<font color=0093dd size=-1><em>Avanteatro</em></font><br>Mostrar o que de melhor se faz em Portugal
Teatro, dança, música e cinema documental são algumas das expressões artísticas que passarão este ano pelo palco do Avanteatro. Para saber um pouco mais da sua programação, o Avante! conversou com Pedro Lago e Manuel Mendonça, dois dos responsáveis por este espaço.
«O Avanteatro é uma expressão daquilo que nós, comunistas, defendemos para a cultura portuguesa e para o nosso povo. É desta forma que nós gostaríamos que a cultura fosse tratada, com dignidade, como ela merece», afirmou Pedro Lago, do Executivo da Festa do Avante!. Com este espaço pretende-se mostrar «o que de melhor se faz em Portugal ao nível das artes de palco», destacou.
A qualidade é, aliás, o principal critério para a selecção dos espectáculos a levar à Festa. Manuel Mendonça, da organização do Avanteatro, afirma que há muitos projectos em Portugal de grande qualidade. E, realçou, o público da Festa «merece» ter acesso a estes projectos. É este o espírito dos comunistas.
«A nós, como Festa e como Partido que somos, compete-nos divulgar os actores, os directores e as companhias que trabalham fora das grandes urbes», destacou Manuel Mendonça, lembrando que, neste aspecto, «temos tido algumas dificuldades». Mas, lembrou, é menos por culpa própria do que pela situação que o teatro atravessa no País. Exceptuando algumas grandes companhias, as restantes vivem à base de subsídios pontuais. Isto leva a que os actores, depois de uma curta carreira com um espectáculo, tenham que entrar noutros projectos. «E isto é uma dificuldade terrível, não só para os actores como para quem, como nós, quer programar uma mostra de teatro.»
Devido à persistência da organização, este ano será possível descentralizar um pouco mais. Duas companhias do Norte do País, mais exactamente de Viana do Castelo e de Famalicão, participam no Avanteatro (ver programa).
Segundo os dois responsáveis, este espaço prova que é falsa a ideia do declínio do teatro. Para Pedro Lago, «é interessante ver que sempre que há condições criadas o público adere». Em sua opinião, «as pessoas estão ávidas de cultura, mas têm poucas condições – económicas e outras – para usufruir dela».
Manuel Mendonça lembra que desde há muito que se fala da morte a prazo do teatro. Foi assim quando apareceu o cinema, foi assim quando apareceu a televisão. Todos estes prognósticos falharam. Mas o que todas as estatísticas mostram é que o que mais se faz em Portugal é teatro, revelou. «Há que mostrá-lo.».
Técnica e política
As condições técnicas existentes no Avanteatro também condicionam a escolha das companhias e dos espectáculos. Para Manuel Mendonça, é preciso saber se, «ao colocar ali um espectáculo, ao invés de o estarmos a promover se não o estamos a matar, por carências técnicas ou devido ao ruído».
«Considero os actores que participam no Avanteatro uns heróis. Representar ali não é fácil», destacou o profissional de teatro. Prosseguindo, afirmou que, apesar das condições, «eles voltam», dando o exemplo de uma actriz com a craveira de Maria do Céu Guerra, presença já frequente na Festa do Avante!. «Nós, comunistas, temos uma característica: recebemos bem as pessoas e respeitamo-las, seja como artistas ou como operários. Daí eles voltarem sempre», realçou.
Quanto a alegados critérios políticos, Manuel Mendonça destacou que «no nosso Partido, a arte nunca foi alvo de “directivas” estéticas ou artísticas». O Partido sempre esteve aberto aos criadores e nunca lhes colocou a mais pequena barreira, lembrou. No Avanteatro, «seguimos essa filosofia de não cortar o pensamento». Já por diversas vezes, foram realizadas co-produções entre o Avanteatro e uma companhia ou autor, recordou, explicando o método utilizado: «Propomos o texto e o autor trabalha-o livremente. Nunca fomos assistir a um ensaio nem propomos alterações. Pode ser um risco, mas é assim que fazemos.». Os constrangimentos existem, mas são técnicos e financeiros.
Também Pedro Lago recusa a existência de um critério partidário de selecção dos projectos. A política está lá, mas ao nível dos valores. Resumindo, «não há um critério único, mas sim um conjunto de critérios que fazem a nossa programação», avançou o membro do Executivo da Festa do Avante!.
