O sistema financeiro ao serviço dos défices

Anselmo Dias

Neste mo­mento há uma ampla con­ver­gência de opi­niões quanto ao facto de es­tarmos pe­rante um gra­vís­simo re­tro­cesso so­cial, se­gu­ra­mente o maior da nossa his­tória re­cente. Con­tudo, tal con­ver­gência de opi­niões já não é tão ampla quanto à ca­rac­te­ri­zação da sua na­tu­reza.

Há quem de­fenda que a ac­tual si­tu­ação é apenas con­jun­tural.

Há quem de­fenda que a ac­tual si­tu­ação é emi­nen­te­mente es­tru­tural, ou seja, re­flecte o nosso mo­delo de de­sen­vol­vi­mento, sendo por isso an­te­rior à úl­tima crise do sis­tema ca­pi­ta­lista, em­bora agu­di­zada pela agi­o­tagem dos mer­cados fi­nan­ceiros.

É em abono desta úl­tima tese que de­sen­vol­vemos os temas que a se­guir pomos à con­si­de­ração.

 

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Em 2006, antes da crise do cha­mado «su­prime» nos EUA, a pre­texto do au­mento da lon­ge­vi­dade dos por­tu­gueses o PS in­ventou um chavão, «o factor de sus­ten­ta­bi­li­dade», no sen­tido de en­curtar o nú­mero de anos em que o re­for­mado be­ne­fi­ci­aria da res­pec­tiva pres­tação, pro­cu­rando assim ade­quar, tanto quanto pos­sível, o início da re­forma à data do fa­le­ci­mento.

A par disto, o PS en­tendeu que a ac­tu­a­li­zação das re­formas não pode su­perar a taxa da evo­lução da eco­nomia, ou seja: se, por exemplo, a eco­nomia crescer abaixo dos 2% o au­mento das pen­sões mais baixas não pode ex­ceder a taxa de in­flação e as pen­sões mais altas terão de ficar con­ge­ladas.

En­tre­tanto, no pas­sado dia 29 de Se­tembro, no se­gui­mento dos pre­textos atrás re­fe­ridos, o PS, agra­vando o que já era grave, de­ter­minou o con­ge­la­mento de todas as pen­sões a partir de 1/​1/​2011, a pre­texto do con­trolo do dé­fice or­ça­mental.

No fu­turo, es­tamos certos, caso não haja uma rup­tura de­mo­crá­tica com tal po­lí­tica, ou­tros pre­textos irão ser in­vo­cados pela po­lí­tica de di­reita com vista à acen­tu­ação das de­si­gual­dades so­ciais em Por­tugal. Um desses pre­textos, se­gu­ra­mente, es­tará co­nec­tado com a dí­vida ex­terna.

O PS, ou o PSD, em nome da amor­ti­zação da dí­vida e do pa­ga­mento de juros in­vo­carão a dre­nagem de mi­lhões de euros des­ti­nados aos cre­dores para jus­ti­fi­carem a con­ti­nuada pe­na­li­zação das re­formas.

Pos­te­ri­or­mente ao pa­ga­mento do «ca­lote» virão, su­ces­si­va­mente, ou­tros pre­textos, even­tu­al­mente o au­mento do preço do barril de pe­tróleo e de ou­tras ma­té­rias-primas, a que se se­guirão ou­tros ar­gu­mentos, mesmo que ri­dí­culos; por exemplo, a co­tação in­ter­na­ci­onal das al­ca­goitas, tudo isto ca­na­li­zado num único ponto: di­mi­nuir o valor real das pen­sões ar­ras­tando, por essa via, muitos pen­si­o­nistas para o uni­verso da po­breza.

Acrescem aos pre­textos des­ti­nados a pre­ju­dicar os re­for­mados os pre­textos des­ti­nados à re­dução sa­la­rial dos tra­ba­lha­dores do ac­tivo, a co­meçar pelos tra­ba­lha­dores da função pú­blica e do sector em­pre­sa­rial do Es­tado e a es­tender-se, con­forme os de­sejos da CIP, ao sector pri­vado.

