Não falar português
Aproveitando a mais recente reunião do ICANN, órgão de coordenação técnica global da Internet – «coordenação técnica», desempenhando, claro, a sua relevante parte de governação internetiana, e trabalhando com impacte em questões fronteiriças (no mínimo) «regulatórias» da Sociedade da Informação –, desta feita havida em Lisboa, na última semana de Março do corrente ano de 2007, vou com este texto voltar, por um bocado, à questão do português, a propósito da Internet e das línguas que os povos falam. É que tratou-se de uma questão principal dos debates aí havidos.
Pois pena foi que o ministro da Ciência & Tecnologia e Ensino Superior tivesse dado as boas vindas à assistência em Inglês – às muitas centenas de todo o mundo que participavam, num sítio onde o português é reconhecido sobretudo devido à acção dos brasileiros.
(Isto a fazer-me lembrar outra vez outra situação – espero não falhar demasiado nos pormenores enquanto vou pela memória, se bem que esteja confiante quanto à preservação do essencial da moral da história no que segue –, dizia, aquela situação acontecida numa conferência da UNESCO, na qual outro ministro de outro não longínquo Governo português interveio em inglês enquanto os ministros de todos os outros países da área da CPLP intervieram, na mesma ocasião, com toda a naturalidade, na sua língua, a portuguesa; aquela situação gerou então alguma pública celeuma, tendo-se ficado a saber, na mesma altura, a justificação dada – esse ministro tinha assim procedido porque falava muito bem inglês. Portanto, e pelo menos desde este ponto de vista, com o ministro Mariano Gago nada de novo. Também ele fala muito bem a língua inglesa – e nem precisou de beneficiar das «famosas» medidas tomadas pelo actual governo para o ensino de inglês já na instrução primária, ou melhor dito, no primeiro ciclo do «básico».)
Pena foi, pois, que o Professor Mariano Gago tivesse efectuado a sua intervenção em inglês até tendo em conta que, na anterior reunião do ICANN, realizada em São Paulo, em Dezembro de 2006, o responsável brasileiro – ele próprio doutorado por uma universidade norte americana – que se encontrou em semelhante posição de anfitrião dirigiu-se na sua alocução de boas vindas às centenas de participantes na sua língua materna, ou seja em português.
E esta falta talvez não tenha sido notada pelos portugueses presentes já habituados a esta de serem europeus, com o consequente saberem que estão em minoria linguística na União Europeia – no máximo o português é a nona língua mais falada por aqui e a distância considerável de quase todas as maiores –, e a valorizarem, não sem razão, o inglês comum em termos de comunicabilidade universal e de ferramenta eficiente.
Valeu também algum vento em sentido contrário, com o qual, em várias situações, os de fora, com diplomacia bastante, foram chamando a atenção para o facto anómalo de não ser por iniciativa vinda de pessoas do país anfitrião – visto o exemplo vindo de cima – que a língua portuguesa poderia aparecer ali falada.
Foi esta, aliás, a preocupação de um prestigiado participante americano que, na sua prelecção sobre o novo «protocolo Internet» – em precisão técnica, o IPv6 (a versão 6 do protocolo Internet) –, resolveu começar por dizer várias frases na língua de Camões – poeta «batido» por Salazar no concurso televisivo sobre os maiores portugueses de todos os tempos, ou coisa que o valha. Foi daquele quilate também a preocupação, no Fórum principal, da presidente do comité consultivo mundial dos utilizadores junto do ICANN, uma cidadã trinidad-tobaguense, a qual, para além de iniciar a sua intervenção com uma série de frases em português, ainda exortou em especial os participantes presentes falantes da nossa língua.
Mas, mais ainda. No encerramento da reunião do ICANN, o seu Conselho de Administração, ao aprovar a saudação e agradecimento da praxe à organização local(1), fê-lo em português por intermédio de um dos seus membros, uma brasileira, a qual em seguida leu a tradução oficial para inglês (dos 21 membros deste Conselho, 12 têm língua materna inglesa, logo seguidos dos 3 de língua portuguesa, 2 de espanhol, 2 de italiano, 1 de japonês e 1 de letão).
