Os museus

Henrique Custódio
O inacreditável aconteceu: o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), um dos mais prestigiados do País, começou esta semana a encerrar algumas salas de exposição, o mesmo se preparando para fazer o Museu de Arqueologia (MA), embora (para já) apenas durante a hora do almoço.
Estes encerramentos resultam de uma única, mas incontornável, razão: há falta de pessoal vigilante.
Interpelada pelo Pú­blico, a ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, fez o que melhor aprendeu na sua cultural governação: sacudiu imediatamente a água do capote, assegurando que «não há a mais pe­quena res­pon­sa­bi­li­dade do Mi­nis­tério da Cul­tura neste as­sunto», estando-se perante uma «si­tu­ação de co­lapso pro­vo­cado pela falta de atenção do Ins­ti­tuto dos Mu­seus e da Con­ser­vação [IMC]», que não terá «alertado a tempo» o Ministério da Cultura para o fim dos contratos de tarefa de parte substancial dos funcionários dos museus. Para ficar melhor no retrato, a ministra acrescentou que já fez seguir para o ministério das Finanças o pedido de novos «contratos de tarefa» para vigilantes de museu «e neste mo­mento está a fazer a maior pressão pos­sível para que seja au­to­ri­zada a pror­ro­gação».
Sinalizamos a candura com que a ministra confessa considerar a pressão um instrumento importante na concretização das suas decisões, deduzindo-se que tal não abonará grande coisa em relação à autoridade e ao prestígio que exibirá nos conselhos de ministros, mas adiante.
Também interpelado, o director do IMC, Manuel Bairrão Oleiro, escusou-se prudentemente a comentar as acusações da ministra, mas o jornal recorda o que ele afirmara horas antes: que o problema da falta de guardas nos museus «é co­nhe­cido desde há muito e ne­ces­sita de uma so­lução de­fi­ni­tiva que ainda não é esta», cuja consiste na «ex­pec­ta­tiva de que a si­tu­ação fi­casse re­sol­vida com a re­a­fec­tação do pes­soal ex­ce­den­tário [da Função Pública]. Mas só 11 pes­soas é que se dis­po­ni­bi­li­zaram para isso e há mais de uma cen­tena de lu­gares a pre­en­chera».
A ministra confirmou tudo e rematou tranquilamente que «neste mo­mento só há uma forma de re­solver este as­sunto, que são os con­tratos de ta­refa».
Acontece que a renovação destes «contratos de tarefa» (para a qual a ministra disse ir fazer a tal «maior pressão possível») não passa de «um balão de oxi­génio», nas palavras de Paulo Henriques, director do MNAA, acrescentando que o que é grave é que «não se pers­pec­tiva ne­nhuma so­lução de­fi­ni­tiva», ou seja, a contratação dos tais 102 funcionários em falta, concluindo Luís Raposo, director do MA, que esta «ló­gica de pre­ca­ri­zação ab­so­luta» aplicada aos vigilantes dos museus torna «im­pos­sível gerir uma casa sem se saber o que acon­tece amanhã».
Em suma, ao contrário do que diz a ministra, o Instituto dos Museus nada tem a ver com a falta de vigilantes, o Ministério da Cultura é que tem tudo a ver com essa falta e a solução não está em «contratos de tarefa» ou lotaria de «excedentários», mas na contratação de, pelo menos, 102 funcionários do quadro efectivo.
O Governo é que não quis fazê-lo porque, em matéria de Cultura, o próprio Primeiro-Ministro José Sócrates preferiu, pessoalmente, entregar há meses milhões de mão beijada mais a zona de exposições do CCB às especulações «artísticas» de Joe Berardo, a apetrechar os museus nacionais com os funcionários indispensáveis para o seu funcionamento. E o resto é conversa.


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