Comentário

Orçamentos 2011

João Ferreira

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Não é apenas por cá que se dis­cute o or­ça­mento para 2011. Há já al­guns meses que o Par­la­mento Eu­ropeu (PE) ini­ciou a dis­cussão sobre as li­nhas com que se vai coser o or­ça­mento co­mu­ni­tário para o pró­ximo ano. Pri­meiro, de­fi­nindo as pri­o­ri­dades or­ça­men­tais; agora, com uma dis­cussão mais fina, en­vol­vendo já nú­meros con­cretos e pro­postas de mon­tantes a afectar às di­fe­rentes sec­ções e ru­bricas or­ça­men­tais.

Lá, como cá, a dis­cussão e apro­vação do or­ça­mento cons­titui um mo­mento de cru­cial im­por­tância. Um mo­mento em que se de­finem e afirmam op­ções po­lí­ticas, em que se apontam pri­o­ri­dades e os re­cursos a afectar à sua con­cre­ti­zação, du­rante o pe­ríodo de re­fe­rência (no caso, 2011); em que se traçam os ca­mi­nhos a pros­se­guir num con­junto amplo de planos – eco­nó­mico, so­cial, am­bi­ental, etc.

Lá, como cá, con­frontam-se di­fe­rentes op­ções quanto aos ca­mi­nhos a se­guir. As di­fe­rentes forças po­lí­ticas as­sumem es­co­lhas (na de­fesa dos in­te­resses e das forças e classes so­ciais com as quais se com­pro­metem), de­finem po­si­ções de apoio ou de re­jeição (ou de «vi­a­bi­li­zação», mais ou menos en­ver­go­nhada…) e, desta forma, de­ter­minam a apro­vação ou re­pro­vação do or­ça­mento.

Lá, como cá, por tudo isto, a dis­cussão e apro­vação do or­ça­mento é sempre um mo­mento cla­ri­fi­cador.

Os or­ça­mentos co­mu­ni­tá­rios são ela­bo­rados dentro dos li­mites es­ti­pu­lados por um grande «en­ve­lope fi­nan­ceiro», a que se chama Quadro Fi­nan­ceiro Plu­ri­a­nual (QFP). Ela­bo­rado para um pe­ríodo de sete anos, o ac­tual QFP (2007-2013) en­contra-se a meio do seu pe­ríodo de vi­gência – al­tura em que su­pos­ta­mente se de­veria pro­ceder à sua ava­li­ação e re­visão in­ter­calar. São vá­rias as ra­zões que a jus­ti­fi­ca­riam. Em pri­meiro lugar, o ac­tual QFP é ex­tre­ma­mente exíguo; ela­bo­rado na sequência do alar­ga­mento a Leste da UE, que sig­ni­ficou a en­trada de um nú­mero sig­ni­fi­ca­tivo de países com PIB per ca­pita abaixo da média co­mu­ni­tária, o QFP, não obs­tante, viu re­du­zirem-se os mon­tantes con­sa­grados aos fundos es­tru­tu­rais, no mo­mento em que eles eram mais ne­ces­sá­rios – de uns parcos 0,41% do Ren­di­mento Na­ci­onal Bruto (RNB) co­mu­ni­tário pas­saram para apenas 0,37%. Em se­gundo lugar, a crise veio agravar toda a si­tu­ação, de­mons­trando à evi­dência a in­su­fi­ci­ência do or­ça­mento co­mu­ni­tário, o que com­pro­mete logo à par­tida a sua função re­dis­tri­bu­tiva e, com ela, a efec­ti­vação do tão pro­pa­lado prin­cípio da co­esão eco­nó­mica e so­cial. O cha­mado Plano de Re­lan­ça­mento da Eco­nomia Eu­ro­peia foi fi­nan­ciado, na sua maior parte, pelos es­tados-mem­bros, com re­curso aos seus or­ça­mentos na­ci­o­nais, o que é re­ve­lador do ver­da­deiro sig­ni­fi­cado da “so­li­da­ri­e­dade eu­ro­peia”…

Com efeito, um “en­ve­lope fi­nan­ceiro” exíguo de­ter­mina or­ça­mentos, para todo o pe­ríodo de re­fe­rência, também eles exí­guos. Temos de­fen­dido um re­forço sig­ni­fi­ca­tivo do or­ça­mento co­mu­ni­tário, com base em con­tri­bui­ções dos es­tados-mem­bros, pro­por­ci­o­nais ao seu RNB.

Mas para além de es­casso, o or­ça­mento tem sido posto ao ser­viço de po­lí­ticas er­radas e in­justas. Mais uma vez, as pri­o­ri­dades pro­postas para o or­ça­mento 2011, não obs­tante a re­tó­rica so­cial (in­con­tor­nável em tempos de crise), são claras quanto à in­tenção de manter, no es­sen­cial, a ori­en­tação dos or­ça­mentos an­te­ri­ores.

Uma vez mais, aponta-se para um or­ça­mento ao ser­viço do apro­fun­da­mento do mer­cado único, da mer­can­ti­li­zação de cada vez mais es­feras da vida eco­nó­mica e so­cial e do am­bi­ente, das li­be­ra­li­za­ções e pri­va­ti­za­ções, da pre­ca­ri­e­dade la­boral, vulgo «fle­xi­gu­rança». Tratam-se de ori­en­ta­ções ve­lhas, ainda que agora reu­nidas na dita nova "Es­tra­tégia 2020". As pri­o­ri­dades apro­vadas co­locam ainda o or­ça­mento de 2011 ao ser­viço do in­ter­ven­ci­o­nismo ex­terno da UE – do Ser­viço Eu­ropeu de Acção Ex­terna, da Po­lí­tica Ex­terna e de Se­gu­rança Comum, da Po­lí­tica Eu­ro­peia de Se­gu­rança e De­fesa – do mi­li­ta­rismo e da guerra; das po­lí­ticas que cri­mi­na­lizam a imi­gração, etc.

Pri­o­ri­dades destas não po­diam me­recer senão o nosso voto contra (apenas as «pri­o­ri­dades» foram vo­tadas até à data e não o or­ça­mento global). A sua apro­vação contou to­davia, uma vez mais, com o con­senso exis­tente entre a di­reita e a so­cial-de­mo­cracia – dos par­tidos por­tu­gueses, PS, PSD e CDS vo­taram a favor e, desta vez, a apro­vação destas pri­o­ri­dades foi mesmo ado­çada com a (elu­ci­da­tiva) abs­tenção do BE.

Pela nossa parte, afir­mámos que este não é nem o único nem um ca­minho ine­vi­tável. Afir­mação que sus­ten­támos, como ha­bi­tu­al­mente, com a apre­sen­tação de vá­rias pro­postas al­ter­na­tivas, du­rante o de­bate.



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