
- Nº 1656 (2005/08/25)
A tragédia tem responsáveis
Opinião
A situação em matéria de fogos florestais é uma tragédia nacional - e as palavras são curtas para traduzir o drama que se abate sobre o país.
Não se trata «apenas» da dimensão da catástrofe, quase 200 mil hectares ardidos este ano, que acumulam com os 130 mil de 2004, os 420 mil de 2003 e as muitas centenas de milhar de hectares que arderam em 10 anos. Nem se trata «tão só» das mortes e dos irreparáveis dramas humanos e sociais, dos recursos destruídos, ou dos danos de enorme gravidade nos ecossistemas.
Trata-se de tudo isto e de muita mistificação, toneladas de «informação» sensacionalista e fragmentada que, como um biombo, não deixa ver o mais essencial – a responsabilidade das políticas de direita de todos estes anos por esta tragédia – e que alimenta o desespero, o conformismo e a descrença no futuro colectivo, que vão medrando na «fatalidade», que todos os anos «assola o país», como se nada houvesse a fazer.
Trata-se dum Governo que se esconde atrás da solidariedade com a acção dos bombeiros e que propõe a discussão futura das «causas estruturais» dos incêndios, para fugir às responsabilidades, para fazer esquecer que, em Março, quando tomou posse, devia ter aberto a «época» da concretização das medidas estruturais, há muitos anos decididas e vertidas na Lei de Bases da política florestal e noutros instrumentos legislativos, devia ter iniciado a «época» dos programas de prevenção e vigilância, em vez de ficar à espera da «época dos incêndios florestais», limitando-se a mais um «número» de «reforço dos meios aéreos».
Um governo que não deu atenção às recentes e fundamentadas iniciativas do PCP sobre a matéria, e que, neste Verão de extrema seca e canícula, estava obrigado a demonstrar uma vontade política de excepção na mobilização e resposta nacional à calamidade, em vez da fanfarronice de Sócrates em Maio do «estamos preparados para todas as eventualidades» e da inépcia do «deixa andar» em ritmo de férias.
É tão evidente a responsabilidade das políticas da direita dos sucessivos governos nesta catástrofe que, sem vergonha, PSD e PS procuram, à vez, «despolitizar» a questão e «sacudir a água do capote». Mas continuam a «trabalhar», com uma mãozinha do BE, para a concentração da propriedade florestal nos grandes interesses.
Também nesta matéria, não somos «todos iguais». Pela nossa parte continuaremos a luta, a intervenção e a proposta, contra as políticas da direita e a sua resultante - a tragédia dos fogos florestais.
Carlos Gonçalves