Comentário

Competitividade e produtividade

Pedro Carvalho
No passado dia 7 de Novembro, o PCP organizou um debate sobre «Produtividade e Competitividade da Economia Portuguesa», no âmbito do ciclo de debates «Em movimento por um Portugal com Futuro». Tema pertinente, pois as ditas «competitividade» e produtividade entraram no léxico da comunicação social, amplamente repetidas por políticos e comentadores da praça. É corrente ouvir que «somos pouco competitivos e pouco produtivos», pondo o ónus nos trabalhadores, afirmando-se que «temos a lei laboral mais rígida da UE», sem nunca o provar ou conseguir estabelecer uma relação com a produtividade ou a «competitividade», para mais quando no mercado trabalho português se usa e abusa da precariedade das relações laborais e falta a necessária fiscalização. Obviamente se a «rigidez» é a culpada, a panaceia apresenta-se pela flexibilização das leis laborais. Ao que temos de juntar uma política monetária e orçamental conducente com o objectivo da moderação salarial.

Con­di­ci­o­nantes

É em nome da «competitividade» e da produtividade que avança a ofensiva de classe do governo PSD/CDS-PP, em concubinato com o grande patronato nacional, tendo como eixo central o pacote laboral, que consubstancia uma forte regressão nos direitos dos trabalhadores. Ofensiva alicerçada nas orientações económicas e para o emprego da UE, que com o suporte da moeda única, condicionam o desenvolvimento económico do país e a medida da nossa «competitividade». O acentuar da política de direita que tem vindo a ser seguida é comum a todos os governos da UE, independentemente da sua cor política, assentando na chamada «estratégia de Lisboa», que representa o maior salto qualitativo, na ofensiva de classe ao nível europeu, desde o Tratado de Maastricht. Esta «estratégia» põe em marcha a agenda do grande patronato europeu, integrando a Estratégia Europeia de Emprego e Pacto de Estabilidade, reforçando a flexibilização dos mercados de trabalho e o ataque ao sector público. Instrumentos imbuídos de uma carga ideológica, tendo como objectivo central a garantia de ganhos de produtividade ao grande patronato, de forma a restabelecer as margens de lucro.
Esta «competitividade» do país, assente nos custos salariais, numa força de trabalho barata, com baixas qualificações e precária, transforma os trabalhadores em meras peças da lógica de exploração e da concorrência capitalista. É necessário uma reorientação estratégica da política económica e repensar o papel de Portugal na divisão do trabalho, particularmente na UE, para que o atraso do país não se torne crónico e nem a sua perificidade se torne um facto consumado, numa UE alargada. O actual modelo não só tem fortíssimas repercussões sociais como trava a modernização do tecido produtivo do país e é contraditório com o aumento da produtividade, quando este corresponde a uma especialização produtiva em sectores de baixo valor acrescentado, com produtividades tradicionalmente baixas. Por isso, quando falamos, em «baixa produtividade» temos de ter os devidos cuidados.

«Baixa» pro­du­ti­vi­dade?

Se em 2000, a produtividade em Portugal era cerca 62% da produtividade média comunitária, a mais baixa da UE, é preciso também dizer que Portugal tem os menores salários hora da UE, que representavam cerca de 36% da média comunitária. Temos de confrontar assim a produtividade dos trabalhadores portugueses face à baixa compensação salarial que auferem. Mas falar em «baixas produtividades» é falar também em «baixas qualificações», não só dos trabalhadores, mas da nossa classe empresarial, que tem qualificações mais baixas que os próprios trabalhadores. Entre 1995-2000, Portugal foi o único país da UE, com excepção da Dinamarca, a ter uma redução no emprego dos trabalhadores mais qualificados de cerca de 4%, quando mais de três quartos da sua força de trabalho têm qualificações ao nível do ensino primário e obrigatório - o valor mais elevado da UE - e continua a aumentar a procura de trabalhadores não qualificados.
É falar também da crescente precarização, onde mais de um milhão de trabalhadores portugueses se encontram com contratos a prazo e, desde 1997, que estes não param de aumentar, atingido 22% do total de emprego, um dos valores mais elevados da UE. É falar ainda da degradação das condições de trabalho, devida à intensificação do ritmo de trabalho e à precarização, como evidenciam inquéritos comunitários à força de trabalho, com o aumento do stress, das doenças profissionais e dos acidentes de trabalho, assim como das capacidades e insuficiências da gestão empresarial (e quantas vezes danosa), ou das opções do Estado, na educação, na saúde, nas infra-estruturas de apoio à produção e na própria investigação.
Do aumento da produtividade, no longo prazo, depende a elevação do bem estar material do país. Mas isto não basta, é necessário que a riqueza seja distribuída de forma equitativa e que se utilize em pleno o factor trabalho. As políticas públicas devem ter como prioritárias a produtividade, as disparidades de rendimento e o desemprego. Não se pode confundir produtividade com «competitividade». Este não é apenas um erro da política de direita, é a sua substância de classe. O que é preciso, em paralelo com a revalorização e modernização do nosso tecido produtivo, é revalorização do trabalho. Sem isso, a produtividade e o nosso desenvolvimento são assuntos adiados.


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