É o vale tudo em nome da re­so­lução tran­si­tória dos dé­fices (dé­fice or­ça­mental, dé­fice pú­blico, dé­fice ex­terno, etc.).

É o vale tudo em nome de cir­cuns­tân­cias de­ri­vadas de uma causa que é omi­tida, ou seja, omite-se a exis­tência de um mo­delo de de­sen­vol­vi­mento ina­de­quado às ne­ces­si­dades do país, ina­de­quação que não re­sultou de algo mol­dado por uma qual­quer ven­tania ou de um outro qual­quer fe­nó­meno na­tural, mas antes foi mol­dado pela prá­tica po­lí­tica de pes­soas con­cretas, li­gadas a par­tidos con­cretos e su­bor­di­nados a in­te­resses con­cretos: os in­te­resses do­mi­nantes das classes do­mi­nantes.

 

A omissão ao ser­viço da de­sin­for­mação

 

Com efeito, nada é dito quanto à origem da causa maior que ex­plica a mi­ríade de dé­fices que afectam a nossa eco­nomia, o que, por sua vez, serve de pre­texto para atacar os di­reitos dos tra­ba­lha­dores e dos be­ne­fi­ciá­rios da se­gu­rança so­cial, razão pela qual no início deste ar­tigo de­fen­demos a con­vicção de que es­tamos pe­rante um con­junto de factos de na­tu­reza es­tru­tural.

A causa pri­meira diz res­peito à des­truição do nosso apa­relho pro­du­tivo, na área da in­dús­tria trans­for­ma­dora e do sector pri­mário (agri­cul­tura e pescas) e à sua subs­ti­tuição por um sis­tema que su­bal­ter­nizou os bens tran­sac­ci­o­ná­veis com in­cor­po­ração de média e alta tec­no­logia.

Sem perder de vista a im­por­tância nu­clear destes sec­tores des­ti­nados ao con­sumo in­terno, à ex­por­tação e ao equi­lí­brio das nossas contas ex­ternas, há que sa­li­entar, também pela ne­ga­tiva, entre ou­tros, os se­guintes as­pectos:

1.º – a es­pe­cu­lação fi­nan­ceira por via das tran­sac­ções em bolsa, cujas os­ci­la­ções nada têm a ver com a eco­nomia real, ou seja, com a saúde eco­nó­mica das res­pec­tivas em­presas, o que nos leva a ca­rac­te­rizá-la como a «eco­nomia de ca­sino».

Quem, a este pro­pó­sito, não se lembra das jo­gadas le­vadas a cabo du­rante a gestão de Jardim Gon­çalves na va­lo­ri­zação vir­tual do valor das ac­ções do BCP, le­vando muita gente a in­vestir as suas pou­panças e a en­di­vidar-se, com­prando gato por lebre?

Quem não sabe que, na ob­tenção dos mesmos re­sul­tados es­pe­cu­la­tivos de Jardim Gon­çalves, houve, no es­tran­geiro, bancos que fi­zeram o con­trário, ou seja: cri­aram a ideia, junto da opi­nião pú­blica, da quebra emi­nente do valor das res­pec­tivas ac­ções para, al­can­çada na bolsa a mais baixa co­tação pos­sível, as com­prar a baixo preço para em mo­mento opor­tuno voltar a vendê-las a preços in­fla­ci­o­nados?

Quem, igual­mente, não sabe das fal­ca­truas, a ser pagas por todos nós, le­vadas a cabo no «banco la­ranja», o BPN de Oli­veira e Costa e no BPP de João Ren­deiro?

2.º – a trans­for­mação da ac­ti­vi­dade ban­cária numa ac­ti­vi­dade de san­gues­sugas, por via da con­ju­gação dos ele­vados juros, as­so­ci­ados à agi­o­tagem no que con­cerne a taxas e ser­viços apli­cados quer às fa­mí­lias quer às em­presas, so­bre­tudo as micro e as pe­quenas em­presas, de que re­sulta, por parte da banca, a es­can­da­losa dre­nagem de mi­lhões de euros dos cli­entes para os bolsos dos grandes ac­ci­o­nistas do sis­tema fi­nan­ceiro.

