FALTA DE HUMOR
O altruísmo americano traduziu-se já em cerca de 655 mil mortos
É difícil nos tempos que correm encontrar motivos para rir na política internacional. Há demasiada morte, destruição e sofrimento. Mas os senhores de Washington são tão trogloditas que é impossível esconder um sorriso ocasional.
D ois jornalistas do New York Times, propalando a versão americana da execução de Saddam – parecida com o relatório oficial que Pôncio Pilatos deve ter enviado para Roma – conseguiram escrever: «quando o [“Primeiro-Ministro” iraquiano] Sr. Maliki decidiu avançar com a execução, os Americanos disseram que não iriam continuar a tentar impedi-la, tendo chegado à conclusão que podiam aconselhar os Iraquianos contra a execução, mas não impedi-la se os Iraquianos insistissem, por respeito para com a soberania iraquiana» (NYT, 3.1.07). A comovedora sensibilidade americana para com a soberania iraquiana – patente na destruição desse país ao longo dos últimos 15 anos – tinha sido evidenciada ainda na semana anterior. Segundo a cadeia televisiva CBS (dia de Natal, 2006): «Tropas americanas no Iraque prenderam pelo menos dois iranianos […] Dois dos detidos estavam de visita a convite do Presidente iraquiano, Jalal Talabani».
E m defesa do seu «novo Médio Oriente», «democrático» e com «valores ocidentais», Condoleeza Rice viajou até à maior democracia ocidental da região – a Arábia Saudita – e por entre palavras de apreço mútuo, declarou ao seu homólogo saudita: «Temos um objectivo comum, que é um Iraque unido [..] sem ingerências externas» (al Jazeera, 16.1.07). Tinha acabado de ser decidido em Washington enviar mais 20 mil soldados para o Iraque ocupado por Washington, a juntar aos 150 mil que lá estão desde a guerra levada a cabo por Washington, para servir os interesses de Washington. O altruísmo americano traduziu-se já em cerca de 655 mil mortos – mais ou menos 2,5% da população iraquiana (The Lancet, Outubro 2006).
Q uem parece não partilhar do fino sentido de humor americano são os chineses. Não terão achado graça ao facto de os EUA terem bombardeado a sua Embaixada em Belgrado, durante a guerra da NATO de 1999. Nem ao facto de em 2001 um dos aviões espiões dos EUA que patrulham constantemente a costa chinesa ter embatido num caça chinês, provocando a morte do seu piloto. Nem ao facto de o documento de estratégia nuclear dos EUA de 2002 («Nuclear Posture Review») citar explicitamente a China como um país em relação ao qual é concebível uma crise que leve os EUA a usar armas nucleares. Talvez por não ter achado graça a nada disto, a China efectuou a semana passada um ensaio, em que destruiu com um míssil lançado a partir de terra um velho satélite (seu) em órbita a cerca de 800 km de altitude. Foi então que os EUA também perderam o seu sentido de humor, tendo feito um protesto diplomático aos chineses. «O teste foi particularmente preocupante porque expôs a vulnerabilidade da dependência americana em relação a satélites de órbitas baixas, que são usados para comunicações militares, bombas inteligentes e espionagem. Em teoria, o exercício da semana passada pode dar a Pequim a capacidade de deitar abaixo esses satélites – facto que esteve na origem dos protestos de Washington» (Guardian, 19.1.07). Quem lhes deu o direito de andar a destruir os seus próprios satélites… como fizeram os EUA em meados dos anos 80 (CNN, 19.1.07)? Até porque «em finais de Agosto [2006] o Presidente Bush autorizou uma nova política espacial nacional que ignora apelos a uma proibição global deste tipo de testes. Essa política afirma que os Estados Unidos irão preservar os seus direitos, capacidades e liberdade de acção no espaço e dissuadir ou desencorajar outros, quer de impedir estes direitos, quer de desenvolver a capacidade de o fazer. […] Há vários anos que Russos e Chineses têm procurado alcançar um tratado que proíba as armas espaciais. O conceito de exibir poderio para forçar alguém à mesa das negociações é uma clássica técnica da guerra fria» (New York Times, 19.1.07). Há gente sem sentido de humor…
D ois jornalistas do New York Times, propalando a versão americana da execução de Saddam – parecida com o relatório oficial que Pôncio Pilatos deve ter enviado para Roma – conseguiram escrever: «quando o [“Primeiro-Ministro” iraquiano] Sr. Maliki decidiu avançar com a execução, os Americanos disseram que não iriam continuar a tentar impedi-la, tendo chegado à conclusão que podiam aconselhar os Iraquianos contra a execução, mas não impedi-la se os Iraquianos insistissem, por respeito para com a soberania iraquiana» (NYT, 3.1.07). A comovedora sensibilidade americana para com a soberania iraquiana – patente na destruição desse país ao longo dos últimos 15 anos – tinha sido evidenciada ainda na semana anterior. Segundo a cadeia televisiva CBS (dia de Natal, 2006): «Tropas americanas no Iraque prenderam pelo menos dois iranianos […] Dois dos detidos estavam de visita a convite do Presidente iraquiano, Jalal Talabani».