Quando é que as elites portuguesas – a começar pelos governantes –
passam a reconhecer que a nossa língua existe? Nem que seja por respeito tanto pelos seus falantes de outros países como pelos não falantes de português que reconhecem a sua existência …
(1) FCCN – Fundação para o Cálculo Científico Nacional.
Pois pena foi que o ministro da Ciência & Tecnologia e Ensino Superior tivesse dado as boas vindas à assistência em Inglês – às muitas centenas de todo o mundo que participavam, num sítio onde o português é reconhecido sobretudo devido à acção dos brasileiros.
(Isto a fazer-me lembrar outra vez outra situação – espero não falhar demasiado nos pormenores enquanto vou pela memória, se bem que esteja confiante quanto à preservação do essencial da moral da história no que segue –, dizia, aquela situação acontecida numa conferência da UNESCO, na qual outro ministro de outro não longínquo Governo português interveio em inglês enquanto os ministros de todos os outros países da área da CPLP intervieram, na mesma ocasião, com toda a naturalidade, na sua língua, a portuguesa; aquela situação gerou então alguma pública celeuma, tendo-se ficado a saber, na mesma altura, a justificação dada – esse ministro tinha assim procedido porque falava muito bem inglês. Portanto, e pelo menos desde este ponto de vista, com o ministro Mariano Gago nada de novo. Também ele fala muito bem a língua inglesa – e nem precisou de beneficiar das «famosas» medidas tomadas pelo actual governo para o ensino de inglês já na instrução primária, ou melhor dito, no primeiro ciclo do «básico».)
Pena foi, pois, que o Professor Mariano Gago tivesse efectuado a sua intervenção em inglês até tendo em conta que, na anterior reunião do ICANN, realizada em São Paulo, em Dezembro de 2006, o responsável brasileiro – ele próprio doutorado por uma universidade norte americana – que se encontrou em semelhante posição de anfitrião dirigiu-se na sua alocução de boas vindas às centenas de participantes na sua língua materna, ou seja em português.
E esta falta talvez não tenha sido notada pelos portugueses presentes já habituados a esta de serem europeus, com o consequente saberem que estão em minoria linguística na União Europeia – no máximo o português é a nona língua mais falada por aqui e a distância considerável de quase todas as maiores –, e a valorizarem, não sem razão, o inglês comum em termos de comunicabilidade universal e de ferramenta eficiente.
Valeu também algum vento em sentido contrário, com o qual, em várias situações, os de fora, com diplomacia bastante, foram chamando a atenção para o facto anómalo de não ser por iniciativa vinda de pessoas do país anfitrião – visto o exemplo vindo de cima – que a língua portuguesa poderia aparecer ali falada.
Foi esta, aliás, a preocupação de um prestigiado participante americano que, na sua prelecção sobre o novo «protocolo Internet» – em precisão técnica, o IPv6 (a versão 6 do protocolo Internet) –, resolveu começar por dizer várias frases na língua de Camões – poeta «batido» por Salazar no concurso televisivo sobre os maiores portugueses de todos os tempos, ou coisa que o valha. Foi daquele quilate também a preocupação, no Fórum principal, da presidente do comité consultivo mundial dos utilizadores junto do ICANN, uma cidadã trinidad-tobaguense, a qual, para além de iniciar a sua intervenção com uma série de frases em português, ainda exortou em especial os participantes presentes falantes da nossa língua.
Mas, mais ainda. No encerramento da reunião do ICANN, o seu Conselho de Administração, ao aprovar a saudação e agradecimento da praxe à organização local(1), fê-lo em português por intermédio de um dos seus membros, uma brasileira, a qual em seguida leu a tradução oficial para inglês (dos 21 membros deste Conselho, 12 têm língua materna inglesa, logo seguidos dos 3 de língua portuguesa, 2 de espanhol, 2 de italiano, 1 de japonês e 1 de letão).
Quando é que as elites portuguesas – a começar pelos governantes –
passam a reconhecer que a nossa língua existe? Nem que seja por respeito tanto pelos seus falantes de outros países como pelos não falantes de português que reconhecem a sua existência …
(1) FCCN – Fundação para o Cálculo Científico Nacional.