Um sonho que continua
Inicialmente dedicado apenas ao teatro, o Avanteatro tem vindo nos últimos anos a abarcar outras formas de expressão cultural, como a dança, a música e, mais recentemente, o cinema documental (ver programa). Para Manuel Mendonça, da organização do Avanteatro, o cinema documental «quase fecha o círculo». Em sua opinião, fica apenas a faltar uma coisa, que é um sonho que acalenta: Um espectáculo de ópera.
E falando em sonhos, não será o próprio Avanteatro um sonho tornado realidade? Sim, é, confessou Manuel Mendonça. Desde a primeira Festa do Avante!, em 1976, na FIL, que o teatro está presente. Nessa altura ainda sem espaço próprio, mas um pouco por toda a Festa ou nos intervalos dos espectáculos musicais. Quando isto acontecia, recordou, «aquilo estava cheio de pessoas e nós víamos o seu entusiasmo». Uma coisa leva à outra e iniciou-se uma longa caminhada que levaria ao primeiro Avanteatro, em 1986, curiosamente no ano da última Festa no Alto da Ajuda e antes do interregno forçado de um ano e de nova mudança de morada.
O primeiro Avanteatro «foi um êxito estrondoso»», lembrou Manuel Mendonça. E provocou primeiras páginas dos jornais da altura. «Estava na moda falar da “crise do teatro” e da “falta de público" e os jornais mostraram filas intermináveis de gente para assistir a espectáculos de teatro.» Esta primeira experiência mostrou que a «aposta estava mais do que ganha e que não há ruído envolvente nem falta de condições técnicas que pare uma coisa destas». Nas edições seguintes, o Avanteatro manteve-se «sempre com grande sucesso e com lotações esgotadas».
Para Pedro Lago, é necessário destacar o empenho de todos os que tornam possível a realização, ano após ano, de uma iniciativa como o Avanteatro: «Só com esta dedicação, com este dar tudo de si, é possível construir o que construímos. É impensável dizer que há ali trabalho que poderia ser feito se fosse pago, até porque há ali outra componente que não há dinheiro que pague: o amor ao Partido, à Festa, à cultura, ao teatro.»
A Barraca interpreta «Felizmente há Luar»
«O poder tem medo do teatro»
Felizmente há Luar, de Luís de Sttau Monteiro, é um espectáculo marcante do teatro português. Como outros, foi proibido pela censura fascista e o seu autor chegou inclusivamente a ser preso. A encenação de uma peça desta qualidade e significado por uma companhia como A Barraca é, para Pedro Lago, razão mais do que suficiente para incluí-la na programação do Avanteatro: «Não podíamos deixar este texto passar despercebido. Tínhamos que lhe dar visibilidade e permitir ao público da Festa assistir a este espectáculo», afirmou o membro da direcção da Festa.
A história passa-se durante a ditadura do inglês Beresford, «aliado» de Portugal contra a ocupação francesa. A peça tem dois actos. No primeiro, mostra-se o ambiente que precede a revolta dirigida por Gomes Freire de Andrade que, a triunfar, instauraria uma monarquia constitucional. O segundo retoma após a prisão do revoltoso, com que termina o primeiro acto. Aqui se revela o desânimo geral devido à prisão do general. O herói será sacrificado mas fica a esperança de que o seu exemplo frutifique.
Escrito em 1961, o texto remete para a situação no Portugal aprisionado pelo fascismo. Muitos são os que estabelecem a comparação entre Gomes Freire de Andrade e Humberto Delgado, candidato da oposição nas «eleições» presidenciais de 1958, que acabaria por ser assassinado pela PIDE. O paralelismo não escapou à repressão, que proibiu o texto e prendeu o autor.
Maria do Céu Guerra interpreta o papel de Matilde, esposa do general revoltoso, num espectáculo em que se procurou respeitar o espírito e o texto original. A encenação está a cargo de Hélder Costa.
O carácter marcadamente político e desafiador desta peça levou Manuel Mendonça a lembrar que o poder «tem medo do teatro». Em sua opinião, o teatro é perigoso «porque é directo, não há interferências». Daí terem sido, ao longo da história, muitos os actores e encenadores perseguidos pelo poder.
A Igreja chegou a considerar as pessoas do teatro como «pessoas do Demo», que eram enterradas fora dos locais santos, lembrou. E os vários governos tentavam sempre apanhar o seu lado encenadores e actores que se destacavam. Assim aconteceu com Gil Vicente, com Shakespeare, com Moliére. «Não há outra arte assim», rematou.
