O brilho do balão

Leandro Martins
Fazer contas é próprio dos momentos que se seguem aos actos eleitorais. Contas aos números, contas à vida. E, nesta, contas ao que se fez e deixou de fazer. Contas ao passado, pois. E contas ao futuro, que será o que mais interessa a todos. Por nossa parte, as contas nunca nos esquecemos de as fazer. E, para já, concluímos, entre as muitas parcelas que mostram a atitude do eleitorado, que este, no seu conjunto, decidiu dar um grande banho ao Partido Socialista de Sócrates, mostrando-lhe o vermelho de um cartão que outros pretenderam tingir de amarelo ou de laranja ou de outra cor do arco-íris político.
Nos comentários entretanto ouvidos na noite eleitoral, a tónica das contas foi a mesma, com ligeira diferença, daquela que «orientou» uma comunicação social paga e dirigida pela grande burguesia. Não nos espantou, portanto, ouvir doutos comentadores e «jornalistas» dizer que o grande derrotado foi... o PCP! António Barreto foi mesmo ao ponto de considerar tal «derrota» como «histórica»! Só porque a «extrema-esquerda» passara à frente – por escassos votos, recorde-se – da CDU.
Claro que sabemos que o homem, desde uma certa carta «da Suíça», confunde esquerda com direita, a direita para onde ele rapidamente resvalou, tornando-se pouco tempo depois num ministro terrorista que, do bojo soarista contra-revolucionário, iria dar as primeiras e graves facadas na Reforma Agrária, iniciando então o processo de recuperação capitalista... em nome da esquerda.
Entretanto, nessa mesma noite de domingo, não pudemos deixar de reparar no brilho dos olhos dos dirigentes e eleitos do Bloco de Esquerda, exorbitados, bebendo as palavras de Sócrates, aguardando algum sinal que lhes desse poleiro. Ficou à vista o que pretende este agrupamento político que se veste de esquerda para arrebanhar votos do PS. Não para a ruptura e a mudança. Mas tão só para alcançar o degrau, o banco, a cadeira, o lugar à mesa de uma esquerda que faz a política de direita. Tal como inchou o balão do BE na noite das eleições, vai esvaziar certamente na frustração do poder. Ou, no caso de a tentação ser grande e sagaz a esperteza de quem os levou ao colo durante todas as campanhas e mesmo fora delas, se vier a concretizar-se a aliança de um casamento a bem-da-nação, o balão nem sequer esvazia. Rebenta mesmo.
As nossas contas são outras. Do reforço que a CDU colheu, nesta campanha e nos seus resultados, partimos desde já para novas lutas, construindo um futuro muito urgente. O de pôr fim à política de direita.


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