Reflexões sobre a democratização do desporto
A massa de indivíduos que, no nosso País, não praticam qualquer actividade desportiva (no seu sentido mais lato), é enorme (cerca de 8 ou 9 milhões). A abertura que se verificou, por toda a parte, do desporto a todas as camadas da população, está longe de se ter dado entre nós apesar das grandes esperanças criadas com o 25 de Abril e do extraordinário movimento popular de difusão das actividades que se verificou, nos três, quatro anos seguintes a 1974, em todo o País. Desta enorme e apaixonante dinâmica restam ainda alguns traços, mas, no essencial, ela foi liquidada pelos sucessivos governos que (des)governaram o sector desde então. No presente, a situação é grave em relação às camadas da população com menos capacidade económica (é ver, por ex., o que se passa com a educação física no 1.º Ciclo do Ensino Básico oficial, enquanto no privado esta «disciplina», é em muitos colégios, apresentada como um elemento de prestígio porque beneficia o aluno).
Sob a sua forma tradicionalmente mais elaborada, o desporto mantêm-se extremamente selectivo e, em relação a várias modalidades continua a predominar o carácter elitista das práticas, ainda que assumindo novas formas. Em qualquer dos casos o desporto continua a não responder às necessidades sociais da prática, e em relação a uma enorme percentagem da população continuam a levantar-se obstáculos intransponíveis para que construam a sua própria cultura desportiva (os poucos estudos disponíveis mostram que só um em cada quatro portugueses se dedicam à prática de uma qualquer prática físico-desportiva – inevitavelmente trata-se da mais baixa percentagem de praticantes em relação ao resto da Europa, ainda que, em nossa opinião, esta relação necessite de uma comparação sólida pois parece-nos demasiado optimista).
Repensar do desporto
A elaboração de uma solução para este problema passa pela resolução de um conjunto importante de dificuldades na vida do indivíduo. Mas a nossa tese é a seguinte: o desporto pode repensar-se, no sentido de organizar novas formas, promover novos valores e estruturar uma nova lógica, tudo isto com a finalidade de permitir que se ultrapassem muitos daqueles obstáculos quer se trate das desigualdades económicas, quer das culturais.
Pretende isto dizer que, sem se cair numa visão utópica cretina, é possível fazer desempenhar à prática desportiva uma nova função social. Esta é tanto mais necessária, quanto as alterações provocadas pela política dos sucessivos governos, e pelas transformações económicas, fragilizaram ainda mais o tecido social agravando as situações de desigualdade, de desinserção social e de segregação no acesso.
Meditar nesta questão, evidentemente com um sentido prático, significa que se tem de tomar consciência de que a actividade desportiva dirigida às camadas populares corre dois perigos: ou subordinar-se a uma visão idealizante da função e estrutura do «seu» desporto, absolutamente inoperante porque incapaz de tornear os obstáculos colocados pelo sistema social aos processos de adesão, ou limitar-se a integrar a lógica dominante, sem a alterar, aceitando-a acriticamente e sem qualquer resistência aos seus aspectos negativos. Num e noutro caso, no fundo, só se garantirá a reprodução de uma situação em que as camadas populares vivem a contradição maior entre as suas necessidades e os meios para lhes dar resposta.
Uma perspectiva realmente inovadora da prática desportiva, capaz de fornecer elementos, a partir do próprio desporto, para a resolução desta contradição, não se pode deixar fechar nesta alternativa. Quanto a nós há, de facto, uma área de manobra possível entre as duas, desde que a solução a pesquisar assente na resposta em constante evolução, aos problemas a resolver na prática, através da própria organização, em conjunto com quem organiza e com quem pratica e possui uma noção, mesmo que pouco clara e organizada, das necessidades que sente que deveriam obter solução adequada.
