bom contributo.
Com muita gente a assistir aos espectáculos e debates – quase sempre as cadeiras eram poucas –, o café-concerto de Lisboa oferecia uma programação variada e de qualidade. Do teatro às canções de Lopes Graça, do Jazz ao tango e ao forró, passando pelas gaitas de foles e danças da Ucrânia, tudo contribuiu para a riqueza cultural do espaço.
A música clássica marcou presença, com as exemplares interpretações de obras de Mussorgsky e Prokofiev e Bach, Beethoven e Bartók pelos jovens pianistas Domingos Gomes e António Maria Cartaxo. Quando os sons eram mais animados, o local ia perdendo as características de café e reforçando as de concerto, com a assistência a aproveitar todos os espaços disponíveis para dançar. Entre as actuações mais cativantes está a dos alemães Schalmeienkapelle, que tocaram canções célebres do movimento operário internacional. Para além de tocar A Internacional, a banda lembrou, através da música, o 11 de Setembro chileno, a guerra civil espanhola e a Revolução Socialista de Outubro de 1917, na Rússia. O público respondeu com punhos cerrados e vozes emocionadas.
Para além da música e das outras artes, foram também os debates que prenderam os visitantes que, de tão atentos, não se incomodavam com o som que vinha do palco 25 de Abril, ali tão perto. Os temas justificavam tal atenção. A cultura erudita, popular e de massas e «A censura hoje – o pensamento único». No primeiro debate – em que participaram António da Costa, Manuel Gusmão, Carmen Santos, Urbano Tavares Rodrigues e Carlos Alberto Consiglieri –, discutiu-se vários conceitos e tipos de cultura. «A cultura – considerou Manuel Gusmão – pode servir para perpetuar a situação actual mas também, ao mesmo tempo, para a transformar.»
No debate de domingo – no qual participaram os jornalistas César Príncipe, Paulo Rato, Orlando César e Mário Mesquita e também Filipe Diniz –, a discussão encaminhou-se para as novas, e velhas, formas de censura e de condicionamento do pensamento. A posse dos meios de comunicação social pelos grandes grupos económicos foi uma das «novidades» verificadas. Paulo Rato, do conselho de opinião da RDP/Antena2, chamou a atenção para as evidências, que considera uma das tácticas da ideologia dominante. Para Paulo Rato, a falta de capacidade de muitos profissionais da comunicação de questionar as evidências e ver para além do superficial é uma primeira – e perigosíssima – forma de censura.
O poeta Ary dos Santos foi evocado, através do lançamento de um CD e de dois espectáculos.