Um palco para tantas artes
O programa do Avanteatro é variado, assim como o os seus públicos. Os espectáculos de teatro serão, para além de Felizmente há luar, levado à cena pelo grupo A Barraca, Hacker, um espectáculo de exteriores protagonizado pelo grupo PIA, e O velho da Horta, uma peça de Gil Vicente a cargo do grupo nortenho AGIL. O grupo Peripécia Teatro traz à Festa a peça Ibérica, a louca história de uma península.
Os mais novos também terão o seu espaço no Avanteatro. As manhãs de sábado e domingo são-lhes reservadas. No primeiro dia, Angela Ribeiro e Isabel Silva protagonizam Hansel e Gretel, num espectáculo de marionetes de mesa. O teatro Extremo regressa à Festa com a peça Maçãs vermelhas.
A dança também marcará presença, com o espectáculo Ponto de Fuga, produzido pela bailarina e coreógrafa Rita Judas.
Pelo segundo ano consecutivo, o cinema documental ocupa um lugar especial na programação do Avanteatro. Lisboetas, de Sérgio Tréfaut, e Natureza Morta, de Susana Sousa Dias, dois dos mais destacados documentários produzidos em Portugal no último ano, passam este ano na Festa. O primeiro mostra-nos uma Lisboa povoada por gente oriunda dos mais variados países e continentes – de África ao Brasil, da Ásia ao Leste Europeu – que alteram definitivamente o carácter e vivência da cidade. Natureza Morta revela uma sucessão de imagens do Portugal fascista e colonialista: das paradas salazaristas às fotografias dos presos políticos. Sem qualquer legenda ou voz-off cabe ao espectador construir a «sua» versão da história de Portugal no negro período fascista.
Também a música será uma presença assídua no Avanteatro, fechando a programação nos três dias. O primeiro dia será dedicado ao Jazz, com o quarteto de Maria João Matos. Celeste Amorim interpreta, no sábado, canções de Vítor Jara, acompanhada ao piano e à guitarra. Carlos Paredes e José Afonso serão também compositores em destaque neste espectáculo. No domingo, o Coro da Universidade de Lisboa interpreta as 17 Brasileiras, de Fernando Lopes-Graça, constituindo um momento de homenagem do Avanteatro ao genial compositor nos cem anos do seu nascimento. A música tradicional portuguesa, com os Roncos do Diabo, termina a programação deste ano, «em festa e com a esperança que para o ano há mais e será melhor», crê Manuel Mendonça.
Em destaque ainda estará a homenagem a Artur Ramos, recentemente falecido. Artur Ramos, comunista, figura maior da cultura portuguesa, esteve ligado ao cinema, ao teatro e à televisão.
A qualidade é, aliás, o principal critério para a selecção dos espectáculos a levar à Festa. Manuel Mendonça, da organização do Avanteatro, afirma que há muitos projectos em Portugal de grande qualidade. E, realçou, o público da Festa «merece» ter acesso a estes projectos. É este o espírito dos comunistas.
«A nós, como Festa e como Partido que somos, compete-nos divulgar os actores, os directores e as companhias que trabalham fora das grandes urbes», destacou Manuel Mendonça, lembrando que, neste aspecto, «temos tido algumas dificuldades». Mas, lembrou, é menos por culpa própria do que pela situação que o teatro atravessa no País. Exceptuando algumas grandes companhias, as restantes vivem à base de subsídios pontuais. Isto leva a que os actores, depois de uma curta carreira com um espectáculo, tenham que entrar noutros projectos. «E isto é uma dificuldade terrível, não só para os actores como para quem, como nós, quer programar uma mostra de teatro.»
Devido à persistência da organização, este ano será possível descentralizar um pouco mais. Duas companhias do Norte do País, mais exactamente de Viana do Castelo e de Famalicão, participam no Avanteatro (ver programa).
Segundo os dois responsáveis, este espaço prova que é falsa a ideia do declínio do teatro. Para Pedro Lago, «é interessante ver que sempre que há condições criadas o público adere». Em sua opinião, «as pessoas estão ávidas de cultura, mas têm poucas condições – económicas e outras – para usufruir dela».
Manuel Mendonça lembra que desde há muito que se fala da morte a prazo do teatro. Foi assim quando apareceu o cinema, foi assim quando apareceu a televisão. Todos estes prognósticos falharam. Mas o que todas as estatísticas mostram é que o que mais se faz em Portugal é teatro, revelou. «Há que mostrá-lo.».
