Por um lado, após as históricas derrotas sofridas em Moscovo, Estalinegrado e Kursk (milhões de vidas humanas destruídas) a máquina de guerra nazi já não possuía o poderio que demonstrara nos primeiros dois anos da guerra e o Exército Vermelho, assim, preparava-se para entrar em território alemão e chegar a Berlim. Por outro, os anglo-americanos tinham desembarcado na Normandia. Paris estava a dias da sus histórica libertação. Vendo que um terrível desastre se aproximava, oficiais da Wehrmacht, oriundos em boa parte da velha nobreza prussiana, prepararam a tomada do poder. Mas tornava-se essencial que a diabólica figura de Adolf Hitler fosse exterminada. Então, seria possível pactuar com os anglo-americanos. Para tal, os novos governantes em Berlim suspenderiam os ataques com as novas armas voadoras V1 contra Londres e outras cidades britânicas. Isto, como é sabido, na esperança de que todos se voltassem, depois, contra o inimigo comum, a URSS.
Um dia no infernoAssumida a eliminação do «Fuhrer», a 20 de Julho, Ludwig Beck ocuparia a chefia do Estado. Karl Friedrich Goerdeler seria chanceler. O conde Klaus von Stauffenberg (coronel da Wehrmacht que lutara no «Afrika Korps»), estava encarregado de colocar uma bomba junto ao lugar que Hitler ocuparia à mesa de uma conferência especial no Quartel General conhecido como «Covil do Lobo» (Wolfsschanze), em Rastenburg, Prússia oriental. Nessa conferência seria discutida a grave situação militar em que a Alemanha mergulhara. Presentes: Hitler, Heusinger, Korton, Brandt, Bodenschatz, Walzenegger, Schmundt, Borgmann, Buhle, Pultkammer, Berger, Achmann, Scherff, Voss, Gunsche, Below, Fegelein, Buchholz, Buchs, Sonnleithner, Warlimont, Jodl, Keitel, Stauffenberg. A colocação da bomba não foi feita com a necessária precisão. Quando se verificou a explosão, muitos dos participantes sofreram ferimentos. Mas Hitler, ligeiramente atingido por estilhaços, conseguiu sobreviver, como se sabe. «Valquíria» não estava ainda derrotada. As horas seguintes, porém, seriam dramáticas e fatais.
Entretanto, na convicção de que o «Fuhrer» perecera, Stauffenberg e Haeften afastaram-se do local e correram para um avião que os levaria a Berlim onde o golpe seria concretizado com outros conspiradores no Bendlerblock (edifício sede das forças militares internas). Mas o general Friedrich Olbricht não conseguira avançar com a operação «Valquíria» imediatamente após o atentado contra Hitler. Devido a problemas de comunicações, só quatro horas mais tarde foi possível dar ordens efectivas a unidades militares comprometidas no movimento. O ataque às estações de rádio, todavia, não se concretizou e seria possível, mais tarde, ouvir-se a voz do próprio Hitler a confirmar o atentado e a demonstrar que sobrevivera.
O general Fromm, que também estivera perto da conspiração, decidiu que, sendo de prever um grande desastre, seria melhor jogar pelo seguro e, por isso, assumiu o papel de defensor de Hitler chamando tropas comandadas pelo major Remer, um dos mais firmes apoiantes do «Fuhrer». Aos conjurados foi dada ordem de prisão e Beck seria intimado por Fromm a suicidar-se, mas ele só conseguiria desligar-se do mundo à terceira tentativa. Oficiais do Estado-Maior de Fromm entraram na sala onde Stauffenberg e outros se encontravam. Vozes de homens enlouquecidos gritavam: «Estão todos doidos! Houve um atentado, sim, Mas o "Fuhrer" está vivo!» Nessa noite, conduzidos à cerca do edifício militar, Olbricht, Stauffenberg, Albrecht Mertz von Quirnheim e Werner von Haeften foram autorizados por Fromm a escrever algo que lhes parecesse adequado naquelas infernais circunstâncias. Depois, foram executados.
Mais tarde, os marechais Kluge e Rommel suicidar-se-iam. O marechal von Witzleben, o general von Stulpnagel, o próprio Fromm e o almirante Canaris seriam, também, executados. E chegaria, depois, a vez de milhares de menos destacados apoiantes do golpe. A repressão a cargo da Gestapo e de tropas SS levou muita gente à barra do tribunal instituído por Hitler para julgar os que se lhe opuseram.
Comunicação da Rádio Moscovo
ao povo alemão
(25.08.1944)
«Aproxima-se a vitória das Nações Unidas. Parece justo pedir a todos os alemães que cessem esta luta inútil evitando o derramamento de mais sangue antes que a guerra entre no seu próprio país. Só existem duas soluções: ou vos revoltais contra o regime hitleriano ou continuareis a combater contra os aliados, o que significa a morte para vós.
«Juntai-vos aos trabalhadores estrangeiros para a realização de uma greve geral! Liquidai as forças SS através de uma insurreição súbita e audaciosa! Aplicai golpes enérgicos e decisivos para que cesse a caça ao homem em que a Gestapo se emprega, actualmente! Ponde fim à guerra evitando que o sangue continue a correr, em breve no vosso próprio solo!».
O fim, segundo Winston Churchill «Os exércitos invasores penetravam a Alemanha com imenso poder. A distância entre eles diminuía, diariamente. Nos primeiros dias de Abril, Eisenhower atravessara o Reno e lançava-se contra um inimigo que em certos lugares ainda resistia, furiosamente, mas já não tinha capacidade para vencer. Quanto à Polónia, nada podíamos fazer por ela. Os exércitos soviéticos, a 13 de Abril, também já estavam em Viena. Outros agrupamentos do Exército Vermelho achavam-se a 35 milhas de Berlim. O 9.º exército dos Estados Unidos avançara tão rapidamente que, a 12 de Abril, chegava à vista do Elba, perto de Magdeburgo. Quatro dias mais tarde, o ataque soviético a Berlim começava. A 25, a capital do Reich estava completamente cercada por Jukov.
«A 30 de Abril, Hitler almoçara, tranquilamente, nos subterrâneos da Chancelaria. Às três e meia da tarde ouviu-se um disparo. Membros do seu pessoal mais próximo entraram no quarto do “Fuhrer” e encontraram-no prostrado num sofá, o revolver caído a seu lado. Tinha-se suicidado com um tiro na garganta e Eva Braun, que desposara dias antes, estava também morta. Havia-se envenenado. Os dois corpos foram queimados na cerca da Chancelaria. Com o troar dos canhões soviéticos, tudo isto equivalia a uma cena talvez irreal. Era o fim do Terceiro Reich.»
Manoel de Lencastre