A banca, pa­trona dos go­vernos do bloco cen­tral, e pa­troa de fu­turos e ex-mi­nis­tros e afins, tem, por outro lado, no que diz res­peito à di­mensão da dí­vida ao es­tran­geiro, as mai­ores culpas.

Os ban­queiros, na an­si­e­dade de ga­nharem di­nheiro a qual­quer tí­tulo, es­ma­garam bru­tal­mente a re­mu­ne­ração dos de­pó­sitos le­vando muitos de­po­si­tantes a de­sin­te­ressar-se pela pou­pança, isto sem falar da pou­pança que os ban­queiros por­tu­gueses ex­por­taram para os off-shores, con­forme re­sulta da­quilo que se vai sa­bendo em torno do pro­cesso «Fu­racão». Mercê do atrás re­fe­rido, as­so­ciado ao con­su­mismo e ao uso e abuso no cré­dito à ha­bi­tação, não ad­mira que a taxa de pou­pança dos por­tu­gueses, em 2009, em per­cen­tagem do ren­di­mento dis­po­nível, ti­vesse sido fi­xada em cerca de 8,8%, ou seja, menos de me­tade da média ve­ri­fi­cada na Ale­manha e na pró­pria Es­panha.

Ha­vendo menos pou­pança, as­so­ciada ao de­lírio con­su­mista através de uma pu­bli­ci­dade ex­tre­ma­mente agres­siva e con­ju­gada com a des­truição do nosso apa­relho pro­du­tivo, resta ao país re­correr ao cré­dito ex­terno com todas as con­sequên­cias fi­nan­ceiras co­nhe­cidas, sem es­quecer uma questão fun­da­mental: a so­be­rania na­ci­onal.

Quando um país, mercê de po­lí­ticas er­radas, é obri­gado curvar-se, a es­tender a mão aos cre­dores ex­ternos, so­li­ci­tando novos cré­ditos para res­gatar cré­ditos an­tigos, su­jei­tando-se às dra­co­ni­anas con­di­ções de amor­ti­zação da dí­vida e pa­ga­mento de juros, quando tudo isto acon­tece é a so­be­rania na­ci­onal que está em jogo.

3.º – o pa­ra­si­tismo das grandes em­presas por via da fi­xação de preços es­pe­cu­la­tivos nas áreas da elec­tri­ci­dade, dos com­bus­tí­veis, das co­mu­ni­ca­ções; sec­tores que os por­tu­gueses, em tempo opor­tuno, como em 1975, não dei­xarão de in­te­grar no sector em­pre­sa­rial do Es­tado.

Os preços im­postos por estas em­presas não re­flectem a co­tação das ma­té­rias primas nem dos fac­tores de pro­dução, antes são uma es­pécie de im­posto feudal a re­verter para os res­pec­tivos ac­ci­o­nistas, o que ex­plica uma parte im­por­tante da enorme con­cen­tração ca­pi­ta­lista em Por­tugal.

Com tal ex­torsão aos con­su­mi­dores não é de ad­mirar o vo­lume de in­ves­ti­mentos feitos no Brasil pela PT e pela GALP e, pasme-se, pela EDP, nos pró­prios EUA, isto quando em Por­tugal há falta de re­cursos.

4.º – a ter­ci­a­ri­zação da eco­nomia por via da den­si­fi­cação dos cen­tros co­mer­ciais, dos ser­viços de se­gu­rança, dos call-center e da ac­ti­vi­dade tu­rís­tica, ac­ti­vi­dades onde, si­mul­tâ­ne­a­mente, se ve­ri­fica ele­vadas taxas de ren­ta­bi­li­dade do ca­pital pró­prio e onde são apli­cados sa­lá­rios ex­tre­ma­mente baixos.

O ar­ro­la­mento atrás in­vo­cado, a tí­tulo de exemplo, apenas serve para ilus­trar que, para além da des­truição do nosso apa­relho pro­du­tivo, há um vasto con­junto de fac­tores co­la­te­rais que em cir­cuns­tância al­guma deve ser es­que­cido. Ele ajuda a com­pre­ender a na­tu­reza e a di­mensão dos nossos dé­fices, um dos quais pas­samos a re­ferir de se­guida.