Técnica e política
As condições técnicas existentes no Avanteatro também condicionam a escolha das companhias e dos espectáculos. Para Manuel Mendonça, é preciso saber se, «ao colocar ali um espectáculo, ao invés de o estarmos a promover se não o estamos a matar, por carências técnicas ou devido ao ruído».
«Considero os actores que participam no Avanteatro uns heróis. Representar ali não é fácil», destacou o profissional de teatro. Prosseguindo, afirmou que, apesar das condições, «eles voltam», dando o exemplo de uma actriz com a craveira de Maria do Céu Guerra, presença já frequente na Festa do Avante!. «Nós, comunistas, temos uma característica: recebemos bem as pessoas e respeitamo-las, seja como artistas ou como operários. Daí eles voltarem sempre», realçou.
Quanto a alegados critérios políticos, Manuel Mendonça destacou que «no nosso Partido, a arte nunca foi alvo de “directivas” estéticas ou artísticas». O Partido sempre esteve aberto aos criadores e nunca lhes colocou a mais pequena barreira, lembrou. No Avanteatro, «seguimos essa filosofia de não cortar o pensamento». Já por diversas vezes, foram realizadas co-produções entre o Avanteatro e uma companhia ou autor, recordou, explicando o método utilizado: «Propomos o texto e o autor trabalha-o livremente. Nunca fomos assistir a um ensaio nem propomos alterações. Pode ser um risco, mas é assim que fazemos.». Os constrangimentos existem, mas são técnicos e financeiros.
Também Pedro Lago recusa a existência de um critério partidário de selecção dos projectos. A política está lá, mas ao nível dos valores. Resumindo, «não há um critério único, mas sim um conjunto de critérios que fazem a nossa programação», avançou o membro do Executivo da Festa do Avante!.
Um sonho que continua
Inicialmente dedicado apenas ao teatro, o Avanteatro tem vindo nos últimos anos a abarcar outras formas de expressão cultural, como a dança, a música e, mais recentemente, o cinema documental (ver programa). Para Manuel Mendonça, da organização do Avanteatro, o cinema documental «quase fecha o círculo». Em sua opinião, fica apenas a faltar uma coisa, que é um sonho que acalenta: Um espectáculo de ópera.
E falando em sonhos, não será o próprio Avanteatro um sonho tornado realidade? Sim, é, confessou Manuel Mendonça. Desde a primeira Festa do Avante!, em 1976, na FIL, que o teatro está presente. Nessa altura ainda sem espaço próprio, mas um pouco por toda a Festa ou nos intervalos dos espectáculos musicais. Quando isto acontecia, recordou, «aquilo estava cheio de pessoas e nós víamos o seu entusiasmo». Uma coisa leva à outra e iniciou-se uma longa caminhada que levaria ao primeiro Avanteatro, em 1986, curiosamente no ano da última Festa no Alto da Ajuda e antes do interregno forçado de um ano e de nova mudança de morada.
O primeiro Avanteatro «foi um êxito estrondoso»», lembrou Manuel Mendonça. E provocou primeiras páginas dos jornais da altura. «Estava na moda falar da “crise do teatro” e da “falta de público" e os jornais mostraram filas intermináveis de gente para assistir a espectáculos de teatro.» Esta primeira experiência mostrou que a «aposta estava mais do que ganha e que não há ruído envolvente nem falta de condições técnicas que pare uma coisa destas». Nas edições seguintes, o Avanteatro manteve-se «sempre com grande sucesso e com lotações esgotadas».
Para Pedro Lago, é necessário destacar o empenho de todos os que tornam possível a realização, ano após ano, de uma iniciativa como o Avanteatro: «Só com esta dedicação, com este dar tudo de si, é possível construir o que construímos. É impensável dizer que há ali trabalho que poderia ser feito se fosse pago, até porque há ali outra componente que não há dinheiro que pague: o amor ao Partido, à Festa, à cultura, ao teatro.»
A Barraca interpreta «Felizmente há Luar»
«O poder tem medo do teatro»
Felizmente há Luar, de Luís de Sttau Monteiro, é um espectáculo marcante do teatro português. Como outros, foi proibido pela censura fascista e o seu autor chegou inclusivamente a ser preso. A encenação de uma peça desta qualidade e significado por uma companhia como A Barraca é, para Pedro Lago, razão mais do que suficiente para incluí-la na programação do Avanteatro: «Não podíamos deixar este texto passar despercebido. Tínhamos que lhe dar visibilidade e permitir ao público da Festa assistir a este espectáculo», afirmou o membro da direcção da Festa.