E m defesa do seu «novo Médio Oriente», «democrático» e com «valores ocidentais», Condoleeza Rice viajou até à maior democracia ocidental da região – a Arábia Saudita – e por entre palavras de apreço mútuo, declarou ao seu homólogo saudita: «Temos um objectivo comum, que é um Iraque unido [..] sem ingerências externas» (al Jazeera, 16.1.07). Tinha acabado de ser decidido em Washington enviar mais 20 mil soldados para o Iraque ocupado por Washington, a juntar aos 150 mil que lá estão desde a guerra levada a cabo por Washington, para servir os interesses de Washington. O altruísmo americano traduziu-se já em cerca de 655 mil mortos – mais ou menos 2,5% da população iraquiana (The Lancet, Outubro 2006).
Q uem parece não partilhar do fino sentido de humor americano são os chineses. Não terão achado graça ao facto de os EUA terem bombardeado a sua Embaixada em Belgrado, durante a guerra da NATO de 1999. Nem ao facto de em 2001 um dos aviões espiões dos EUA que patrulham constantemente a costa chinesa ter embatido num caça chinês, provocando a morte do seu piloto. Nem ao facto de o documento de estratégia nuclear dos EUA de 2002 («Nuclear Posture Review») citar explicitamente a China como um país em relação ao qual é concebível uma crise que leve os EUA a usar armas nucleares. Talvez por não ter achado graça a nada disto, a China efectuou a semana passada um ensaio, em que destruiu com um míssil lançado a partir de terra um velho satélite (seu) em órbita a cerca de 800 km de altitude. Foi então que os EUA também perderam o seu sentido de humor, tendo feito um protesto diplomático aos chineses. «O teste foi particularmente preocupante porque expôs a vulnerabilidade da dependência americana em relação a satélites de órbitas baixas, que são usados para comunicações militares, bombas inteligentes e espionagem. Em teoria, o exercício da semana passada pode dar a Pequim a capacidade de deitar abaixo esses satélites – facto que esteve na origem dos protestos de Washington» (Guardian, 19.1.07). Quem lhes deu o direito de andar a destruir os seus próprios satélites… como fizeram os EUA em meados dos anos 80 (CNN, 19.1.07)? Até porque «em finais de Agosto [2006] o Presidente Bush autorizou uma nova política espacial nacional que ignora apelos a uma proibição global deste tipo de testes. Essa política afirma que os Estados Unidos irão preservar os seus direitos, capacidades e liberdade de acção no espaço e dissuadir ou desencorajar outros, quer de impedir estes direitos, quer de desenvolver a capacidade de o fazer. […] Há vários anos que Russos e Chineses têm procurado alcançar um tratado que proíba as armas espaciais. O conceito de exibir poderio para forçar alguém à mesa das negociações é uma clássica técnica da guerra fria» (New York Times, 19.1.07). Há gente sem sentido de humor…