- Nº 1924 (2010/10/14)
Jerónimo de Sousa na abertura das Jornadas

É preciso romper com os bloqueios

Em Foco

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Nunca como hoje se pressionou tanto e se fez tanto esforço no plano político e ideológico para circunscrever e delimitar os problemas do país, dos portugueses e as respectivas soluções à estrita visão e lógica dos que em nome dos grandes interesses económicos e financeiros têm assumido no país e na Europa as responsabilidades da governação nos últimos anos.

Todos o verificamos. Não é a realidade económica e social concreta, os reais problemas que o país enfrenta que estão no centro das suas preocupações, mas apenas o cumprimento de cegos critérios nominais de um fundamentalismo monetarista, que não têm em conta os níveis de desenvolvimento diferenciados de cada país, os seus problemas concretos, as suas potencialidades e aspirações e que declinou as tarefas da promoção do crescimento económico, do emprego e do bem-estar das populações.

É à volta de tais critérios, sem conotação com a vida real, que querem que o mundo gire, mesmo quando a estagnação, a recessão, a destruição da vida de milhões de seres humanos a braços com o desemprego os compelia ao seu abandono.

(…) É por isso que não se vislumbra da parte dos que têm assumido a governação nos últimos anos, uma solução para o nosso desenvolvimento e para o bem-estar dos portugueses, apenas a repetição das mesmas receitas, medidas e orientações que tantos sacrifícios têm imposto à maioria do povo português. (…)


Contra as inevitabilidades


As nossas jornadas parlamentares vão ao arrepio de tal visão com a qual é preciso romper, porque é na ruptura com as lógicas instaladas e as políticas que as servem que Portugal pode encontrar a saída para os seus problemas.

(…) Por isso o próximo Orçamento do Estado não pode ser o repositório das políticas e das medidas que o governo acaba de anunciar com o PEC III, reforçando a dose dos sacrifícios para o povo e de renúncia a uma política de desenvolvimento económico com o congelamento e o corte do investimento público e a drástica redução do consumo interno.

Deste novo pacote de medidas de austeridade draconiana que representa um salto qualitativamente novo na escalada da ofensiva contra os salários, corte nos salários nunca concretizado desde Abril de 74, as reformas e pensões, o poder de compra das populações, de agravamento dos impostos ao consumo e aos rendimentos do trabalho, de redução dos direitos sociais, nomeadamente dos desempregados, de mais privatizações e de degradação da resposta dos serviços públicos.

O próximo Orçamento do Estado não pode ser o instrumento para o desastre já anunciado da recessão, como o confirmam a generalidade das previsões publicadas, acrescentando crise à crise, ampliando a destruição de riqueza, capacidade produtiva e de emprego.


Não à resignação


O país precisa de outra política e de uma política de rigor, que dê segurança ao Povo e ao País e não para «acalmar os mercados». Todos sabem e a experiência alheia o evidencia, incluindo a mais recente, que não são com tais medidas de sufoco para os trabalhadores e para o nosso povo que os especuladores deixarão de especular com a nossa dívida.

(…) Nós precisamos de reduzir o défice, mas não a mata-cavalos, à custa de brutais sacrifícios das populações e do desenvolvimento do país.

Os mercados, isto é, os bancos deixarão de especular se o poder político deixar de se submeter ao poder económico aqui e na Europa. E não se venha dizer, como o afirma o novo Governador do Banco de Portugal que os bancos são os «donos da bola», insinuando que não há nada a fazer e convidando-nos à resignação e à submissão.

(…) Por isso este não pode ser mais um Orçamento concebido para o povo continuar a pagar a factura de uma crise para a qual em nada contribuiu, tal como não deve ser o Orçamento trampolim para cavalgar na onda do rebaixamento geral dos salários que a CIP do grande patronato já insinua e Teixeira dos Santos incentiva.

(…) Também nunca como hoje, aqueles que têm governado o país e o conduziram a uma grave crise económica e social e à situação de atraso em que se encontra se empenharam tanto em mistificar a realidade, branquear as suas responsabilidades e os seus reais propósitos e projectos.

Sobre o Orçamento assistimos a sistemáticos jogos de palavras e ataques recíprocos entre PS e PSD. Falam em nome do interesse nacional, mas parecem sobretudo preocupados com o seu próprio interesse partidário.

Falam da crise política como um problema, mas ambos parecem querê-la. Armam e desarmam a sua eminência, em função da última sondagem que lhes garante ou nega a possibilidade de manter ou ser poder.

É isso que hoje vemos, quer da parte do PS, quer da parte do PSD, dramatizando um negócio de trocos à volta do Pacote III e deixarem a substância das medidas contra os trabalhadores e as populações intactas. Um, numa despudorada manobra de alijamento de responsabilidades e a não querer assumir as medidas que também são suas, outro a procurar uma nova vitimização com a aprovação ou não do Orçamento do Estado e ambos a tentar iludir o que toda a gente vê: - que no essencial estão de acordo com o fundamental das políticas seguidas e que são a essência da política de direita e, por isso, nas suas considerações e nas suas negociações ninguém lhes ouve uma palavra sobre o corte dos salários, do subsídio de desemprego, do abono de família ou sobre o aumento do IVA.

Não há certeza se o Orçamento é ou não viabilizado. Em última análise quem decidirá não são os executantes mas os mandantes. Já pouco lhes importa a substância do Orçamento. Interessa é se há ou não há, mesmo que o País ande para trás e o Povo fique pior.

(…) A vida tem vindo a mostrar que as políticas de direita do PS e PSD sozinhos ou concertados entre si, não resolvem nenhum dos problemas do país. O fracasso das suas políticas e a dramática situação nacional confirmam a necessidade de uma ruptura e de uma mudança, que concretize uma política patriótica e de esquerda. (...)

(Subtítulos da responsabilidade da redacção)