A história passa-se durante a ditadura do inglês Beresford, «aliado» de Portugal contra a ocupação francesa. A peça tem dois actos. No primeiro, mostra-se o ambiente que precede a revolta dirigida por Gomes Freire de Andrade que, a triunfar, instauraria uma monarquia constitucional. O segundo retoma após a prisão do revoltoso, com que termina o primeiro acto. Aqui se revela o desânimo geral devido à prisão do general. O herói será sacrificado mas fica a esperança de que o seu exemplo frutifique.
Escrito em 1961, o texto remete para a situação no Portugal aprisionado pelo fascismo. Muitos são os que estabelecem a comparação entre Gomes Freire de Andrade e Humberto Delgado, candidato da oposição nas «eleições» presidenciais de 1958, que acabaria por ser assassinado pela PIDE. O paralelismo não escapou à repressão, que proibiu o texto e prendeu o autor.
Maria do Céu Guerra interpreta o papel de Matilde, esposa do general revoltoso, num espectáculo em que se procurou respeitar o espírito e o texto original. A encenação está a cargo de Hélder Costa.
O carácter marcadamente político e desafiador desta peça levou Manuel Mendonça a lembrar que o poder «tem medo do teatro». Em sua opinião, o teatro é perigoso «porque é directo, não há interferências». Daí terem sido, ao longo da história, muitos os actores e encenadores perseguidos pelo poder.
A Igreja chegou a considerar as pessoas do teatro como «pessoas do Demo», que eram enterradas fora dos locais santos, lembrou. E os vários governos tentavam sempre apanhar o seu lado encenadores e actores que se destacavam. Assim aconteceu com Gil Vicente, com Shakespeare, com Moliére. «Não há outra arte assim», rematou.
Um palco para tantas artes
O programa do Avanteatro é variado, assim como o os seus públicos. Os espectáculos de teatro serão, para além de Felizmente há luar, levado à cena pelo grupo A Barraca, Hacker, um espectáculo de exteriores protagonizado pelo grupo PIA, e O velho da Horta, uma peça de Gil Vicente a cargo do grupo nortenho AGIL. O grupo Peripécia Teatro traz à Festa a peça Ibérica, a louca história de uma península.
Os mais novos também terão o seu espaço no Avanteatro. As manhãs de sábado e domingo são-lhes reservadas. No primeiro dia, Angela Ribeiro e Isabel Silva protagonizam Hansel e Gretel, num espectáculo de marionetes de mesa. O teatro Extremo regressa à Festa com a peça Maçãs vermelhas.
A dança também marcará presença, com o espectáculo Ponto de Fuga, produzido pela bailarina e coreógrafa Rita Judas.
Pelo segundo ano consecutivo, o cinema documental ocupa um lugar especial na programação do Avanteatro. Lisboetas, de Sérgio Tréfaut, e Natureza Morta, de Susana Sousa Dias, dois dos mais destacados documentários produzidos em Portugal no último ano, passam este ano na Festa. O primeiro mostra-nos uma Lisboa povoada por gente oriunda dos mais variados países e continentes – de África ao Brasil, da Ásia ao Leste Europeu – que alteram definitivamente o carácter e vivência da cidade. Natureza Morta revela uma sucessão de imagens do Portugal fascista e colonialista: das paradas salazaristas às fotografias dos presos políticos. Sem qualquer legenda ou voz-off cabe ao espectador construir a «sua» versão da história de Portugal no negro período fascista.
Também a música será uma presença assídua no Avanteatro, fechando a programação nos três dias. O primeiro dia será dedicado ao Jazz, com o quarteto de Maria João Matos. Celeste Amorim interpreta, no sábado, canções de Vítor Jara, acompanhada ao piano e à guitarra. Carlos Paredes e José Afonso serão também compositores em destaque neste espectáculo. No domingo, o Coro da Universidade de Lisboa interpreta as 17 Brasileiras, de Fernando Lopes-Graça, constituindo um momento de homenagem do Avanteatro ao genial compositor nos cem anos do seu nascimento. A música tradicional portuguesa, com os Roncos do Diabo, termina a programação deste ano, «em festa e com a esperança que para o ano há mais e será melhor», crê Manuel Mendonça.
Em destaque ainda estará a homenagem a Artur Ramos, recentemente falecido. Artur Ramos, comunista, figura maior da cultura portuguesa, esteve ligado ao cinema, ao teatro e à televisão.