Direita aprova programa do XVI Governo

À medida dos interesses e das clientelas

A maioria PSD-CDS/PP, como esperado, aprovou o programa do Governo. O que nem ela nem Santana Lopes no debate de estreia deste como primeiro-ministro conseguiram evitar foi a demonstração de que as políticas e o rumo nele traçados não servem os trabalhadores nem o País, sendo, por isso, objecto da mais severa censura do PCP, que considerou ser este um governo feito à medida dos interesses e das clientelas.

Go­verno quer impor a lei da selva la­boral

Acolhendo apenas os votos favoráveis dos partidos da coligação de direita e os votos contra do PS, PCP, «Os Verdes» e BE, a aprovação do documento no dia de ontem culminou o debate iniciado na véspera no Parlamento.
A marcá-lo estiveram as críticas de todos os quadrantes da oposição que, convergindo na leitura de que o novo governo é politicamente uma continuação do anterior (responsável pela profunda recessão económica e pelo retrocesso social a que o País assiste), apresentaram moções de rejeição ao seu programa.
Sobre o Governo recaiu assim a acusação de ser o responsável pela grave situação em que o País se encontra, ou seja, pelo aumento do desemprego traduzido em mais de 450 mil desempregados, pelos baixos salários, pela grave crise económica e social, pelo atraso no desenvolvimento do País, pela contínua divergência em relação aos restantes países da União Europeia, pelo aumento das bolsas de pobreza e das desigualdades sociais.
Matérias estas que Santana Lopes evitou abordar, optando por um discurso em pose de estadista mas a que faltou substância, tantas foram as generalidades e banalidades. Pelo meio, como áreas fundamentais da sua governação, lá enumerou (em termos não menos vagos) aspectos como o incentivo ao crescimento económico, o rigor das finanças públicas, a busca de maior justiça social ou a aposta na qualificação dos portugueses.

Omis­sões graves

Absolutamente omissas na sua intervenção inicial foram, porém, as questões concretas que estão dramaticamente no centro da actualidade como seja, por exemplo, a política de combate aos incêndios no momento em que este flagelo assola de novo o País trazendo consigo um rasto de destruição e dor.
Como não deixa de ser sintomático que em relação a uma matéria tão importante como o ensino nada tenha dito sobre os professores e sobre a enorme trapalhada em que foram metidos com os concursos do Ministério da Educação, com todas as consequências e reflexos que essa situação vai ter na vida das escolas e na preparação do início do novo ano lectivo.
E em relação a outras questões concretas com incidência na vida dos portugueses, no debate inicial, apesar de muito instado a pronunciar-se, como sucedeu com as perguntas colocadas por Carlos Carvalhas, Secretário-Geral do PCP, o chefe do Governo, esquivando-se, conseguiu passar ao lado de problemas por aquele colocados como o do subsídio de doença e de desemprego, os passes sociais, a desregulamentação originada pelo Código do Trabalho, a privatização de importantes empresas como a GALP ou a Companhia das Lezírias, a destruição da pequena agricultura duriense em resultado da nova organização institucional do Douro, o falhanço da política de prevenção nos incêndios florestais e a ausência de quaisquer medidas efectivas no plano da descentralização.

Ao ser­viço do ca­pital

À ambiguidade das promessas e compromissos que caracterizaram o frenesim de Santana Lopes antes e depois da sua tomada de posse respondeu, entretanto, com algumas certezas, a bancada comunista no decurso do debate.
Pela voz do seu líder parlamentar Bernardino Soares, o PCP afirmou não ter dúvidas que o Governo – como, aliás, o seu próprio programa o comprova – «vai manter a obsessão cega pelos critérios do défice e pelo PEC, bem patente no facto de não haver nenhuma referência à necessidade da sua revisão».
Sobre o Governo recaiu também a acusação da bancada comunista de não ter «vontade política para realizar um referendo sobre o novo Tratado da União Europeia», já que é apresentado como mera possibilidade, do mesmo modo que, no entender de Bernardino Soares, «não há nenhum compromisso sério de baixar o IRS para os trabalhadores e as camadas mais desfavorecidas, nem sequer de compensar o aumento da carga fiscal que efectivamente ocorreu nos últimos anos».
O que há, sim, observou o presidente da formação comunista, «é um compromisso de favorecer os grandes grupos económicos isentando por exemplo as operações de concentração».
Afirmada pelo PCP foi também a convicção de que o Governo PSD-CDS/PP nesta sua nova versão pretende continuar o ataque aos direitos dos trabalhadores, subalternizar os seus direitos e na prática «“governamentalizar” o Compromisso Portugal, que tem no governo os seus representantes e acentuar a lei da selva laboral que permita lucros fáceis e rápidos».

Con­vo­cado para exame
dez anos de­pois da morte


Uma das questões mais insistentemente usada como peça de propaganda pelo Ministério da Saúde diz respeito às famosas listas de espera para cirurgias, exames e consultas de especialidade. Diz o ministro que o problema foi resolvido ou está em vias de o ser. É a nua e triste realidade, porém, a encarregar-se de o desmentir, documentada pelas mais variadas formas e vias, incluindo, a postal. Foi o que sucedeu com mais este recente caso divulgado anteontem por Bernardino Soares no Parlamento, em relação ao qual, verdadeiramente chocantes, casando na perfeição, a incompetência e o grotesco podem assumir um completo desrespeito pela dignidade e memória humana.
Em telegrama dirigido ao saudoso maestro e compositor Fernando Lopes Graça, falecido vai em Novembro próximo para dez anos, o Hospital de Santa Cruz informa-o em telegrama enviado em 14 de Junho de 2004, com carácter urgente, da marcação de um exame de «cateterismo cardíaco» a realizar quatro dias depois nos serviços daquela unidade hospitalar.
Assim vai, pois, a resolução das famosas listas de espera no consulado de Luís Filipe Pereira, o ministro da Saúde de um Governo que quer agora entregar aos privados as cirurgias, que promete aumentar a privatização de hospitais e centros de saúde mas que não tem no seu Programa uma palavra para a questão da falta de técnicos de saúde, um dos mais graves problemas do País.



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Interpelando o Governo

«Não o vou questionar sobre os discursos, nem sobre as suas primeiras escolhas, nem sobre o Governo que não encolheu mas aumentou, nem sobre as alterações de secretários de Estado há última hora, como caso de Teresa Caeiro, em que o senhor anulou aquele momento de glória do ministro Paulo Portas a afirmar em sound bit...