Encontro Nacional do PCP
sobre Administração Pública

Defender o Estado democrático

O PCP exige o cumprimento da Constituição da República, bem como outro estatuto e papel do Estado, ao serviço dos trabalhadores, do povo e do País. Estas foram algumas das questões apontadas pelo Encontro Nacional que realizou em Lisboa, no sábado, dia 28.

O que o País precisa é de «mais e melhor Estado»

O encontro, que tinha como lema «Por uma Administração Pública ao Serviço das Populações e do País», estabeleceu como objectivos a reflexão aprofundada sobre o estado da democracia conquistada em Abril de 1974, nas suas componentes política, económica, social e cultural, e a definição de linhas de acção contra a ofensiva em curso contra o Estado democrático. Foi precisamente o que fizeram, durante todo o dia de trabalhos, os participantes no encontro. Vindos de todo o País e das mais variadas áreas – já que limitar o encontro a trabalhadores da Administração Pública seria reduzi-lo –, os participantes deram exemplos concretos da ofensiva do Governo e apontaram soluções para a defesa do Estado de Abril.
A abrir, João Dias Coelho, da Comissão Política, acusou os partidos que têm governado o País nos últimos trinta anos – PS, PSD e PP – de estarem a destruir o modelo de Estado constitucional que saiu da Revolução de Abril. A Constituição da República Portuguesa, prosseguiu, «ao definir uma Administração do Estado com determinadas funções e papel, faz uma opção clara a favor de um Estado prestador de serviços e de funções sociais». Um Estado que, desta forma, asseguraria a «prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos e pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé».
Ou seja, exactamente o oposto daquilo que tem sido praticado pelos sucessivos governos, denunciou o membro da Comissão Política. Para o dirigente do PCP, há uma clara contradição entre aquilo que a Constituição da República Portuguesa continua a consagrar, apesar das quatro revisões a que já foi sujeita, e a acção do poder político dos governos dos últimos trinta anos. Estes, acusou João Dias Coelho, «representando os interesses dos mais poderosos», violam-na «todos os dias».
Para o dirigente comunista, a situação a que o País e a democracia chegaram resulta precisamente desta afronta «sistemática e permanente» à Constituição por parte dos governos e das maiorias de os têm apoiado. Estes, em sua opinião, têm vindo a «reduzir as suas funções sociais e a acentuar as suas características autoritárias e repressivas com medidas securitárias e de controlo dos cidadãos, com uma política fiscal implacável para os trabalhadores e gigantescos benefícios para os grandes interesses privados».

Natureza do Estado define-se pelas classes que serve

«A natureza do Estado não se determina pela estrutura administrativa, por ser mais ou menos burocrático, por ter mais ou menos trabalhadores», afirmou Dias Coelho. Determina-se, isso sim, «pelas classes que defende e serve».
Esta questão tem-se tornado «cada vez mais evidente», realçou, num momento em que se verifica que ao mesmo tempo que se foi acelerando a concentração e centralização de capitais se foi empobrecendo a democracia em todas as suas vertentes. E, com ela, foi-se igualmente «degradando a qualidade da prestação, por parte do Estado, das suas funções e serviços públicos e aumentando os custos a pagar pelas populações».
Afirmando que o processo de fusão de interesses entre o poder político e o poder económico se encontra numa «fase bastante avançada», o dirigente do PCP alertou para a ameaça contra o regime democrático, que considera estar a subir de tom. Para João Dias Coelho, procura-se «reconfigurar o Estado ao actual estádio de desenvolvimento do capitalismo no nosso País, fragilizando o Estado para facilitar ainda mais a acumulação capitalista». Esta ofensiva, afirmou, está em curso «desde há longos anos». Mas o dirigente do PCP não esquece que com o Governo do PS/ Sócrates esta está a ser potenciada e agudizada. Para João Dias Coelho, a conquista pela direita do órgão Presidência da República facilita o desenvolvimento da política de direita no quadro da chamada «convergência estratégica».
Lembrando que o PCP tem propostas e soluções para os problemas do País, o membro da Comissão Política reafirmou que os comunistas não deixarão de «apontar o dedo àqueles que exigindo “menos Estado” querem ter mais Estado ao seu serviço». O que o País precisa é de «mais Estado e melhor Estado», concluiu.

Jerónimo de Sousa
«É possível outra política»


«O que temos assistido, pela mão do Governo do PS/ Sócrates, é a concretização de uma política que visa reconfigurar a estrutura e o papel do Estado e com ele o modelo de Administração Pública, moldando-a aos interesses do grande capital monopolista», acusou, no encerramento do encontro nacional do PCP, o secretário-geral comunista.
Para Jerónimo de Sousa, o que quer o grande capital «e o que os partidos do Bloco Central promovem com a sua política não é o aumento da eficiência e da qualidade dos serviços públicos e da Administração Pública, mas a degradação dos serviços para justificar o seu desmantelamento e colocá-la ao serviço dos seus interesses». Assim como não é o rigor no planeamento e a desburocratização que os move mas, por outro lado, o abrir caminho às possibilidades de aquisição exterior de serviços.
O secretário-geral do PCP acusou ainda o Governo de, nesta ofensiva, atacar fortemente os direitos dos trabalhadores da Administração Pública local, regional e central. Em sua opinião, o Executivo transformou estes trabalhadores nos «bodes expiatórios» de três décadas de governos do PS e do PSD, com ou sem o CDS. Estes partidos são, assegura, «são os verdadeiros responsáveis pela situação do País». E, acrescentou, quando os responsáveis por estas forças políticas falam «até parece que não foram eles mesmos que governaram o País nestes últimos trinta anos e que nada têm a ver com a partidarização e instrumentalização do aparelho de Estado, que eles próprios colocaram ao serviço das suas clientelas políticas e dos seus interesses».
Jerónimo de Sousa acusou ainda o Governo de, a pretexto da redução da despesa pública e no quadro de uma empolada dramatização do défice, estar a desferir «os mais rudes golpes nos direitos laborais e sociais dos trabalhadores da Administração Pública». Para o secretário-geral do PCP, o conjunto de medidas já tomadas e as que se perspectivam para o futuro «superam, pela sua gravidade, mas também pela sua arrogância e prepotência, todos os ataques desencadeados por outros governos no passado».
O secretário-geral do Partido considerou que as propostas dos comunistas para a Administração Pública, desenvolvidas no Encontro, mostram a possibilidade de «outras soluções», opostas às que têm vindo a ser aplicadas. Estas, revelou Jerónimo de Sousa, serão possíveis com uma política democrática e de esquerda que tenha por objectivo central a elevação da qualidade de vida dos portugueses e o desenvolvimento do País.


Mais artigos de: Em Foco

Denunciar o fascismo e os seus crimes

O salão do Centro de Trabalho Vitória, em Lisboa, encheu-se no passado dia 25 para assinalar os setenta anos da abertura do Campo de Concentração do Tarrafal, numa sessão que foi, também, o lançamento do livro das Edições Avante!, Dossier Tarrafal. A sessão foi dirigida por Manuela Bernardino, que estava acompanhada na mesa pelo secretário-geral do PCP, por Sérgio Vilarigues, antigo dirigente do Partido e ex-prisioneiro no Campo de Concentração do Tarrafal, e pelos membros do Comité Central Domingos Abrantes e Francisco Melo, este último responsável pelas Edições Avante!. Na primeira fila, sentavam-se outros dois antigos tarrafalistas: Joaquim Teixeira e José Barata, presos em sequência da Revolta dos Marinheiros de Setembro de 1936.