 

O com­por­ta­mento da banca ao ser­viço da dí­vida ex­terna

 

A dí­vida ex­terna, em Junho do cor­rente ano, es­tava ofi­ci­al­mente ava­liada em 501 409 mi­lhões de euros, valor cor­res­pon­dente a cerca do triplo de toda a ri­queza pro­du­zida num ano em Por­tugal.

É uma verba muito vul­tuosa, ex­pli­cada pelas po­lí­ticas de di­reita em con­so­nância com os in­te­resses dos nossos ban­queiros, os ho­mens que têm as­sento di­recto nos con­se­lhos de mi­nis­tros sem ne­ces­si­dade de mera re­pre­sen­tação, dada a «dança de ca­deiras» entre a banca e o Go­verno e entre o Go­verno e a banca.

Há dú­vidas quanto a isto?

Quem tiver dú­vidas que ana­lise o per­curso dos pri­meiros-mi­nis­tros, dos mi­nis­tros, dos se­cre­tá­rios de Es­tado, dos chefes de ga­bi­nete, dos de­pu­tados do PS, CDS-PP e, so­bre­tudo do PSD, desde a res­pec­tiva en­trada na vida po­lí­tica até aos dias de hoje e vejam, no plano do «ganho-pão», as res­pec­tivas co­ne­xões com o sis­tema fi­nan­ceiro, so­bre­tudo com o BPN, BPP, BES, BCP, BPI, San­tander-Totta e res­pec­tivas em­presas sa­té­lites.

Pois bem, é através dessa cum­pli­ci­dade entre as po­lí­ticas de di­reita e a ma­xi­mi­zação dos lu­cros dos bancos que o sis­tema fi­nan­ceiro, com a per­mis­si­vi­dade do PS e do PSD, im­ple­mentou, como já atrás re­fe­rimos, uma gra­vosa po­lí­tica na área es­tra­té­gica, quer na ob­tenção dos de­pó­sitos, quer no in­ves­ti­mento.

O que é que a banca faz com o di­nheiro ob­tido pelos de­pó­sitos dos re­si­dentes em Por­tugal e com os em­prés­timos ex­ternos?

O que é que faz? In­veste em sec­tores pro­du­tivos na ac­ti­vi­dade in­dus­trial no sen­tido do au­mento da pro­dução, ten­dente à subs­ti­tuição das im­por­ta­ções por pro­dução na­ci­onal e à pro­dução des­ti­nada ao in­cre­mento da ex­por­tação? In­veste na agri­cul­tura e nas pescas com vista a re­solver o grave dé­fice ali­mentar? In­veste no âm­bito tec­no­ló­gico e na in­ves­ti­gação ci­en­tí­fica em ordem a re­cu­perar o nosso atraso em áreas tão sen­sí­veis do co­nhe­ci­mento?

A banca pri­vada é uma apá­trida, não tem pá­tria, não tem va­lores éticos (vejam o BPP, BPN, BCP e os mul­ti­formes casos do BES) e rege-se apenas, lem­brando o co­nhe­cido filme «Ca­baret», por money... money... money...

É em nome do lucro ga­ran­tido, rá­pido e vul­tuoso que a banca, ao longo dos anos (a maior parte da pre­sente dé­cada) ca­na­liza os seus in­ves­ti­mentos, cerca de 84%, em cinco sec­tores, a saber: ha­bi­tação; ac­ti­vi­dades imo­bi­liá­rias, alu­gueres e ser­viços pres­tados às em­presas; cons­trução; co­mércio por grosso e a re­talho, in­cluindo o co­mércio au­to­móvel e con­sumo.

O resto é pai­sagem.

Con­si­de­rando os meses ho­mó­logos de Ja­neiro entre 2000 e 2010 a per­cen­tagem de­di­cada à in­dús­tria trans­for­ma­dora, no con­junto do total do cré­dito con­ce­dido, não ul­tra­passou, em termos mé­dios, os 7,6%.

