Comentário

Uribe: uma herança macabra!

Pedro Campos

Álvaro Uribe, pre­si­dente da Colômbia há oito anos, homem li­gado ao pa­ra­mi­li­ta­rismo e ao trá­fico de drogas, vai deixar o Pa­lácio de Na­rinho dentro de pouco. A he­rança que deixa ao seu povo di­fi­cil­mente po­deria ser mais ma­cabra: mais vi­o­lência po­lí­tica – in­cluindo os «falsos po­si­tivos» –, mais in­jus­tiça so­cial, mais es­cân­dalos po­lí­ticos, mais pa­ra­mi­li­ta­rismo, mais pro­dução de droga e menos so­be­rania na­ci­onal.

Apesar de ga­lar­doado por uma as­so­ci­ação eco­nó­mica es­pa­nhola (Grupo In­te­re­co­nomia) «como o me­lhor di­ri­gente po­lí­tico ibero-ame­ri­cano da dé­cada», Uribe deixa uma Colômbia onde «46% da po­pu­lação vivem em con­di­ções de po­breza e 17% estão na rua, ou seja 20,5 mi­lhões de co­lom­bi­anos são po­bres e 7,9%, in­di­gentes». Estes são nú­meros de MESEP. Mas o ex-mi­nistro Ca­milo Res­trepo vai mais longe: as ci­fras das áreas ru­rais são ainda mais de­sa­ni­ma­doras, já que 80% dos ha­bi­tantes das mesmas são po­bres e 46% vivem na in­di­gência. Desta forma a «brecha de po­breza entre o ur­bano e o rural con­tinua a crescer».

Se­gundo Jorge Ivan Gon­zález, di­rector do Centro de In­ves­ti­gação para o De­sen­vol­vi­mento, da Uni­ver­si­dade Na­ci­onal e membro do MESEP, «o cres­ci­mento dos úl­timos anos foi muito es­pe­cu­la­tivo (...) e a es­pe­cu­lação da eco­nomia ma­ni­festa-se num en­ri­que­ci­mento doido do sector fi­nan­ceiro», que não in­cide na qua­li­dade de vida da po­pu­lação. É certo que entre 2005 e 2007 houve um cres­ci­mento médio de 5,6%, mas a dis­tri­buição de ren­di­mentos con­tinua a ser de­si­gual e a po­lí­tica do go­verno nada fez «para re­duzir a con­cen­tração de ri­queza nas mãos de uns poucos». Para a or­ga­ni­zação Viva a Ci­da­dania, a Colômbia é «um dos dez países do mundo com menos equi­dade e, de­pois do Haiti, o mais de­si­gual da Amé­rica La­tina». Por outro lado, os nú­meros des­mentem o «mi­lagre uri­bista». De acordo com Edu­ardo Sar­mi­ento (jornal El Es­pec­tador), nos úl­timos 20 anos o PIB cresceu menos do que nas duas dé­cadas an­te­ri­ores. Ou seja, o de­sastre vem de longe! O mesmo ana­lista aponta que o de­sem­prego está acima de 12% e o sector pro­du­tivo está em pro­cesso de des­for­ma­li­zação. Mais: o De­par­ta­mento Ad­mi­nis­tra­tivo de Es­ta­tís­ticas in­forma que, em 2009, 300 mil co­lom­bi­anos caíram no de­sem­prego e que a ex­plo­ração se abate sobre os jo­vens: 14,6% dos tra­ba­lha­dores nem se­quer são mai­ores de idade.

 

Os falsos po­si­tivos

 

Em Se­tembro de 2009, pouco de­pois do de­sa­pa­re­ci­mento de 16 jo­vens nos de­par­ta­mentos de So­acha e Agua­chicas, ga­nhou di­mensão o es­cân­dalo dos «falsos po­si­tivos», um dos as­pectos mais ma­ca­bros do go­verno uri­bista.

Clara López Obregón, se­cre­tária do go­verno de Bo­gotá, ad­vertiu que estes casos po­de­riam ser «um de­sa­pa­ri­mento for­çado com fins de ho­mi­cídio». Os mi­li­tares ne­garam ime­di­a­ta­mente essa hi­pó­tese e con­fir­maram que se tra­tava de jo­vens re­cru­tados pelas guer­ri­lhas que se lhes ti­nham en­fren­tado. Sabe-se que não é assim, e nos úl­timos seis anos a lei está a in­ves­tigar 1600 casos que en­volvem 3546 mem­bros do exér­cito co­lom­biano. Destes, só 426 estão de­tidos e apenas 50 têm sen­tença con­de­na­tória. Em Junho do ano pas­sado Mario Iguarán, pro­cu­rador geral da Colômbia, afirmou que mais de mil casos de ho­mi­cí­dios, sob a fi­gura de «falsos po­si­tivos», foram ale­ga­da­mente per­pe­trados por fun­ci­o­ná­rios da força pú­blica. De fora do país chegam con­fir­ma­ções desta po­lí­tica. Philip Alston, da ONU, de­nun­ciou que a exe­cução ex­tra­ju­di­cial de mi­lhares de civis por parte do exér­cito foi uma po­lí­tica que se pra­ticou de forma sis­te­má­tica no país.

Ac­tu­al­mente, a in­ves­ti­gação de casos re­la­ci­o­nados com os «falsos po­si­tivos» atinge, se­gundo o fiscal geral, o nú­mero de «mil no­ve­centos casos de civis alheios ao con­flito po­lí­tico, que foram se­ques­trados e exe­cu­tados por mem­bros do exér­cito», em con­sequência de uma po­lí­tica do Mi­nis­tério da De­fesa im­ple­men­tada desde No­vembro de 2005. Esta po­lí­tica, de acordo com El Nuevo He­rald (Miami) pôs preço à ca­beça de co­man­dantes, co­mandos e sol­dados dos grupos ir­re­gu­lares.

O mesmo jornal, ob­vi­a­mente in­sus­peito, ad­verte que «num país sob um san­grento con­flito civil e com um dos ín­dices de vi­o­lência mais ele­vados do mundo, apa­recem tes­te­mu­nhas e in­dí­cios de que esta norma se po­deria ter con­ver­tido num fatal ali­ci­ante para al­guns mi­li­tares, que se de­di­caram a matar ino­centes com a fi­na­li­dade de re­ceber as re­com­pensas, apre­sen­tando-os como mortos em com­bate». De onde sai o di­nheiro para estes pa­ga­mentos? O jornal avança com uma hi­pó­tese: «po­deria vir de fundos do go­verno dos Es­tados Unidos».



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