Grande Área Metropolitana de Lisboa

O trabalho da Assembleia Metropolitana e a ausência do PS

Modesto Navarro
No balanço do mandato, apreciamos positivamente o trabalho de três das cinco comissões permanentes da Assembleia Metropolitana da Grande Área Metropolitana de Lisboa.
Desde logo assinalamos o trabalho da Comissão Permanente de Planeamento, Ordenamento do Território e Ambiente, que configura um verdadeiro legado de levantamento da problemática das cheias e inundações em zonas urbanas, com vista ao novo mandato e à passagem de contributos para o trabalho futuro na área metropolitana. Assinalamos assim:
- A chamada de atenção para os atrasos nas medidas e prevenção, as diferenças entre municípios e a ausência de articulação, mesmo entre municípios vizinhos;
- A carência de meios humanos e financeiros disponíveis na administração central, o que é grave e assustador;
- Inexistência de tratamento integrado e abrangente na totalidade da AML e ausência de cartografia de riscos ocorridos e potenciais;
- A situação de um comando distrital operacional mais voltado para os fogos florestais e, portanto, pouco qualificado e organizado para outras situações de perigo e possíveis catástrofes;
- A chamada de atenção para as alterações climáticas, as surpresas e violências cada vez mais possíveis e o aumento de riscos, que exigem avaliações exactas, estabelecimento de normas e critérios e a urgente adequação das revisões dos PDMs dos municípios.
Nas medidas propostas neste documento da comissão inclui-se a elaboração de uma carta de zonas potencialmente inundáveis e regulamentos com restrições necessárias para fazer face aos riscos de cheias, a reflexão e as propostas de critérios hidro-urbanísticos com vista a uma integração futura em cada planeamento municipal.
Propõe-se ainda a implementação da directiva europeia de mapas de riscos de inundação e dos planos de gestão de riscos em zonas urbanas; a análise e estudo de prevenção e gestão de situações de cheias; a eventual criação de um centro de previsão de riscos alargado a todo o tipo de catástrofes; o estudo com vista à implantação de um centro de previsão de riscos e sistemas de aviso e planos de Socorro e emergência.
A avaliação do quadro político-administrativo que a comissão faz é exacta e oportuna, na perspectiva de que outra seria já a situação de prevenção e intervenção coordenada se tivéssemos avançado em devido tempo na regionalização e na criação de instrumentos de poder efectivo na área metropolitana.
Perante esta situação de dificuldades primárias no estudo, avaliação e criação de instrumentos coordenados de intervenção, a comissão avança com a proposta de criação de uma autoridade metropolitana para assumir estas frentes, ou, pelo menos, a constituição de um grupo de trabalho permanente, no âmbito da Junta Metropolitana, numa composição que integre uma maioria de representação dos municípios.
Parabéns à comissão pelo trabalho de contactos e de elaboração deste documento, que honra a Assembleia Metropolitana pela qualidade, isenção e rigor que foram atingidos.
Podemos dizer que, nas vicissitudes em que fomos sobrevivendo ao longo do mandato, algo de novo e claramente propiciador de expectativas foi realizado.