Uma ver­gonha!

Mercê desta re­lação as­si­mé­trica na se­lec­ti­vi­dade e na con­cessão do cré­dito não é de ad­mirar que te­nhamos de com­prar lá fora muito da­quilo que po­díamos pro­duzir cá dentro, acen­tu­ando, dra­ma­ti­ca­mente, o equi­lí­brio da ba­lança co­mer­cial.

A este pro­pó­sito, os dados dis­po­ní­veis re­por­tados à úl­tima dé­cada (2000-2009) dizem que a di­fe­rença, na área dos bens tran­sac­ci­o­ná­veis, entre as im­por­ta­ções e as ex­por­ta­ções atingiu um valor equi­va­lente a cerca de 162 mil mi­lhões de euros, re­a­li­dade que é omi­tida pelo Go­verno e pelas vozes do dono a fim de ocul­tarem o ele­vado preço que es­tamos a pagar pela des­truição do nosso apa­relho pro­du­tivo.

En­tre­tanto, a banca, pela sua po­lí­tica de cré­dito, ao re­trair, entre nós, a pro­dução de bens tran­sac­ci­o­ná­veis, fo­menta as im­por­ta­ções, ga­ran­tindo o em­prego nos países que nos vendem aquilo que não pro­du­zimos.

Acresce a este crime lesa-pá­tria uma dis­torção ana­cró­nica na se­lec­ti­vi­dade do cré­dito.

Ve­jamos um caso. Há, em Por­tugal, de­vido à li­gação um­bi­lical entre a banca e os cons­tru­tores civis, cerca de 400 000 casas de­vo­lutas, in­te­grando uma parte sig­ni­fi­ca­tiva de casas novas por vender.

Quanto é que custa ao país a imo­bi­li­zação do ca­pital as­so­ciado a tal facto? Só em Lisboa existem cerca de 50 000 fogos por vender cujo valor, es­ti­mado a preços de mer­cado, deve orçar cerca de 7500 mi­lhões de euros. Quantas de­zenas de mi­lhares de mi­lhões estão, pelas mesmas ra­zões, imo­bi­li­zados a nível na­ci­onal?

O livre fun­ci­o­na­mento do mer­cado tem destas coisas: in­veste enormes massas fi­nan­ceiras em pro­dutos imo­bi­li­zados em vez de in­vestir na ro­ta­ti­vi­dade do ca­pital, de­sig­na­da­mente na pro­dução de carne, na cap­tura de peixe, na pro­dução agrí­cola, na fa­bri­cação de má­quinas, ins­tru­mentos e fer­ra­mentas, na cons­trução e mon­tagem de veí­culos, na in­dús­tria far­ma­cêu­tica, enfim em tudo aquilo que en­quadra a di­mensão e a na­tu­reza do con­sumo em Por­tugal.

Um go­verno que per­mite à banca (pri­vada e pú­blica) ca­na­lizar cerca de 40% do cré­dito total para o sa­tu­rado mer­cado ha­bi­ta­ci­onal e menos de 1% para a agri­cul­tura e pescas é um go­verno su­bal­ter­ni­zado aos in­te­resses do seu man­dante: a oli­gar­quia fi­nan­ceira.

 

As res­pon­sa­bi­li­dades da banca pú­blica

 

No meio de tudo isto impõe-se uma re­fe­rência à Caixa Geral de De­pó­sitos, o banco do Es­tado.

Cabe a esta ins­ti­tuição im­pedir o efeito ne­fasto da banca pri­vada na des­truição da pou­pança, obri­gando o re­curso aos em­prés­timos ex­ternos por forma a re­solver os pro­blemas de in­ves­ti­mento.

Cabe a esta ins­ti­tuição trans­formar os de­pó­sitos, de­vi­da­mente re­mu­ne­rados, em bom in­ves­ti­mento pro­du­tivo, con­forme os exem­plos já atrás re­fe­ridos.

