O voto da esquerda

André Levy

Os res­tantes meses de 2010 pro­metem uma agu­di­zação da luta so­cial e po­lí­tica em Por­tugal, in­cluindo a luta na­ci­onal de tra­ba­lha­dores no dia 29 de Se­tembro e as formas de luta unida que cer­ta­mente se se­guirão (a somar às inú­meras lutas nos di­versos sec­tores e lo­cais de tra­balho); a ci­meira da NATO em Lisboa, que será re­ce­bida com um va­lente «Paz Sim, Nato Não» no dia 20 de No­vembro, na Ave­nida da Li­ber­dade; e a cam­panha para Pre­si­dência da Re­pú­blica (PR).

Na­tu­ral­mente estas vá­rias frentes de luta não são des­co­nexas. O agra­va­mento da ex­plo­ração ca­pi­ta­lista e da in­jus­tiça so­cial, no con­texto de crise es­tru­tural do sis­tema, conduz ao cres­ci­mento da re­sis­tência dos tra­ba­lha­dores: não são os res­pon­sá­veis pela crise que pagam a conta (estes re­cebem sub­sí­dios es­ta­tais, pois o seu co­lapso é «in­con­ce­bível»), mas sim a vasta mai­oria, os tra­ba­lha­dores, re­for­mados, de­sem­pre­gados e jo­vens que apertam o cinto até su­fo­carem mas lutam para pre­servar os di­reitos his­tó­ricos con­quis­tados com sangue.

A cres­cente ex­plo­ração a nível global está in­ti­ma­mente li­gada ao cres­ci­mento do mi­li­ta­rismo e ao en­vol­vi­mento con­junto dos EUA com os seus ali­ados (sejam eles a Co­reia do Sul, Is­rael ou a União Eu­ro­peia) em agres­sões im­pe­ri­a­listas na busca de novas áreas de in­fluência, con­quista de novos mer­cados, acesso a re­cursos na­tu­rais e des­truição de ri­vais emer­gentes. Quem du­vide deste cres­ci­mento que acom­panhe o au­mento de des­pesas or­ça­men­tais dos EUA e da União Eu­ro­peia na área mi­litar. Não é pa­ra­doxal que sob o pre­si­dente (prémio Nobel da Paz) Ba­rack Obama o or­ça­mento mi­litar dos EUA con­tinue a au­mentar? E quantos ci­da­dãos da UE se dão conta de que en­quanto o Banco Cen­tral Eu­ropeu e a Co­missão Eu­ro­peia acenam a ba­tuta aos go­vernos na­ci­o­nais para im­porem me­didas de aus­te­ri­dade e con­terem as des­pesas or­ça­men­tais no sector pú­blico, a des­pesa mi­litar Eu­ro­peia au­menta, à custa dos es­tados mem­bros, quer para adaptar as forças na­ci­o­nais às exi­gên­cias e aven­turas da NATO, quer para criar uma agência mi­litar fe­deral?

Tanto in­ves­ti­mento mi­litar faz prever uma nova es­tra­tégia, uma pos­tura mais exi­gente do ponto de vista de re­cursos. A ci­meira da NATO, que irá de­correr em Por­tugal, pre­tende pre­ci­sa­mente con­sa­grar a nova es­tra­tégia da NATO, que efec­ti­va­mente irá auto con­ceder-se o di­reito de in­tervir em qual­quer parte do mundo onde os seus in­te­resses se vejam ame­a­çados. «In­te­resses» en­ten­didos da forma mais lata: se­gu­rança in­terna dos es­tados, energia. am­bi­ente, pres­sões mi­gra­tó­rias. Ou seja, o posso, quero e mando.

Quando Durão Bar­roso re­cebia Bush nas Lajes, al­gumas fi­guras do PS atre­viam-se a vir à rua pro­testar contra o con­ceito de guerra pre­ven­tiva e a in­vasão dos EUA no Iraque. E agora, que o PS está no Go­verno e os altos dig­na­tá­rios da NATO vão ser re­ce­bidos por José Só­crates, será que o mi­li­tante his­tó­rico desse par­tido que ainda se afirma so­ci­a­lista, esse can­di­dato que alega ser um es­paço de con­ver­gência da es­querda, vai di­rigir uma pa­lavra de crí­tica à NATO, à es­ca­lada ar­ma­men­tista ou à nova es­tra­tégia ultra-abran­gente? Du­vido.

Lanço o de­safio aos que se en­tendem como sendo da es­querda e pre­tendem votar Alegre, que te­nham pre­sente que ao votar para a PR irão também con­tri­buir para eleger o chefe su­premo das Forças Ar­madas Por­tu­guesas. Um can­di­dato que aceita esta po­lí­tica de sub­ser­vi­ência face aos grande po­deres no seio da NATO; que aceita o cres­cente mi­li­ta­rismo da União Eu­ro­peia; que não se com­pa­dece com co­locar a vida dos nossos mi­li­tares ao ser­viço de in­te­resses es­tran­geiros, não me­rece nem um só voto da es­querda.

Ao as­sumir-se o cargo de PR, jura-se fazer cum­prir a cons­ti­tuição, in­cluindo o Art.º 7 onde se «pre­co­niza a abo­lição do im­pe­ri­a­lismo (...) [e] a dis­so­lução dos blocos po­lí­tico-mi­li­tares», e zelar pela so­be­rania na­ci­onal. Só um can­di­dato que seja capaz ine­qui­vo­ca­mente e sem he­si­ta­ções de afirmar «Paz sim, NATO Não» está em con­di­ções de cum­prir fi­el­mente esse ju­ra­mento. Esse can­di­dato é Fran­cisco Lopes.



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