Ainda que a noção que aqui se defende possa provocar reacções negativas de quem já pratica (porque possui condições para o acesso) e antevê a possibilidade de chegada de novos elementos como uma ameaça aos seus privilégios, trata-se de criar uma nova forma de praticar desporto, liberta do modelo dominante, ainda que partindo da experiência do passado. Qualquer um compreende que não se está perante uma tarefa fácil. Antes de tudo, porque a perspectiva dominante domina de facto, isto é, impregna a totalidade da sociedade. Com a agravante de aqueles que mais de perto vivem as contradições criadas por esse domínio, estarem também culturalmente intensamente condicionadas por ele, e terem naturais dificuldades, em verem com suficiente clareza, os contornos da alternativa.
Sob a sua forma tradicionalmente mais elaborada, o desporto mantêm-se extremamente selectivo e, em relação a várias modalidades continua a predominar o carácter elitista das práticas, ainda que assumindo novas formas. Em qualquer dos casos o desporto continua a não responder às necessidades sociais da prática, e em relação a uma enorme percentagem da população continuam a levantar-se obstáculos intransponíveis para que construam a sua própria cultura desportiva (os poucos estudos disponíveis mostram que só um em cada quatro portugueses se dedicam à prática de uma qualquer prática físico-desportiva – inevitavelmente trata-se da mais baixa percentagem de praticantes em relação ao resto da Europa, ainda que, em nossa opinião, esta relação necessite de uma comparação sólida pois parece-nos demasiado optimista).
Repensar do desporto
A elaboração de uma solução para este problema passa pela resolução de um conjunto importante de dificuldades na vida do indivíduo. Mas a nossa tese é a seguinte: o desporto pode repensar-se, no sentido de organizar novas formas, promover novos valores e estruturar uma nova lógica, tudo isto com a finalidade de permitir que se ultrapassem muitos daqueles obstáculos quer se trate das desigualdades económicas, quer das culturais.
Pretende isto dizer que, sem se cair numa visão utópica cretina, é possível fazer desempenhar à prática desportiva uma nova função social. Esta é tanto mais necessária, quanto as alterações provocadas pela política dos sucessivos governos, e pelas transformações económicas, fragilizaram ainda mais o tecido social agravando as situações de desigualdade, de desinserção social e de segregação no acesso.
Meditar nesta questão, evidentemente com um sentido prático, significa que se tem de tomar consciência de que a actividade desportiva dirigida às camadas populares corre dois perigos: ou subordinar-se a uma visão idealizante da função e estrutura do «seu» desporto, absolutamente inoperante porque incapaz de tornear os obstáculos colocados pelo sistema social aos processos de adesão, ou limitar-se a integrar a lógica dominante, sem a alterar, aceitando-a acriticamente e sem qualquer resistência aos seus aspectos negativos. Num e noutro caso, no fundo, só se garantirá a reprodução de uma situação em que as camadas populares vivem a contradição maior entre as suas necessidades e os meios para lhes dar resposta.
Uma perspectiva realmente inovadora da prática desportiva, capaz de fornecer elementos, a partir do próprio desporto, para a resolução desta contradição, não se pode deixar fechar nesta alternativa. Quanto a nós há, de facto, uma área de manobra possível entre as duas, desde que a solução a pesquisar assente na resposta em constante evolução, aos problemas a resolver na prática, através da própria organização, em conjunto com quem organiza e com quem pratica e possui uma noção, mesmo que pouco clara e organizada, das necessidades que sente que deveriam obter solução adequada.
Ainda que a noção que aqui se defende possa provocar reacções negativas de quem já pratica (porque possui condições para o acesso) e antevê a possibilidade de chegada de novos elementos como uma ameaça aos seus privilégios, trata-se de criar uma nova forma de praticar desporto, liberta do modelo dominante, ainda que partindo da experiência do passado. Qualquer um compreende que não se está perante uma tarefa fácil. Antes de tudo, porque a perspectiva dominante domina de facto, isto é, impregna a totalidade da sociedade. Com a agravante de aqueles que mais de perto vivem as contradições criadas por esse domínio, estarem também culturalmente intensamente condicionadas por ele, e terem naturais dificuldades, em verem com suficiente clareza, os contornos da alternativa.