- Nº 1572 (2004/01/15)
O Riso

A comichão do poema

Argumentos

Assentado me estou
numa estrutura
de pura literatura.
Minha avó me aconselha:
escrever sem que torça a orelha
comer sem que estoire a barriga;
melhor é tentear do que fazer poemas de cernelha
pegados à moda antiga.
Melhor de facto avó do que sonetos
pegados com saliva
são estes tersos versos de formiga:

uma palavra preta
com cem patas
apoquenta o poeta
que a procura de gatas.

Pica-lhe o traseiro
entra-lhe nas unhas
faz-lhe o mal primeiro
do que a caramunha.

A palavra insecto
corre-lhe nas pernas
ameaça o recto
e as partes internas.

O poeta cata
fala mais barato
chamando-lhe ingrata
descalça um sapato
e ei-lo que mata
o poema-chato.

José Carlos Ary dos Santos