Cabia tudo isto, desde que a Caixa Geral de De­pó­sitos fosse ge­rida se­gundo cri­té­rios de boa gestão, no res­peito pelo in­te­resse dos cli­entes, no in­te­resse da eco­nomia pro­du­tiva e no in­te­resse do Es­tado, por forma a que, da sua ac­ti­vi­dade, re­sul­tasse uma mais valia para a co­lec­ti­vi­dade.

Mas não: a Caixa Geral de De­pó­sitos é uma en­ti­dade co­lo­ni­zada pelos in­te­resses es­tra­té­gicos da banca pri­vada, pelo que, no que diz res­peito à cap­tação de re­cursos e à po­lí­tica de cré­dito, não há di­fe­rença entre o pú­blico e o pri­vado, a bem do BES, do BCP e ou­tros.

Mas mais: a Caixa Geral de De­pó­sitos, além de co­lo­ni­zada pela oli­gar­quia fi­nan­ceira, é uma es­pécie de in­ter­face entre os qua­dros do PS e do PSD, a quem ro­ta­ti­va­mente cabe o acesso à res­pec­tiva gestão, ge­ne­ro­sa­mente bem paga no ac­tivo e na re­forma, mesmo que, neste úl­timo caso, os ti­tu­lares te­nham me­te­o­ri­ca­mente de­sem­pe­nhado fun­ções e mesmo que não te­nham atin­gido a idade legal para a re­forma.

A ex­pressão «fartar vi­la­nagem» aplica-se ri­go­ro­sa­mente à Caixa Geral de De­pó­sitos, quer pelas re­formas apli­cadas a Mira Amaral, um ar­dente pa­la­dino da aus­te­ri­dade, e a ou­tros cor­re­le­gi­o­ná­rios, quer pela cri­mi­nosa po­lí­tica de em­prés­timos a co­nhe­cidos es­pe­cu­la­dores, como re­cen­te­mente acon­teceu no con­trole ac­ci­o­nista do BCP e como re­pe­ti­da­mente acon­teceu no pro­cesso das pri­va­ti­za­ções.

Em­prestar di­nheiro aos es­pe­cu­la­dores para com­prarem e ven­derem ac­ções e sub­trair em­prés­timos às pe­quenas e mé­dias em­presas devia cons­ti­tuir um mo­tivo de justa causa para a de­missão ime­diata dos res­pon­sá­veis por tal sub­versão de va­lores.

É evi­dente que os man­dantes não vão por aí.

Ca­minho di­verso é aquele que é apon­tado pelos co­mu­nistas. O ca­minho a se­guir é aquele que pugna pela in­serção da banca pri­vada no sector em­pre­sa­rial do Es­tado. O ca­minho a se­guir é aquele que exige que a atri­buição da gestão do pa­tri­mónio pú­blico deve caber a gente séria e com­pe­tente.

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Fontes:

- Jornal Pú­blico de 10/​10/​2010 e de 21/​10/​2010;

- Bo­letim Es­ta­tís­tico – 2010 – BdP, re­fe­rido em 5/​5/​2010 por Eu­génio Rosa;

- Bo­letim Es­ta­tís­tico – Junho 2008 e Se­tembro 2010 do BdP, re­fe­rido em 5/​10/​2010 por Eu­génio Rosa.

- www.Por­data.pt

 



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Um Orçamento do Estado para «acalmar os mercados»

Quem ana­lise a Pro­posta de Or­ça­mento do Es­tado para 2010 que o Go­verno apre­sentou ra­pi­da­mente con­clui que ela não foi ela­bo­rada para re­solver os graves pro­blemas que o País e os por­tu­gueses en­frentam (en­di­vi­da­mento ex­terno e dí­vida do Es­tado in­com­por­tá­veis), mas sim para «acalmar os mer­cados» ou seja, para sermos claros, sa­tis­fazer as exi­gên­cias dos bancos e dos di­versos tipos de fundos que cons­ti­tuem e do­minam esses mer­cados. A pre­o­cu­pação em servir o País e os por­tu­gueses está to­tal­mente au­sente da pro­posta de OE2011, o que de­ter­mina que as me­didas dela cons­tantes só po­derão agravar ainda mais a si­tu­ação eco­nó­mica (des­truição da eco­nomia) e so­cial do País.