Transferência de competências na educação

Quanto ao documento apresentado pela Comissão Permanente de Educação, Cultura, Desporto, Juventude, Ciências e Tecnologia sobre transferência de competências da área da educação para as câmaras municipais, assinalamos que ele beneficia de uma tradição de trabalho conjunto dos pelouros da educação da AML desde 1996/97, proposto então por eleitos do PCP, caso único em todos estes anos de mandatos a nível metropolitano.
O documento salienta desde logo que, em relação ao decreto-lei 144/08, só a Direcção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo e o Ministério da Educação estavam de acordo quanto ao processo de negociação e medidas propostas. Pudera! - eram os seus autores e proponentes...
A Comissão teve diversas reuniões com representantes dos municípios e de instituições significativas nesta área da educação.
As seis câmaras municipais que acabaram por subscrever o contrato de execução não responderam a propostas de reunião, o que é significativo quanto ao entendimento «democrático» de funcionamento dos órgãos da área metropolitana que esse silêncio evidencia.
Há uma referência muito interessante ao que foi o início de transferência de equipamento escolar do 1.º ciclo, em 1984, processo que ainda hoje merece apreciações negativas pelo não cumprimento pelo poder central quanto às suas obrigações e quanto aos pesados encargos que têm recaído sobre as autarquias.
Hoje, face a eventuais responsabilidades de transferência nos 2.º e 3.º ciclos, há municípios que exigem, como medida preventiva, a recuperação prévia dos equipamentos escolares, e há outros que continuam a remeter para o poder central e para o Governo as responsabilidades constitucionais que pretendem alijar para os municípios, sufocando-os com mais responsabilidades e com menos condições financeiras para trabalharem e sobreviverem.
Há uma confusão enorme e uma deliberada indefinição quanto a competências e responsabilidades que o Governo tenta instalar nos municípios; mas conseguiu a colaboração atenta e obrigada, e irresponsável, sobretudo, de algumas câmaras e autarcas do PS e do PSD, sedentos de mais poder «paroquial» para melhor se afundarem em dificuldades e dívidas. Não os preocupam as dificuldades financeiras e os problemas das populações noutras áreas que não assumem nem resolvem. Querem ser «patrões» locais também nas escolas, e são as crianças, os jovens, os professores e todos os trabalhadores das escolas, os pais e encarregados de educação que sofrem as consequências desse amadorismo e dessa sofreguidão em fazerem jeitos ao Governo do PS, que esfregou as mãos de contente e dividiu para reinar e para poder aplicar as dotações da educação e de outras responsabilidades próprias em apoios à banca, aos banqueiros e a gente de outras áreas mas dos mesmos hábitos de oportunismo, corrupção e enriquecimento.
O documento da comissão realça o esforço financeiro a que foram obrigados os municípios desde as transferências de 1984 e diz que a maioria das autarquias da AML não quer assumir mais encargos face à má situação dos equipamentos escolares dos 2.º e 3.º ciclos e às novas exigências em matérias resultantes de reformas do ensino – novos espaços, tecnologias, centros de recursos, laboratórios, etc..
Há problemas diferentes e assimetrias entre os municípios; perante as pressões para o Estado central se poder desresponsabilizar das suas obrigações, a comissão levanta a questão de o poder central, o Governo, querer ou não a municipalização do ensino... Para nós, isso é cada vez mais evidente, numa situação social e educativa em que são maiores os desafios e dificuldades.
Por isto mesmo, impõe-se a necessidade de maior articulação entre os poderes central e local, com a criação de patamar do poder regional, finalmente assumido, até para enfrentar as situações sociais agravadas, o desemprego, a pobreza, a urgência em construir uma nova visão e realidade eficaz de desenvolvimento e criação de riqueza, na crise avassaladora que indicia e anuncia a recente revisão em baixa do PIB. Para além de que o défice, sempre tão propalado para fazer passar medidas pesadas para a maioria do povo português, já ultrapassou os 6 por cento.

Ausência de trabalho de eleitos do PS

Quanto ao trabalho da Comissão Permanente de Coesão Social, podemos dizer que faz diagnósticos adequados da situação de qualificação e emprego na AML. Damos relevo às abordagens relativas aos desafios para as Áreas Metropolitanas e à qualidade do emprego na Área Metropolitana de Lisboa.
Saudamos o trabalho desta Comissão e o dossier que organizou. Fazemos uma apreciação positiva do trabalho das três comissões; as duas primeiras que aqui referimos têm a presidência de eleitos da CDU e esta terceira, de Coesão Social, tem a presidência de um eleito do PSD. Curiosamente, numa assembleia metropolitana de presidência e maioria simples do grupo do Partido Socialista, as suas comissões com presidência de eleitos do PS não realizaram o trabalho que foi preparado em conferência de representantes e que mereceu a concordância da assembleia metropolitana. Fica o registo a assinalar este facto insólito. Nós assumimos as nossas responsabilidades, houve eleitos de todas as forças políticas que trabalharam nas comissões que elaboraram relatórios, mas faltaram a solidariedade e o empenho dos presidentes das comissões eleitos pelo PS, o que dá nota evidente da incapacidade desta força política em perceber em que situação estamos e quais as exigências que se impõem para o futuro; ou, então, que foi isto mesmo que quiseram, o marasmo e a ineficácia, para protegerem o seu Governo moribundo.
A situação na área metropolitana agrava-se; a nova e tão velha legislação do Governo PS para as áreas metropolitanas não serve e começa logo por não motivar os apoiantes e membros desse partido, ou por deixá-los sossegados e cegos perante a realidade dos factos.
Precisamos de uma mudança urgente da situação política, de um novo Governo ao serviço dos interesses reais do povo português, de um desenvolvimento integrado e de respostas eficazes numa região com dificuldades crescentes, com perda de emprego, de criação de riqueza e qualidade de vida.
É o povo da área metropolitana que exige a mudança, enfrentando um Governo e um partido que falharam em toda a linha, menos na defesa dos privilegiados e dos mais ricos, que devotadamente lhes agradecem a concentração da riqueza numa cada vez maior minoria de sempre.
É este o resultado de quem se esqueceu das promessas eleitorais e que enterrou ideais para servir outros interesses, ao arrepio dos interesses nacionais.


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